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28ª MOSTRA DE CINEMA
Filme conta uma história de amor "amalucada" vivida dentro da guerra da Bósnia, em 92
Traços autorais de Kusturica ficam entre estímulo e cansaço
Divulgação
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Cena do filme "A Vida É um Milagre", de Emir Kusturica, hoje, às 17h20, no Unibanco Arteplex |
CLAUDIO SZYNKIER
FREE-LANCE PARA A FOLHA
O novo filme de Emir Kusturica tem todos os opcionais
de fábrica previstos no catálogo
estético do autor. O enredo se passa em 92, e o trabalho inicia-se como painel de uma pequena comunidade, no profundo campestre da antiga Iugoslávia. Logo, a
guerra da Bósnia estoura. O filme
vai tratar de uma história de amor
amalucada, dentro da guerra.
Realização divina é um dos temas centrais. O personagem principal é um engenheiro de ferrovias que se diverte construindo
ferroramas e maquetes, ou seja,
miniaturas que refletem sua habilidade de criar coisas grandes.
Kusturica é igual. Para começar,
todo o planejamento de seu mundo filmado, em zona rural balcânica, segue uma imaginação, estilo livrinho infantil ilustrado, de
"paraíso" em que a Arca de Noé
poderia ter se estabelecido.
Composições paisagísticas têm
forma e tom bíblicos, pois Kusturica soltou os moradores da arca
-cavalos, ursos, burros- por
vasta área pastoril. Há um traço
forte de gênese ou fundação de
sociedade na ambientação que
Kusturica, em sua escrita lúdica e
surreal, constrói como um Deus.
O bósnio faz daquele lugar também um parque de diversões. Está
sendo concluída, nas montanhas,
uma estrada de ferro. Túneis se
parecem com acessórios cenográficos do trem fantasma e carros de
verdade, que viajam pelos trilhos,
são adaptados, através de suas
carrocerias, como carrinhos de
uma montanha russa estilizada
em visual automobilístico.
O espírito bíblico vai também
delinear a guerra. Evento proposto por Kusturica como um ritual
de fogos de artifício e fantasias
mas também como uma ação divina, misteriosa e irada. Desígnio
explosivo meio demente, mas caricatural, que obriga os personagens, sem entender nada, a improvisar de modo improvável.
Kusturica é um dos mais talentosos projetistas de universos isolados e de suas parafernálias fantásticas. Ele também filma como
músico, elaborando seqüências
longas como sinfonias do patético. Tudo começa "normal" e os
elementos de tensão cômica vão
entrando, um por um, como instrumentos, para participar da
mesma melodia caótica.
Mas alguma coisa não cola. Fica
a impressão de que os personagens louquinhos do autor simulam emoção louquinha via seu espírito louquinho, que, no mais,
abrange um certo parâmetro de
"arte" dos sentimentos desastrados e mesmo assim sublimes, no
cinema. À repetição, cansa.
A Vida É um Milagre
Zivot Je Cudo
Direção: Emir Kusturica
Produção: Bósnia/França, 2004
Quando: hoje, às 17h20, no Frei Caneca
Unibanco Arteplex (outra sessão dia 3)
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