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Egípcio usa filmes para
reconstituir sua vida
JEAN-LUC DOUIN
DO "MONDE"
Em 1977, um amigo médico invadiu a sala de montagem do diretor egípcio Youssef Chahine,
ordenou que ele largasse os rolos
de filmes e intimou que o acompanhasse ao hospital em que trabalhava em Londres. Lá, o cirurgião lhe informou que ele tinha
três artérias bloqueadas e recomendou uma cirurgia imediata.
"Pedi para ver um paciente que
tivesse seguido o mesmo tratamento. Mostraram-me um sujeito por trás de um vidro, com uns
40 tubos saindo de seu corpo.
Nunca tive medo da morte. Eu aspirava a ser eterno, mais do que
deixar uma obra. E uma obra só
importa quando diz sua própria
verdade. Até lá, eu havia filmado
basicamente opiniões de esquerda. Eu, que sempre tive medo de
ser descoberto, me dei conta de
que aquilo que me importava era
contar minha história. E fiquei me
perguntando se teria a força necessária para me encarar abertamente", contou o diretor.
Foi assim que, tomado de novo
ânimo, Chahine voltou a Alexandria para uma série de filmes autobiográficos. Através de uma
história de amor entre um muçulmano e uma judia, "Alexandrie
Pourquoi" (1978), ele evoca a harmonia reinante antes da guerra
em sua Alexandria natal. Naquele
ano, ele assistiu a uma exibição do
filme, ao lado de Iasser Arafat. De
repente, ouviu o líder palestino
exclamar "aquela puta!". Sem saber se o insulto se dirigia a ele ou à
personagem", Chahine interpelou Arafat ao final da sessão. "Ele
me explicou que a atriz trouxera
lembranças de uma moça que o
reconfortara no passado".
Desnudar-se não é freqüente no
cinema. "É um risco", admite.
Quatro anos mais tarde, em "La
Mémoire", Chahine retrata um cineasta que passa por uma cirurgia
e vê desfilar sua vida, suas obras,
seus amores. Em 1989, em "Alexandrie Encore et Toujours", ele
aborda o tema do desejo de um cineasta por sua atriz fetiche.
Em "Alexandria... Nova York",
ele reconstitui sua juventude, a
temporada que passou nos Estados Unidos em (1945-46), para estudar arte dramática.
Agora, o novo filme parece tratar de uma decepção amorosa,
porque se Chahine rodou "Alexandria... Nova York", foi para dizer "amo os Estados Unidos. Eles
são atacados por toda a imprensa
árabe. Mas sei que na alma dos
egípcios continua a existir o sonho norte-americano. Não rejeitam o país, mas estão furiosos
com o regime. Todas as coisas
horríveis que vemos na TV, contra os palestinos, perpetradas com
armas dos EUA. Como vocês esperam que eles reajam? Eu estou
encolerizado, meu filme poderia
se chamar "Raiva no Coração". Estou furioso contra o que vem sendo feito no Iraque. Mas Bush não
é os Estados Unidos. Os Estados
Unidos são meus amigos, meus
professores, minhas dançarinas!"
Em "Alexandria... Nova York",
Chahine utiliza um trecho de seu
filme "Gare Centrale", no qual interpreta um mendigo trôpego, esquizofrênico. Por que não usar
trechos de filmes de Hollywood?
"Eu queria usar uma canção de Sinatra, algumas imagens de "Ziegfeld Girl". Pediram-me US$ 2 milhões! E eu queria homenageá-los,
os imbecis!"
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