São Paulo, quinta-feira, 28 de outubro de 2004

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ARTES

"Sonhando de Olhos Abertos", em cartaz no Tomie Ohtake, apresenta 234 obras dadaístas e surrealistas

Mostra testemunha o engajamento radical do irracionalismo

FELIPE CHAIMOVICH
CRÍTICO DA FOLHA

Que fim levou a revolução? "Sonhando de Olhos Abertos" reúne, no Instituto Tomie Ohtake, 234 obras testemunhando o engajamento dadá e surrealista na mudança radical dos padrões da arte. A coleção de primeira grandeza provém do Museu de Israel, em Jerusalém, e permite compreender a história desses movimentos.
Dadá é o nome genérico dado a uma rede de artistas que circularam por Zurique, Nova York, Barcelona, Paris, Berlim, Moscou, Budapeste e Praga durante a Primeira Guerra e logo após. Enquanto desabava a estrutura imperial européia em meio a um banho de sangue, os dadaístas denunciavam a alta cultura eurocêntrica como parte do processo que estava levando o mundo a um conflito bélico nunca visto.
Contudo o progresso tecnológico tornara possível a conexão globalizada desses artistas. Desde o início o dadá nutriu-se do paradoxo: criticava um mundo que era sua própria condição de existência como grupo cosmopolita.
O nascimento da colagem em 1912 abrira as portas para o apagamento das fronteiras entre as diversas mídias codificadas pelas academias de belas-artes. Se era possível chamar de obra de arte um misto de recortes de jornal com os horrores da guerra, pintura e objetos cotidianos deslocados de suas funções originais, então toda a cultura poderia passar por uma subversão renovadora.
O "ready-made" de Marcel Duchamp ganha destaque na mostra. Um segmento inteiro é dedicado à invenção do gênero da antiarte, com reedições da roda de bicicleta sobre banquinho (1913/ 64) e dos padrões de medida com linha e madeira (1913/64).
Encontramos experimentos com cinema, nos "Filmstudie" (1926), de Richter, com tipografia, na revista "Mecano" (1922), editada por Van Doesburg, com escultura, na "Construção" (1922), de Joosten, e desenho, no "Centauro na Floresta" (1919), de Arp, e em "Tickets" (1922), de Picabia.
Porém o triunfo da revolução na Rússia e as transformações políticas na Europa dos anos 20 colocaram em xeque o niilismo dadaísta. Urgia engajar-se nas mudanças e abandonar o ceticismo.
Surgiu, assim, o surrealismo, em Paris, cujo primeiro manifesto de 1924 propunha acelerar o processo revolucionário pela libertação das forças reprimidas no indivíduo, devido aos preconceitos sexuais burgueses. Na fotomontagem "O Fenômeno do Êxtase" (1928), de Heine, vemos mulheres nuas revirando os olhos, solitárias ou em enlaces homoeróticos.
A exploração do acaso, do irracional e do sonho aparece no "Cadáver Delicioso" (1936), de Picasso, Éluard e Man Ray, no "Retrato de Picasso" (1938), por Dora Maar, e nas "Mulheres das 11 Horas" (1947), de Tanguy.
Entretanto a internacionalização do surrealismo a partir da Segunda Guerra Mundial dissociou progressivamente o movimento do ímpeto revolucionário original. Na parte final da exposição, vemos a aleatoriedade das obras ditas surrealistas, desde a foto com adesivos de pássaros "Sexta Aurora", de Cornell, até o desenho "Mulher e Pássaro" (1970), de Miró.


Sonhando de Olhos Abertos
    
Onde: Instituto Tomie Ohtake (r. Coropês, 88, Pinheiros, tel. 2245-1900)
Quando: ter. a dom., das 11h às 20h; até 28 de novembro
Quanto: entrada franca



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