São Paulo, Sábado, 29 de Janeiro de 2000


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DANÇA
Autor da técnica de improvisação de contato, bailarino se apresenta hoje e amanhã no Sesc Pompéia
Steve Paxton traz o pós-moderno a SP


ANA FRANCISCA PONZIO
especial para a Folha

Steve Paxton, artista que ajudou a construir a história da dança moderna e que desde os anos 60 vem sendo cultuado nos circuitos nobres das artes, está no Brasil pela primeira vez.
Os dois espetáculos que realiza hoje e amanhã, no Sesc Pompéia, junto com Lisa Nelson, igualmente importante, podem desde já ser considerados um dos principais acontecimentos artísticos de 2000.
Um dos mentores do movimento pós-modernista que eclodiu em Nova York nos anos 60, Paxton é autor de uma técnica -a improvisação de contato (ou "contact improvisation")- que entrou definitivamente no repertório dos coreógrafos e bailarinos contemporâneos.
Apesar de sua expressividade cênica, Paxton preferiu concentrar sua carreira no ensino e na pesquisa, atividade que ele parece assumir como uma natureza complementar. Por essa razão, expandiu a técnica de improvisação de contato para horizontes bem mais amplos.
Exemplo dessa evolução é a "spine technique" (ou técnica da coluna vertebral), sobre a qual ele vai discorre na próxima semana, em workshops promovidos pelo Estúdio Nova Dança.
Uma breve introdução sobre a improvisação de contato está nos trechos da entrevista de Paxton à Folha, iniciada por e-mail e finalizada pessoalmente em São Paulo, na tarde de anteontem. Aos 60 anos, Paxton tem a aparência física de um jovem de 30, somada a uma simplicidade e uma placidez que parecem conter uma sabedoria milenar.

Folha - O que o estimulou a criar a técnica de improvisação de contato?
Steve Paxton -
Nos anos 60 havia um ambiente favorável. Meus colegas inventavam novas formas de dança. Eu, particularmente, concentrava meus estudos em técnicas de dança e também nas artes marciais do Japão e China, aikido e tai chi chuan. Também me influenciou o fato de viver em Nova York. Era preciso reagir contra essa cidade monstro, que obriga seus cidadãos a se adaptar a uma vida antinatural, que insulta as possibilidades do corpo.

Folha - Que influências tiveram a ginástica, o aikido e a meditação no desenvolvimento da improvisação de contato?
Paxton -
Em todas essas técnicas é importante saber lidar com a segurança. Meditação envolve o corpo em quietude. Aikido e ginástica envolvem o corpo em movimento, mas em diferentes estilos de movimento.
Ao desenvolver a improvisação de contato, foi necessário ensinar os alunos a explorar a improvisação como resultado da comunicação por meio do toque. O aspecto mais óbvio da improvisação é que é voltada para o interior de cada pessoa, seus reflexos, gosto, mente e temperamento.
As pessoas precisam explorar muitos aspectos de si mesmas. Despertar fisicamente não significa apenas usar o corpo. Significa aprender a estudar o corpo durante a dança, os esportes ou mesmo quando se está em pé ou caminhando. É preciso aprender a concentrar a mente, para reter as sensações do corpo enquanto o usamos e fazer dele uma fronteira a ser explorada. Trata-se de um processo surpreendente. É infinitamente interessante estudar a inter-relação entre o corpo e a mente que estuda o corpo.
Ginástica, aikido e meditação, junto com dança clássica e moderna, deram-me informações para criar uma maneira de conduzir a improvisação de contato no sentido do que poderia se fazer com segurança e o que deveria ser evitado.

Folha - Qual a atitude que o dançarino deve ter com relação a seu corpo quando pratica a improvisação de contato?
Paxton -
Deve ter uma concentração forte, clara e consistente sobre as sensações físicas de seu próprio corpo e aquelas que capta de seu parceiro, por meio da comunicação do toque e do peso.

Folha - Você pode explicar as bases técnicas da improvisação de contato?
Paxton -
Durante a prática, é natural descobrir e desenvolver mais habilidades. Os exercícios que ensinamos para iniciantes são exemplos que muitas vezes surgem no ato da improvisação, quando se toca o parceiro. Para desenvolver a mais completa concentração física, as "meditações" envolvem respiração, permanência em pé e vários modelos físicos sobre partes do corpo.
Talvez seja importante dizer quais são as bases técnicas que não devem ser usadas. O aluno não deve tentar copiar o professor ou lutar com o exercício sugerido e ver o que acontece. Nem tentar conseguir possibilidades muito ativas ou difíceis até estarem prontos para fazê-las. Isso exige que cada aluno estude seu próprio corpo, não somente os corpos de seu professor ou dos outros estudantes. Desenvolver força e flexibilidade exige tempo e prática. Em resumo, improvisação de contato não é uma técnica a ser adquirida, mas um processo de descoberta de um potencial ainda não utilizado.
Por exemplo: quando um bebê começa a emitir sons, percebe-se que ele tem a possibilidade de produzir todos os sons humanos. Quando ele começa a falar, alguns sons não são necessários para sua nova linguagem, e então ele deixa de usá-los. Linguagem, então, torna-se um limite da mente, em culturas particulares que usam som para comunicação.
Com o movimento é a mesma coisa. Cada cultura tem "regras" de movimento. Em culturas com forte interação com o ambiente natural, o corpo aprende a se limitar até o estágio em que se torna totalmente dependente da cultura para sobreviver. Quando isso acontece, o corpo deixa escapar a habilidade de sobreviver na natureza. Com isso, eu não quero dizer que poderíamos sobreviver se repentinamente fôssemos deslocados para um deserto, por exemplo. Na verdade, coloco questões mais simples, como: você tem uma relação saudável com a gravidade? A natureza começa no corpo.


Espetáculos: Some English Suites, Dodo e PA RT
Com: Steve Paxton e Lisa Nelson
Quando: hoje, às 21 h, e amanhã, às 18h
Onde: teatro do Sesc Pompéia (r. Clélia, 93, tel. 3871-7700)
Quanto: R$ 10 e R$ 5
Workshops: Material para a Coluna, com Steve Paxton; Composição, Improvisação e o Sentido da Imaginação, com Lisa Nelson
Quando: de 31/01 a 4/02; às 10h (Steve Paxton) e às 16h (Lisa Nelson)
Onde: Estúdio Nova Dança (r. Treze de Maio, 240, 2º andar, tel. 259-7580)
Quanto: R$ 300 e R$ 180
O quê: Fórum de Debates e Performance
Quando: 5/02, às 15h e 21h
Onde: Estúdio Nova Dança
Quanto: R$ 5 e R$ 10


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