|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
33ª MOSTRA DE SP
Crítica/"Ervas Daninhas"
Alain Resnais volta irônico em longa
Entre a comédia e o suspense, "Ervas Daninhas" mostra fraquezas e impulsos escondidos sob as banalidades da vida
ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL
Na sequência de abertura de
"Ervas Daninhas", a câmera está voltada para o chão. Na tela,
vemos o asfalto trincado pela
grama que, mesmo não desejada, insiste em brotar - não sem
causar algum estrago, claro.
Alain Resnais, aos 87 anos, sabe
bem que certas coisas, como as
ervas daninhas, são inevitáveis
na vida. É sobre elas que se debruça mais uma vez.
Em seu novo filme, o cineasta
francês repete a estrutura de
histórias entrecruzadas de
"Medos Privados em Lugares
Públicos" (2006) para, com doses de ironia e melancolia, nos
aproximar de personagens que,
por trás da aparência normal,
guardam impulsos secretos,
fraquezas disfarçadas.
Um narrador "demodè" na
maneira de falar se encarrega
de apresentar ao público os
personagens principais dessa
história nascida do romance
"L'Incident" ["O Incidente"],
de Christian Gailly.
Sabine Azéma, atriz-chave de
outros filmes recentes do diretor, é Marguerite Muir, a dentista de cabelos desgrenhados e
um gosto especial por sapatos e
aviões que, logo no início da
trama, tem a carteira roubada.
André Dussollier, impecável,
dá vida a Georges Palet, homem
casado, de vida pacata, que,
num estacionamento, encontra
a tal carteira roubada.
Está dada a largada para os
encontros e desencontros armados, um pouco como thriller, um pouco como comédia,
pelo diretor. A obsessão que
Palet desenvolve pela dona da
carteira desencadeará uma série de acontecimentos absurdos. E Resnais, que sempre tratou o cinema como labirinto,
usa e abusa do improvável.
O autor que, décadas atrás,
deixou o mundo atônito ao
romper a lógica narrativa com
"Hiroshima, Meu Amor"
(1959) e "O Ano Passado em
Marienbad" (1961) pode até ter
diminuído a altura dos voos estéticos. Mas segue irrequieto. E
surpreendente.
Seja ao reproduzir um beijo
de cinema hollywoodiano, com
a trilha sonora da Twentieth
Century Fox ao fundo, seja ao
embarcar na imaginação febril
do protagonista, Resnais mostra que, mesmo quando parece
desejar apenas divertir o espectador, exige dele um pacto: o
pacto com o desconhecido.
É que seus personagens não
são movidos por razões práticas e suas ações não têm muito
sentido. Trapalhões involuntários, eles são puro inconsciente
e imaginação.
Se, como diz Georges Palet ao
ver uma moça de calça branca e
calcinha preta, "tudo é perdoável, menos o mau gosto", para
Resnais, tudo é perdoável, menos a obviedade.
ERVAS DANINHAS
Quando: hoje, às 22h, no Cinemark
Shopping Eldorado
Classificação: 12 anos
Avaliação: ótimo
Texto Anterior: Ágora revisita "Ricardo 3º" com olhar político Próximo Texto: Crítica/"Roman Polanski"/ "Transcendendo Lynch": Documentários de brasileiros sobre Lynch e Polanski são irregulares Índice
|