São Paulo, quinta-feira, 29 de outubro de 2009

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33ª MOSTRA DE SP

Crítica/"Ervas Daninhas"

Alain Resnais volta irônico em longa

Entre a comédia e o suspense, "Ervas Daninhas" mostra fraquezas e impulsos escondidos sob as banalidades da vida

ANA PAULA SOUSA
DA REPORTAGEM LOCAL

Na sequência de abertura de "Ervas Daninhas", a câmera está voltada para o chão. Na tela, vemos o asfalto trincado pela grama que, mesmo não desejada, insiste em brotar - não sem causar algum estrago, claro.
Alain Resnais, aos 87 anos, sabe bem que certas coisas, como as ervas daninhas, são inevitáveis na vida. É sobre elas que se debruça mais uma vez.
Em seu novo filme, o cineasta francês repete a estrutura de histórias entrecruzadas de "Medos Privados em Lugares Públicos" (2006) para, com doses de ironia e melancolia, nos aproximar de personagens que, por trás da aparência normal, guardam impulsos secretos, fraquezas disfarçadas.
Um narrador "demodè" na maneira de falar se encarrega de apresentar ao público os personagens principais dessa história nascida do romance "L'Incident" ["O Incidente"], de Christian Gailly.
Sabine Azéma, atriz-chave de outros filmes recentes do diretor, é Marguerite Muir, a dentista de cabelos desgrenhados e um gosto especial por sapatos e aviões que, logo no início da trama, tem a carteira roubada.
André Dussollier, impecável, dá vida a Georges Palet, homem casado, de vida pacata, que, num estacionamento, encontra a tal carteira roubada.
Está dada a largada para os encontros e desencontros armados, um pouco como thriller, um pouco como comédia, pelo diretor. A obsessão que Palet desenvolve pela dona da carteira desencadeará uma série de acontecimentos absurdos. E Resnais, que sempre tratou o cinema como labirinto, usa e abusa do improvável.
O autor que, décadas atrás, deixou o mundo atônito ao romper a lógica narrativa com "Hiroshima, Meu Amor" (1959) e "O Ano Passado em Marienbad" (1961) pode até ter diminuído a altura dos voos estéticos. Mas segue irrequieto. E surpreendente.
Seja ao reproduzir um beijo de cinema hollywoodiano, com a trilha sonora da Twentieth Century Fox ao fundo, seja ao embarcar na imaginação febril do protagonista, Resnais mostra que, mesmo quando parece desejar apenas divertir o espectador, exige dele um pacto: o pacto com o desconhecido.
É que seus personagens não são movidos por razões práticas e suas ações não têm muito sentido. Trapalhões involuntários, eles são puro inconsciente e imaginação.
Se, como diz Georges Palet ao ver uma moça de calça branca e calcinha preta, "tudo é perdoável, menos o mau gosto", para Resnais, tudo é perdoável, menos a obviedade.


ERVAS DANINHAS

Quando: hoje, às 22h, no Cinemark Shopping Eldorado
Classificação: 12 anos
Avaliação: ótimo




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