São Paulo, Terça-feira, 03 de Agosto de 1999
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

OPINIÃO
O desafio da rodada do milênio

PEDRO DE CAMARGO NETO


A negociação da rodada Uruguai, embora tenha tido o reconhecido mérito de incluir de maneira definitiva o comércio agrícola nas regras multilaterais da Organização Mundial de Comércio, abriu poucos novos mercados para o Brasil. A próxima rodada, que para o setor agrícola inicia-se este ano em Seatle (EUA), carrega o desafio de aumentar as exportações.
A questão do prazo será essencial. A globalização, a pressão da balança de pagamentos, o equilíbrio das transações correntes, a retomada do desenvolvimento e a geração de empregos exigem resultados rápidos. O cronograma da Alca, a aproximação com a União Européia e o fortalecimento do Mercosul também. O prazo natural é de três anos. Precisamos deste prazo e temos o frágil trunfo da cláusula de paz da rodada Uruguai. Termina no fim de 2002 a liberdade irrestrita para subsidiar. A partir desta data, poderemos contestar as políticas.
O formato da negociação já está montado. O mérito da rodada Uruguai foi direcionar as negociações agrícolas para três grandes frentes: acesso a mercados, políticas internas e subsídio para a exportação. Não é preciso inventar e, sim, procurar avanços.
A negociação de acesso a mercado será sempre prioritária. A etapa de tarifar, isso é, transformar em tarifas com transparência as barreiras, trabalho fundamental da rodada Uruguai, está cumprida. Deixou como legado tarifas absurdas e complexos sistemas de quotas tarifárias. Será preciso reduzir tarifas e ampliar quotas, aumentando o acesso. Como? Da maneira que for possível e que garanta um contínuo aumento de mercados. Não se esperam milagres; se exige progresso.
As políticas internas serão certamente campo de grandes discussões. A proposta de multifuncionalidade da agricultura defendida pela União Européia, onde o agricultor passa a ser visto não só como um produtor de bens agrícolas, mas como um guardião da qualidade de vida da nação e mantenedor do espaço rural, e a recente violência dos subsídios norte-americanos, exigirão cuidado e debate. Será preciso enquadrar os excessos. É preciso, porém, reconhecer que é impossível proibir políticas internas que contam com amplo apoio da sociedade. Até mesmo no Brasil, a ausência de políticas internas compensatórias é fruto, antes de mais nada, de limitações orçamentárias.
É preciso transformar os suportes nos preços de mercado em suportes na renda do agricultor. Apoios à renda continuam certamente a significar distorções ao comércio, mesmo que incluam restrições orçamentárias. São, porém, muito melhores que os apoios por meio de preços. Representam um avanço e garantem transparência, possivelmente tornando-se de difícil sustentação política no futuro.
Os subsídios à exportação precisarão ser terminados. A eliminação dessa prática comercial injusta não implica negar nenhum dos princípios fundamentais das políticas internas. A eliminação dessa prática somente obriga a que os desajustes entre demanda e oferta sejam realizados internamente, acabando com a simplista e prejudicial desova de excedentes no mercado externo.
É preciso obrigar que os países ricos paguem integralmente suas políticas internas, rejeitando que transfiram parte deste custo para os países em desenvolvimento. Existe aqui uma concreta possibilidade de avanço, de grande significado econômico. Será preciso grande pressão, pois necessitamos disso com enorme urgência.


Pedro de Camargo Neto, 50, doutor em engenharia, é presidente do Fundo de Desenvolvimento da Pecuária de São Paulo e diretor do International Policy Council on Agriculture, Food and Trade.



Texto Anterior: Macrobiótica: Restaurante produz os seus alimentos
Próximo Texto: Leilões & Criação: Fazenda de leite de Minas ganha o ISO 9002
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.