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VISÃO DA CRISE
Corrupção não tem
fim, diz promotor
CRISTINA FIBE
DA REDAÇÃO
O excesso de individualismo e a
inversão do princípio da impessoalidade na administração pública fazem com que os políticos
se apropriem do bem público, de
um lado, e façam das investigações um espetáculo, de outro. Pelas mesmas razões, a sociedade
não se sente diretamente prejudicada pela corrupção.
É a opinião do promotor de Justiça Roberto Livianu, cuja tese de
doutorado na Faculdade de Direito da USP (Universidade de São
Paulo), orientada pelo ex-ministro da Justiça Miguel Reale Jr., teve como tema a corrupção.
Para Livianu, não há como acabar com o crime, que deve ser
combatido por meio da educação,
da colaboração internacional e da
criação de um modelo de combate exclusivo para o Brasil.
Além disso, diz, é fundamental
que a Justiça mude sua visão em
relação à corrupção. O promotor
acha que há preconceito por parte
de juízes, para quem "o indivíduo
que entrou armado em um ônibus e levou R$ 50 de alguém (...)
coloca em risco a sociedade de
uma maneira mais forte do que
aquele que pratica a corrupção".
Leia a seguir trechos da entrevista concedida à Folha:
Folha - Como acabar com a corrupção?
Roberto Livianu - Não há como
acabar. A corrupção precisa ser
mantida sob controle. Podemos
ter alguns paliativos, mas não
adianta ter a ilusão de que isso vai
reverter brutalmente esse quadro.
O que enxergamos hoje é uma
aparente situação de corrupção
endêmica, generalizada. Acho
que vale a pena observar que essa
visibilidade toda não significa que
a corrupção aumentou: ela está
mais visível porque as instituições
estão funcionando.
Folha - Então essa crise não é a
mais grave da história do país?
Livianu - Não, essa é uma afirmação que está carregada de sectarismo político, de interesses. A
corrupção está muito visível porque está havendo mais apuração.
Folha - Os pequenos atos de corrupção e a corrupção na gestão pública legitimam um ao outro?
Livianu - Sim, como se houvesse
uma espécie de compensação. A
coisa está enraizada. As pessoas
toleram, quem ingressa na administração pública acha absolutamente comum receber presentes.
Existe uma atitude ruim de misturar a esfera pública em relação à
privada. Outra questão fundamental é melhorar o sistema de
controle dos partidos. É necessário ter controles mais efetivos.
Folha - Como a reforma política
pode ajudar?
Livianu - Quando o indivíduo é
eleito, o mandato se torna um
bem material que ele comercializa. Essa frouxidão de regras faz
com que o parlamentar não tenha
vínculo com princípios éticos.
Precisamos fazer reforma, implantar medidas que estejam conectadas às nossas necessidades.
Folha - Qual é o nosso caminho?
Livianu - Acho que precisamos
melhorar alguma coisa nas leis. A
pena tem de ser dosada proporcionalmente a seu dano social.
Folha - É preciso criar mais leis?
Livianu - Não. O principal é que
a gente tenha um amadurecimento da atitude dos operadores. Há
um conceito de que esse crime do
colarinho-branco não é tão grave.
Folha - Por quê?
Livianu - Quando estou lidando
com corrupção não existe clareza
para o juiz de que aquilo está lesando o interesse de milhares, de
milhões de pessoas. Ele acha que
o indivíduo que entrou armado
em um ônibus e levou R$ 50 de alguém, pelo fato de ter agido com
violência ou grave ameaça, coloca
em risco a sociedade de maneira
mais forte do que aquele que pratica a corrupção.
Folha - Em sua tese o sr. relaciona
a sociedade do espetáculo à corrupção...
Livianu - As pessoas estão vivendo um momento de muito egocentrismo, os políticos muitas vezes agindo por interesses pessoais, e aí nós temos um conjunto
de ingredientes bastante perigoso. A imprensa é um personagem
vital para a democracia, mas o
exercício da imprensa tem de ser
equilibrado. Não se admite o abuso de poder por parte do promotor nem por parte da mídia. Existe
o uso da mídia para o espetáculo.
Folha - Em que medida isso pode
afetar o andamento adequado das
investigações nas CPIs?
Livianu - Essa coisa da excessiva
vaidade, os políticos se esquecem
de que devem exercer o poder de
forma impessoal. Está na Constituição o princípio da impessoalidade na administração pública.
Aquilo [o Congresso] não é um
picadeiro. Nós vivemos um momento em que temos essa espetacularização à flor da pele. E ela é
boa para a mídia, vende jornal.
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