São Paulo, domingo, 01 de janeiro de 2006

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FÉ NO VOTO

Pastores e "obreiros" da Quadrangular escolhem nomes que receberão apoio em campanhas

Igreja faz prévias para indicar candidatos

RAFAEL CARIELLO
DA REPORTAGEM LOCAL

Na Igreja do Evangelho Quadrangular, de origem pentecostal que, segundo o Censo 2000, reunia naquele ano 1.318.805 fiéis no país, as eleições de 2006 começaram no início de 2005.
Como a Igreja Universal do Reino de Deus e a Assembléia de Deus, a Quadrangular indica candidatos a deputado federal e estadual para seus seguidores e orienta o seu voto, com uma diferença: os nomes, em cada Estado, não são impostos pela cúpula da organização, mas escolhidos -a partir da apresentação de pré-candidaturas- pelo voto secreto de pastores e "obreiros".
O processo de prévias, que já havia ocorrido em 2001, se tornou mais rigoroso no ano passado, diz o deputado federal Jefferson Campos (PTB-SP), um dos coordenadores políticos da igreja e que, pretendendo concorrer à reeleição, apresentou seu nome para a disputa em São Paulo.
Venceu com 63,1% dos votos no Estado, seguido pelos também pastores Jaime Caputti (20,4%) e Armando Bittencourt (14,6%). Há uma racionalidade clara, diz Campos, por trás do processo que, segundo ele, ajuda a igreja e torna mais efetiva a indicação de nomes: "A vantagem da prévia é que você não tem contestação quanto ao candidato; ele foi escolhido pela base".
O deputado diz que, antes das prévias, já aconteceu de indicados pela direção da igreja não passarem pelo crivo do conjunto dos pastores, não receberem apoio nem se elegerem. Nas eleições de 2002 e 2004, diz, "nenhum pastor colocou um deputado estranho no púlpito".
A lógica continua: votam só os pastores titulares de cada igreja específica e os auxiliares com dedicação exclusiva -em São Paulo, isso corresponde a um colégio de cerca de 3.500 pessoas; "restringimos porque são os que efetivamente estão envolvidos no dia-a-dia da igreja"- em candidatos, também pastores, obrigados a mostrar documentos para "provar idoneidade", entre eles comprovantes de nenhuma ocorrência criminal e "certidão negativa do SPC [Serviço de Proteção ao Crédito]".
Quem vence tem os fiéis de um Estado inteiro como reduto eleitoral a seu dispor. A Quadrangular lança um candidato a deputado federal e outro a estadual em todas as unidades da Federação, exceto Minas Gerais, onde há dois postulantes para cada um.
O pastor Jaime Caputti resolveu disputar a candidatura por São Paulo para a vaga federal no início de 2005. Vice-prefeito, em segundo mandato, de Agudos (SP), ele diz que queria ser deputado para realizar no país o mesmo trabalho de "libertação" que realiza em seu município.
"Há muitas coisas que estão amarrando a nossa nação. Isso é conseqüência do que acontece no mundo espiritual." Chamado a dar exemplos, diz: "Pecados no passado, como a escravidão. Como autoridade, poderíamos guerrear no nível espiritual".
Passou os primeiros meses do ano passado nessa empreitada, mas foi derrotado por Campos nas prévias do Estado. Promete agora apoio ao deputado.
Para participar do processo, ele diz, há algum custo, já que cabe ao próprio pré-candidato o custeio de viagens para fazer campanha com os pastores. Isso é compensado, afirma Campos, na campanha do ano seguinte, quando o fato de contar com os votos da igreja diminui os custos de campanha. "Não dependo de grupos financeiros", declara.
Com três deputados federais, a Quadrangular acredita que pode fazer dez representantes na Câmara nestas eleições.
O mandato, diz Campos, é "ligado diretamente à igreja". Uma de suas preocupações centrais é a defesa de temas "éticos e doutrinários", como o combate ao aborto e ao homossexualismo.
O deputado estadual Waldir Agnello (PTB-SP), também candidato à reeleição e vencedor da prévia da Quadrangular com 65,3% dos votos, diz "não ter dúvidas" de que a representação evangélica nas assembléias do país vai crescer. "Até por conta desse cenário de insatisfação."
No terceiro domingo de dezembro, Agnello e Campos visitaram uma igreja da Quadrangular em Sorocaba (SP). Naquela manhã, o deputado já havia falado para fiéis em São José dos Campos (SP) e visitaria outras duas igrejas na mesma noite.
Ao final de uma celebração, Campos subiu ao púlpito. "Está aqui conosco o pastor Waldir Agnello. Ele é nosso deputado estadual. Quantos ainda não o conhecem? Levantem a mão." Um terço da igreja manifestou desconhecer o político. "Esse é o nosso brilhante deputado estadual que hoje veio pregar a palavra", continuou Campos.
Agnello assume o microfone: "Em Brasília há uma deputada que apresentou um projeto e que trabalha com um empenho muito grande para que se libere de uma vez o aborto". E segue: "Conseguimos realizar uma mobilização, a ponto de [o projeto] não ser votado neste ano". Palmas. "Amém", dizem alguns.


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