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BRASIL PROFUNDO
Lula, que anunciou ação como prioridade, mantém diárias congeladas
Elite do combate ao trabalho escravo paga para trabalhar
MAURO ALBANO
DA AGÊNCIA FOLHA
Auditores ligados ao grupo móvel de fiscalização do Ministério
do Trabalho, unidade de elite do
combate ao trabalho escravo, precisam pagar com dinheiro do próprio bolso parte dos custos das
ações. O governo de Luiz Inácio
Lula da Silva, que lançou em março do ano passado o Plano Nacional de Erradicação do Trabalho
Escravo e anunciou que o combate a esse crime seria uma de suas
prioridades, não aumentou o valor pago diariamente aos enviados em missões de resgate, considerado abaixo do necessário e
congelado desde 1995.
Na quarta-feira passada, três
auditores fiscais do Trabalho, ligados ao departamento regional
de Belo Horizonte, e o motorista
que os acompanhava foram mortos na rodovia vicinal MG-188, a
55 km de Unaí (MG). Os quatro
receberam tiros na cabeça. Uma
força-tarefa investiga o crime.
O objetivo dos fiscais mortos,
que estavam na área desde segunda-feira, era vistoriar as condições
de trabalho, remuneração e acomodação das pessoas arregimentadas para colherem a safra de feijão, que acontece de 15 de janeiro
até o final de fevereiro na região.
Apesar de um dos fiscais ter recebido ameaças de morte, o grupo
não tinha proteção policial.
Operação de risco
O grupo móvel é deslocado para
fazendas no interior do país que
sofreram denúncia de trabalho
escravo. Como são operações
consideradas de risco, os fiscais
são acompanhados da Polícia Federal. Cada integrante da ação
-um fiscal-coordenador, outros
cinco auditores fiscais e seis policiais federais- recebe uma diária
de R$ 68,94 para ajuda de custos.
Fiscais relataram à Agência Folha, sob a condição de que seus
nomes não fossem revelados, que
o valor não cobre os custos e que
esse problema gera atrasos e deficiências na fiscalização.
A diária em hotel médio no sul
do Pará, por exemplo, custa cerca
de R$ 50. O resto do dinheiro não
é suficiente, dizem os fiscais, para
a alimentação. Além disso, eles
geralmente têm de pagar todas as
despesas dos "X-9" -como são
chamados os informantes- que
os auxiliam a achar as fazendas.
As ações podem durar até 15
dias, devido à dificuldade em encontrar as fazendas, a maioria delas no sul do Pará e no norte de
Mato Grosso, e em negociar o pagamento das rescisões trabalhistas com os fazendeiros autuados.
Os auditores fiscais dizem gastar de R$ 300 a R$ 400 do próprio
bolso em cada operação. Por causa desse problema, eles relatam
dificuldades em arregimentar
pessoal para participar das ações.
Ninguém mais aceita ir, só
aqueles que têm compromisso
com a causa, relata um coordenador. Algumas ações já foram
comprometidas por isso. Até conseguir reunir um grupo, a fiscalização havia perdido o flagrante.
A resistência em participar das
ações também aumenta pela
ameaça de falta de segurança. Segundo eles, os policiais federais
que deveriam garantir sua proteção costumam se hospedar em
hotéis mais baratos, para não exceder o valor recebido da diária.
Com isso, não passam a noite
no mesmo local que os fiscais, que
muitas vezes são ameaçados por
fazendeiros. O Sinait (Sindicato
Nacional dos Auditores Fiscais do
Trabalho) confirmou as críticas.
"Os fiscais estão pagando para
trabalhar", disse Claudio Secchin,
membro do conselho fiscal do
sindicato. O grupo móvel foi criado em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso. A idéia
era criar uma estrutura de fiscalização diretamente subordinada a
Brasília, para evitar que os fiscais
ficassem expostos -como ocorreu no caso dos fiscais mortos.
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