São Paulo, domingo, 1 de fevereiro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

VISITA À SUÍÇA
FHC comenta que anúncio de unidade monetária para o Mercosul é "puro devaneio" de colega argentino
Moeda única está em marcha, diz Menem

CLÓVIS ROSSI
enviado especial a Davos (Suíça)

O presidente argentino Carlos Menem anunciou ontem que já pôs em marcha o processo para a criação de uma moeda comum para todos os quatro países do Mercosul (Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai).
O anúncio, em almoço de que participaram seus colegas Fernando Henrique Cardoso (Brasil) e Eduardo Frei (Chile), causou desconforto em FHC.
A Folha ouviu-o comentar com os que o cercavam que se trata de "puro devaneio" de Menem.
Do ponto de vista do presidente argentino, é bem mais que isso: a Folha apurou que Menem já encomendou um estudo ao seu secretário de Assuntos Estratégicos para apresentá-lo o mais depressa possível.
Aos presentes ao almoço, Menem disse que a idéia da moeda comum nascera na cúpula do Mercosul realizada em Montevidéu, em dezembro, e garantiu que vai-se "avançar muito depressa nesse processo". Chegou a dizer que a moeda única será "rapidamente uma realidade".
Para o Itamaraty, no entanto, a moeda única pode até vir a ser uma boa idéia, mas, antes disso, é preciso completar o processo de liberalização comercial no Mercosul, o que só acontecerá em 2005, bem depois de terminar, em 99, o mandato de Menem.
O almoço com os três presidentes, na "Dining Room" do hotel Schweizerhof, ao pé das nevadas montanhas de Davos, transformou-se em uma celebração tropical em torno do Mercosul.
"É uma das aventuras mais importantes na história da região", chegou a dizer o uruguaio Enrique Iglesias, presidente do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento). "É um dos instrumentos mais importantes de nossa inserção internacional", emendou Eduardo Frei.
"É um marco histórico e que se pode tomar como definitivo", reforçou Fernando Henrique.
Na festa tropical, não faltaram alegres provocações entre os três presidentes.
Frei contou que sua família era de uma cidade suíça próxima (Saint Gallen, também nos Alpes).
FHC aproveitou a informação para comentar: "Agora entendo porque os chilenos são tão bons em finanças".
Menem não quis ficar atrás: lembrou que era descendente dos fenícios, "que abriram as rotas ao comércio".
O presidente argentino cobrou as origens de FHC, que, na sua vez, aproveitou para tirar o pé da cozinha e dizer-se genuíno produto da União Européia (Portugal e Espanha, 2 dos 15 países que formam o conglomerado europeu).
Foram tantas as louvações ao Mercosul que seus governantes acabaram exagerando um pouco nos comentários.
Menem, por exemplo, ao falar da moeda única, disse que o Mercosul faria em cinco anos o que a Europa levou 50 para produzir, qual seja a unificação monetária.

FHC comenta Itamar
Antes do almoço, o presidente brasileiro concedeu rápida entrevista aos jornalistas, onde comentou decisão que teria sido tomada pelo ex-presidente Itamar Franco de concorrer à Presidência.
FHC disse que não teme um racha no PMDB com a candidatura de Itamar. Disse que não quer comentar o assunto antes de uma conversa que vai ter com o ex-presidente esta semana.
"Não quero opinar sobre outros partidos, tenho tido um apoio muito grande do PMDB nas reformas e temos relação muito boa hoje com o conjunto das forças representativas do PMDB", declarou. "O presidente Itamar é meu amigo e meu embaixador."
FHC disse que vai esperar o encontro com Itamar nessa semana para "sentir qual é a disposição dele". "Seja qual for a decisão dele, a tomarei com naturalidade."
"Ele sempre admitiu (que seria candidato). É um excelente amigo e sua candidatura é apenas uma questão de convencer o partido dele, mais nada", disse FHC.

Ingerência dos EUA
Sobre relatório dos EUA que critica o salário mínimo brasileiro e diz que no governo não existe uma representação negra, étnica, adequada, o presidente acusou os EUA de "ingerência".
"Acho que há ingerência de outros países. Não li o relatório, mas não fico falando sobre o que acontece dentro dos Estados Unidos."


Colaborou Irineu Machado, enviado especial a Davos


Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.