São Paulo, domingo, 1 de fevereiro de 1998

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TESTEMUNHA OCULAR
'Famílias tinham granada como suvenir'

PAULO LORENA
Especial para a Folha

Era comum encontrar essas granadas abandonadas depois da Revolução. As famílias tinham elas como suvenir em casa. Desarmadas, é claro. Ainda hoje, podem explodir. Se ela estourasse perto, matava uma pessoa fácil. Em uma trincheira, matava três ou quatro.
As granadas eram fabricadas em um fundição experimental do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas da Universidade de São Paulo) pelos alunos da Politécnica.
Ali, fizeram também um morteiro que foi muito usado na revolução. O superintendente do IPT perdeu a mão e o general Salgado, então comandante da Polícia de São Paulo, morreu, em um acidente testando esse morteiro.
Eu cheguei a conhecer essas granadas, mas não recebemos no nosso pelotão. Quando fomos atacados, perto de Águas da Prata, tínhamos rojões, que eram soltos contra os soldados para assustar, e uma maquininha que imitava o som de metralhadora. Com isso fizemos a polícia mineira recuar.
Nós, paulistas, não tínhamos artilharia pesada ou metralhadora. Só via isso na mão do inimigo.
Decidi ir para a Revolução junto com meu pai, Bernardo, e meu irmão Carlos porque sabíamos que Getúlio seria um ditador. Eu tinha 17 anos e, meu irmão, 15. Na época, havia várias reuniões em entidades para preparar a Revolução. Nós participávamos de um grupo na Associação Comercial.
Na noite de 9 de julho, convocaram a gente em casa. Eu não estava. A ordem era ir para o largo das Perdizes. Quando cheguei à noite, mamãe mal abriu a porta, me deu um casaco, e disse: "Corre e vê se encontra o pessoal. Estão se reunindo para começar a Revolução".
Encontrei. Recebemos fuzis com 10 balas e fomos ocupar a telefônica. No dia seguinte, fomos para Guaxupé, em Minas. Foram três meses de dificuldades e alguns combates. Éramos quase todos voluntários sem experiência militar. O exército profissional foi tacar o Rio. Se não parasse esperando o apoio dos mineiros, talvez tivesse chegado e derrubado o Getúlio.


PAULO LORENA, 84, engenheiro, é empresário


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