São Paulo, sábado, 01 de agosto de 2009

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TJ proíbe "Estado" de noticiar ação contra filho de Sarney

Desembargador Dácio Vieira, de Brasília, é amigo do senador e de Agaciel Maia

Magistrado determina que "O Estado de S. Paulo" leve uma multa de R$ 150 mil por cada texto que revele dados da Operação Boi Barrica

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA REPORTAGEM LOCAL

O desembargador do TJ (Tribunal de Justiça) do Distrito Federal Dácio Vieira proibiu ontem, em decisão liminar, o jornal "O Estado de S. Paulo" de publicar qualquer informação relativa à Operação Boi Barrica, ação da Polícia Federal que investiga, entre outros, Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).
A investigação da PF corre sob segredo de Justiça. Se não respeitar a decisão -que não foi divulgada por também ser sigilosa- , o jornal será punido com multa de R$ 150 mil por cada reportagem publicada. O desembargador atendeu pedido de Fernando Sarney, que é dono de um grupo de comunicação no Maranhão.
Após ter pedido negado na Justiça Federal, o advogado de Fernando, Eduardo Ferrão, entrou com uma ação, juridicamente chamada de medida inibitória, na Justiça do DF. O requerimento foi negado na primeira instância do TJ-DF por um juiz que entendeu que a proibição seria uma afronta à liberdade de imprensa e também que o conteúdo da Faktor já havia se tornado público.
Ferrão recorreu então à segunda instância, na qual obteve a decisão favorável a Fernando.
Para o advogado, "não se trata de censura". "A operação está sob segredo de Justiça, divulgar seu conteúdo é crime. Foi o que o desembargador disse."
O inquérito que resultou na operação foi instaurado em fevereiro de 2007, a partir de uma comunicação feita pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), que detectou movimentações atípicas no valor de R$ 3,5 milhões realizadas por Fernando e empresas da família, às vésperas da eleição de 2006. A suspeita era de caixa dois na campanha de Roseana ao governo, o que os filhos de Sarney negam.
A investigação da PF se desdobrou em cinco inquéritos. Fernando foi indiciado em três, por formação de quadrilha, gestão de instituição financeira irregular, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica. A mulher dele, Teresa Murad, e funcionários de empresas da família também foram indiciados.
A diretora jurídica do Grupo Estado, Mariana Uemura Sampaio, informou que o jornal foi oficialmente comunicado sobre a proibição por volta das 18h e recorrerá da decisão.
Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Grupo Estado, disse que "o jornal não se intimidará, como nunca se intimidou. O jornal respeita os parâmetros da lei e utiliza métodos jornalísticos lícitos e éticos para levar informações de interesse público à sociedade".
O diretor executivo da ANJ (Associação Nacional de Jornais), Ricardo Pedreira, disse que a entidade considera a decisão do TJ "censura prévia e que isso é inconstitucional. Não é uma questão que diga respeito unicamente a empresas jornalísticas, mas aos cidadãos, que ficam impedidos de receber as informações".
Sérgio Murillo de Andrade, presidente da Federação Nacional dos Jornalistas, fez crítica semelhante. "Impedir de maneira prévia, com o respaldo da Justiça, que as pessoas tenham acesso à infomação é violência ao direito que as pessoas têm de ser informadas."
O desembargador Dácio Vieira ocupava um cargo de confiança na gráfica do Senado antes de ser nomeado para o TJ-DF. Sua indicação para o tribunal deveu-se ao apoio que teve de José Sarney e do ex-diretor-geral Agaciel Maia, com quem mantem relação de amizade.
Vieira era consultor jurídico da gráfica na época em que o órgão era comandado por Agaciel. A Folha apurou que o ex-diretor usou a estrutura de pessoal da gráfica para recolher entre os senadores assinatura de apoio à candidatura de Vieira ao tribunal. A escolha de seu nome foi feita pelo presidente da República.
Sarney compareceu, em fevereiro deste ano, em sua posse na presidência do TRE-DF. Vieira, por sua vez, foi ao casamento da filha de Agaciel, quando posou para fotos ao lado de Sarney, Agaciel e do senador Renan Calheiros (PMDB-AL).
A Folha ligou na residência de Dácio Vieira, mas foi informada de que ele viajou para Minas Gerais e não levou telefone.
Neste ano, Dácio Vieira organizou um jantar de apoio a Agaciel Maia que enfrenta uma série de denúncias de irregularidades cometidas nos 14 anos em que chefiou a Diretoria Geral do Senado. O encontro ocorreu em um hotel de Brasília e reuniu diversos desembargadores da Justiça do Distrito Federal.
Agaciel deixou o cargo no início do ano, após a Folha revelar que ele escondeu da Justiça uma casa no valor de R$ 5 milhões.


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