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RAZÃO DE VOTO
Entre a intenção e o voto
MAURO FRANCISCO PAULINO
Apenas cerca de 3% dos eleitores irão às urnas no domingo
determinados a votar em branco
ou anular o voto para presidente.
É um contingente que agirá de
forma consciente, seja por protesto ou falta de opção. Seus votos serão desprezados no cálculo que
determinará a necessidade de
realização do segundo turno.
A apuração final mostrará que
a esses não-votos, ou "votos bronca", como são chamados na Argentina, serão acrescentados cerca de 15% de votos anulados acidentalmente por erro no manuseio da urna eletrônica ou por
pressa ocasionada pelo número
de cargos e pela pressão das filas.
Serão eleitores que, com intenção
de voto definida, não conseguirão
transformá-la em voto válido.
O fenômeno já ocorria com as
cédulas de papel. Muitos dos votos deixados em branco eram fruto mais da apatia do que sinal de
protesto. Havia também votos
anulados por erros de grafia ou
desconhecimento da forma correta de votar. Quem queria protestar anulava o voto escrevendo
mensagens ou nomes fictícios na
cédula. A introdução do voto eletrônico impossibilita essa prática,
mas amplia a possibilidade da
anulação involuntária. Por outro
lado, diminui a incidência de votos brancos. Já abordado anteriormente neste espaço, a compreensão desse fato é importante
para a avaliação correta do resultado final e dos números das últimas pesquisas.
Em 1998 a eleição foi totalmente
informatizada em alguns Estados. Estes fornecem bons exemplos das mudanças na dinâmica
do voto para presidente. No Rio
de Janeiro, em comparação com
1994, os votos brancos caíram de
6,1% para 3,3%, e os nulos subiram de 8,9% para 12,0%.
Essa mesma comparação feita
em Alagoas, Estado com maior
taxa de analfabetos, torna-se ainda mais reveladora: em 94, 13,3%
dos eleitores deixaram suas cédulas em branco, já em 98 apenas a
metade (6,3%) digitou a tecla
branca da urna. Em compensação, os votos nulos aumentaram
de 16,3% para 21,1%.
No total do país, 9,2% dos eleitores votaram em branco para
presidente em 94, todos votando
em urnas tradicionais, taxa que
caiu para 8,0% na eleição seguinte, quando 57,6% usaram urna
eletrônica. Por sua vez, os votos
nulos subiram de 9,6% para
10,7%. Agora, com a nova forma
de votação chegando aos grotões,
é plausível supor que cairá ainda
mais a taxa de brancos e subirá a
de nulos involuntários.
Os votos brancos representarão
de maneira mais próxima o contingente de eleitores insatisfeitos
que, de forma consciente, não votarão em ninguém. Os nulos, em
sua maioria, serão votos desperdiçados, perdidos em meio aos
desacertos do eleitor menos informado ou mais afobado, sem condições de externar seu voto.
Isso retira do processo eleitoral
uma parcela de eleitores já em
condição de exclusão social mas
que, por dever ou desejo, comparecerão às urnas, enfrentarão as
filas e tentarão digitar suas opiniões sem conseguir. Seus intuitos
ficarão registrados apenas nas
pesquisas de intenção de voto.
Em decisões apertadas, o candidato cujo eleitorado tenha uma
concentração maior entre os mais
escolarizados poderá ser favorecido em alguns pontos percentuais.
É o caso de Lula. Não é o de Garotinho. Já Serra e Ciro têm os votos
distribuídos de forma mais homogênea. Em uma eleição que
chega ao final com a perspectiva
de decisões milimétricas, este pode ser o detalhe que decidirá a necessidade de haver segundo turno
e, em havendo, quem será o adversário de Lula.
MAURO FRANCISCO PAULINO,
diretor-geral do Datafolha, escreve
às terças-feiras nesta coluna
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