São Paulo, sexta-feira, 01 de novembro de 2002

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JANIO DE FREITAS

O seu ao seu dono

Uma das frases da moda -"o PT votou contra isso"- foi ampliada por Fernando Henrique Cardoso ao falar de reformas como a da Previdência, a política, a tributária: "O PT votou contra tudo". A frase e a acentuação enfática que lhe foi dada não merecem reparo. Mas o seu uso, com o propósito de induzir a idéia de que tais reformas não foram feitas porque a oposição as impediu, é uma adulteração dos fatos contra a boa-fé alheia.
Ao governo jamais faltaram votos, como provam as privatizações, as várias alterações feitas na Constituição e, mais recentemente, para não deixar dúvida de que nada mudara com os anos, as reduções da proteção legal ao trabalhador. O método fisiológico que o governo adotou desde o seu início, instituindo a compra e venda de voto parlamentar como sistema, com frequência exigiu-lhe, isto é, aos cargos e cofres públicos, concessões menos imediatas. Mas, como resultado, só não foi aprovado o que o governo não quis.
A reforma política nem entrou em cogitação, exatamente para preservar o domínio obtido sobre o Congresso. A reforma da Previdência nunca foi procurada com seriedade, com a equipe econômica, e particularmente a Fazenda, aceitando apenas um remendo aqui, outro ali.
E a reforma tributária, que disputou com a da Previdência as referências à sua necessidade, proporcionou um formidável espetáculo de embuste durante anos. Até que um deputado de prestígio na bancada governista recebeu da Presidência a incumbência ou a autorização para levar adiante, como relator, um projeto de reforma tributária. Ouviu muita gente, manteve permanente exame do assunto com a equipe econômica, viajou por aí, nisso investindo o ano. Quando chegava aos arremates, no ano passado, e o projeto em breve se encaminharia para votação, ou para a certa aprovação, o deputado recebeu da Presidência a ordem de esquecer a reforma imediata e absolutamente. Abatido, recolheu-se ao silêncio e fez um afastamento indeclarado em relação ao governo. Tinha sido líder governista na Câmara, hoje é o governador eleito do Rio Grande do Sul, o peemedebista Germano Rigotto.
Talvez no próximo ano os futuros oposicionistas sejam liberados para considerar de fato as reformas da Previdência, a política e a tributária, de cuja necessidade tanto falaram enquanto as relegavam nos últimos oito anos.



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