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São Paulo, segunda-feira, 01 de dezembro de 2003

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REFORMA AGRÁRIA

Governo federal dispõe de R$ 1 bilhão no Orçamento 2004

Para assentar cadastrados, seria preciso R$ 4,6 bilhões

Luiz Carlos Murauskas/Folha Imagem
Acampamento Pátria Livre, do Movimento dos Sem-Terra, em acostamento no quilômetro 90 da rodovia Castelo Branco em SP


EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA

O governo precisaria desembolsar R$ 4,6 bilhões caso quisesse assentar hoje as 166 mil famílias de sem-terra que foram cadastradas neste ano em acampamentos. O levantamento foi feito pela Agência Folha a partir de planilhas fornecidas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
O Orçamento de 2004 prevê R$ 1,005 bilhão para o Ministério do Desenvolvimento Agrário.
O cálculo se baseia em dois levantamentos feitos pelo Incra neste ano. Um deles mediu o custo médio para assentar cada família de sem-terra, e outro, o número de famílias acampadas no país.
Os resultados são diferenciados por Estado. São Paulo teve o maior custo médio para assentar cada família: R$ 99.415. Mais de 30 vezes a média do Piauí: R$ 3.129 (leia texto nesta página).
O valor se refere à desapropriação da área, incluindo o pagamento de benfeitorias, mas não inclui os créditos e a infra-estrutura a ser montada no assentamento -o que elevaria o gasto de R$ 4,6 bilhões.

Pressão para o Norte
O levantamento mostra onde fica mais caro assentar. Segundo especialistas, isso tende a privilegiar as desapropriações na região Norte que, historicamente, possui terras mais baratas e uma maior quantidade de áreas públicas. Segundo dados da Unesp (Universidade Estadual Paulista), a região concentra cerca de 40% das 600 mil famílias assentadas entre 1955 e 2002 no país.
Ao divulgar as metas do novo Plano Nacional de Reforma Agrária (assentar 400 mil famílias até 2006), há dez dias, o próprio Ministério do Desenvolvimento Agrário sinalizou que irá priorizar a obtenção de terras por meio de desapropriações, nas quais o governo indeniza o fazendeiro pela terra nua, com TDAs (Títulos da Dívida Agrária), e pela estrutura da fazenda, as chamadas benfeitorias, com pagamento em dinheiro.
Atualmente, se não houver acordo entre o Incra e o proprietário, o valor da terra é determinado pela Justiça.
Segundo o boletim "Agrianual 2004", da FNP Consultoria & Agroinformativos, com levantamento atualizado até agosto deste ano, em São Paulo cada hectare de terra nua (sem benfeitorias) vale em média R$ 7.316.
O analista de terras José Antônio Pusch, da FNP, diz que "as culturas para exportação, principalmente a soja, estão puxando para cima o valor das terras no país". Levantamento da consultoria mostra que o preço médio do hectare no Brasil passou de R$ 1.667, em dezembro de 2001, para R$ 2.516, em agosto de 2003 -um avanço de 50%. "A tendência é continuar subindo."
Para o economista Guilherme Delgado, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o Incra deve encontrar uma forma de regular o preço da terra em patamares "justos". "Se o Incra entra com um preço alto, o mercado se torna inflacionista."
Na mesma linha, o geógrafo Bernardo Mançano Fernandes, da Unesp, diz que o governo tem de ter "coragem" para desvincular o valor da terra das especulações do mercado. "Fazer a reforma agrária é um desafio, por isso deve ser encarada como uma questão política."
Uma das formas que o governo estuda para baratear os processos de desapropriação é, por meio de um decreto presidencial, atrelar o rendimento dos TDAs ao mercado de terras. Ou seja, em vez de serem remunerados por juros, os títulos iriam variar de acordo com as mudanças nos preços da terra.
A idéia é que a desapropriação de áreas improdutivas não seja algo rentável aos proprietários (rendimento anual na casa dos 10%) e sim punitivo.
"Há discussões que estão há dez anos na Justiça e, se formos ver o rendimento dos TDAs depositados, já deu o valor de duas propriedades", disse Marcelo Afonso da Silva, assessor especial da Secretaria Nacional de Desenvolvimento Agrário.



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