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QUESTÃO INDÍGENA
Fome matou 9 em novembro no Vale do Javari, diz líder de ONG
Mortalidade infantil em área
amazônica é o triplo da média
HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CAMPO GRANDE
A fome matou nove crianças em
apenas 15 dias em novembro passado na terra indígena Vale do Javari, no Amazonas, afirmou ontem o coordenador-geral do Civaja (Conselho Indígena do Vale do
Javari), o índio Jorge Marubo, 27.
"No mês de novembro só em 15
dias morreram nove crianças [da
etnia kanamari] menores de cinco anos por causa da desnutrição", disse Marubo. A Funasa
afirma que as mortes ocorreram
ao longo de 2004, e não em um único mês.
A mortalidade infantil na terra
indígena Vale do Javari, no Amazonas, que chegou a 115 por mil
nascidos vivos em 2003, caiu para
85 por mil em 2004, segundo a
fundação. O índice se aproximou
em 2003 dos países mais pobres
da África, que superam a marca
de 150 por mil nascidos. Atualmente, com 85 por mil, é três vezes maior que a média brasileira,
de 24 por mil nascidos vivos.
O situação no Javari supera a de
reservas no Mato Grosso do Sul,
onde o índice de mortalidade infantil é de 60 por mil nascidos vivos. Neste ano, em Dourados
(MS) cinco crianças índias morreram por causa de desnutrição.
Quatro dessas mortes aconteceram em fevereiro. Ainda há suspeita que outra criança, a sexta,
também tenha morrido devido à
fome. O Estado ainda tem situações mais alarmantes. No município de Amambaí (393 km de
Campo Grande), a mortalidade
infantil é 96 por mil nascidos.
Plano para região
O Civaja é uma ONG que representa os índios do Vale do Javari e
participou com a Funasa do Plano
Distrital de Saúde ao qual a Folha
teve acesso e que não está, segundo Jorge, funcionando.
No plano que deveria vigorar
até abril deste ano ainda consta o
índice de mortalidade de 115 por
mil nascidos vivos.
"A gente está pedindo socorro
mesmo. A saúde está zero. Nós estamos enfrentando a pior situação da história desde 2003. Tem
surto de hepatite e vários parentes
nossos morreram. Não temos
acompanhamento da Funasa",
diz Jorge Marubo.
A terra indígena do Vale do Javari tem 85 mil quilômetros quadrados e abriga cerca de 3.000 índios em seis etnias conhecidas,
além de grupos isolados que ainda não tiveram contato com povos não-índígenas.
Impasse
Apesar de a presidência da Funasa ter informado que os casos
de desnutrição ocorreram ao longo do ano passado, a chefe do
DSEI (Distrito Sanitário Especial
Indígena) do Vale do Javari, Edilamar Ferreira, sustenta o fato de
que houve nove mortes apenas no
mês de novembro e atribui os casos à desnutrição.
"Tivemos vários óbitos. E, segundo foi comprovado, era desnutrição, mas já colocamos uma
equipe completa lá com médico e
enfermeira e nunca mais teve óbito", afirma Ferreira.
"Trabalhar com os kanamaris
[as vítimas de desnutrição] é difícil, os pais correm para o mato
com o filho e se escondem. Eles
não permitem que os enfermeiros
dêem soro, pois acham que mata
a criança", afirma Ferreira.
Para Jorge Marubo, "o governo
não está preocupado com a saúde
dos índios, mas com o fortalecimento de sua base política".
O coordenador do Civaja afirma que as indicações para os órgãos da Funasa são políticas e beneficiam petistas.
"Para assumir a chefia do distrito do Vale do Javari, indicaram
uma professora que não tem ligação com a causa indígena e nem
conhecimento em saúde", afirmou Jorge.
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