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Fraude só foi detectada porque houve disputa
ANDRÉA MICHAEL
EDUARDO SCOLESE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O relatório da equipe de inteligência da Polícia Federal sobre o
esquema de fraudes nas compras
de medicamentos do Ministério
da Saúde, fruto da investigação
que culminou na Operação Vampiro, mostra que os desvios só foram detectados porque houve
disputa entre seus integrantes.
A despeito da existência das várias instâncias de controle da lisura e transparência de procedimentos -Tribunal de Contas da
União, Controladoria Geral da
União, auditorias e comissões de
sindicância-, o mesmo grupo,
conhecido desde o início da década de 90, continuava em atividade
pelo menos até maio, quando os
personagens apontados como
seus integrantes foram presos.
O grupo cruzou a gestão de quatro presidentes da República.
Houve investigações a partir de
2003, em 1997 e na época da investigação sobre os esquema PC Farias -referência a uma rede de
desvio de dinheiro comandada
por Paulo Cesar Farias, homem
de confiança do ex-presidente
Fernando Collor morto em 1996.
Pelos menos dois dos acusados
de comandar fraudes nas compras de medicamentos (os empresários Jaisler Jabour e Lourenço
Peixoto) figuram dos autos da investigação do esquema PC, agindo no âmbito da extinta Ceme
(Central de Medicamentos).
O embrião da Operação Vampiro surgiu justamente de interesses
contrariados. O lobista Elias Abboadalla, representante da empresa Baxter, ao saber que uma licitação de US$ 35 milhões seria
contabilizada em favor do concorrente Marcelo Pitta (American
Red Cross), mediante prática de
suposta fraude, encaminhou denúncia ao Ministério da Saúde.
Pitta, não localizado, e Abboadalla, que alega inocência, estão entre presos pela PF em maio.
Dados do relatório da PF revelam ainda a forma de atuação do
grupo. Mediante propina, pacotes
turísticos para o Carnaval na Bahia ou um final de semana em São
Paulo com despesas pagas -e direito a acompanhante-, entre
outras formas de "pagamentos",
servidores se renderam às ofertas
dos lobistas. Em troca, conforme
o relatório, repassavam informações sigilosas e manipulavam
concorrências.
Um dos principais pontos da investigação sobre as fraudes na
Saúde está na elucidação de um
contrato de R$ 127,4 milhões referente à compra de insulina para
todo o ano de 2004. A única empresa a se apresentar para o pregão foi a Biobrás, da multinacional Novo Nordisk.
Por trás do negócio, que teria sido intermediado pelos lobistas
Laerte de Arruda Corrêa Júnior e
Jabour, estaria o pagamento de
propina em duas parcelas. Uma,
de R$ 723.800, paga, conforme a
PF, em janeiro. Parte do dinheiro
seria para Reginaldo Muniz Barreto, coordenador-geral de Recursos Logísticos da Saúde entre
fevereiro e junho de 2003.
O cargo foi assumido, em agosto do ano passado por Luiz Cláudio Gomes da Silva, que seria o
beneficiário de parte (R$ 200 mil)
da segunda parcela de pagamento
pelo "serviço", de R$ 350 mil. O
resto do dinheiro, apreendido pela PF no Rio, seria para "acalmar o
ânimos" dos servidores.
Barreto, que até 25 de maio ocupava o cargo de diretor-executivo
do Fundo Nacional de Saúde, órgão que administra o orçamento
do ministério, não concedeu entrevista. Segundo interlocutores
de Barreto, ele afirma que, nas
"poucas vezes" em que esteve
com o lobista Corrêa Júnior, nunca tratou de negócios específicos,
"muito menos relacionados à
compra de medicamentos".
A Folha não localizou Gomes
da Silva nem seu advogado. Corrêa também não foi localizado.
Do relatório consta também
uma lista de 33 empresas que participaram de licitações da Saúde
desde 1995. Do conjunto fazem
parte os laboratórios Neo Química e União Química, que conseguiram, antes das demais concorrentes acesso a uma lista de medicamentos que o ministério compraria em regime de emergência e
sem licitação.
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