São Paulo, domingo, 2 de agosto de 1998

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TELECOMUNICAÇÕES
Presidente afirma que novos donos não poderão alegar falta de recursos se descumprirem metas
Anatel descarta dinheiro público nas teles


FERNANDO GODINHO
da Sucursal de Brasília

Mesmo obrigados a pagar à vista 40% do valor das empresas do recém-privatizado Sistema Telebrás, os novos controladores das teles não poderão alegar falta de recursos para escapar dos investimentos obrigatórios na universalização e na qualidade dos serviços.
A advertência foi feita pelo presidente da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), Renato Guerreiro, em entrevista à Folha.
Para ele, a falta de recursos não pode justificar o descumprimento das metas fixadas pela agência e não isenta as empresas de eventuais sanções.
A entrada de 40% sobre o valor de cada empresa leiloada será paga na próxima terça-feira e soma R$ 8,82 bilhões para o governo.
Guerreiro reconhece que a LGT (Lei Geral de Telecomunicações) permite que a União, os Estados e os municípios apliquem recursos orçamentários nos programas de universalização das empresas de telefonia privatizadas.
Mas ele descartou que a possibilidade de a União investir recursos públicos no setor.
Na sua avaliação, o consórcio AG Telecom terá que se desfazer da Tele Norte Leste caso fique comprovado que seus componentes tenham dívidas em atraso com a União e que isso configure desrespeito à legislação.
Para o presidente da Anatel, a Telesp Participações (telefonia fixa) e a Telesp Celular oferecem um serviço de nível médio. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Folha - A LGT permite que verbas orçamentárias sejam destinadas às operadoras se os gastos com a universalização não forem recuperados com a exploração dos serviços. Isso significa que as operadoras expandirão suas atividades com recursos públicos?
Renato Guerreiro -
Não. Sempre fomos contra a possibilidade de a União aportar recursos orçamentários nas operadoras. Nas discussões com o Congresso, ficou evidente o interesse dos parlamentares em que Estados e municípios pudessem fazê-lo.
Não consideramos a hipótese de a União alocar recursos para isso. Mas Estados e municípios têm a possibilidade legal de aplicar verbas orçamentárias no setor.
Folha - A Andrade Gutierrez e a Inepar, que compraram a Tele Norte Leste por R$ 3,434 bilhões, estariam inscritas no Cadin. Isso pode anular o leilão da empresa? A Anatel analisou a situação dos participantes do leilão no Cadin?
Guerreiro -
A análise do Cadin não fez parte das obrigações da Anatel e deveria ter sido feita por quem realizou o leilão.
Apesar de não ser uma exigência da Anatel, a Andrade Gutierrez (líder do consórcio AG Telecom) declarou à agência que não tinha dívidas pendentes.
Minha posição é pela absoluta legalidade: se a lei impede que empresas inscritas no Cadin adquiram patrimônio público, acho que elas devem se desfazer da empresa que compraram. A regra vale para todos, mas não posso confirmar se elas estão inadimplentes ou não.
Folha - O BNDES ameaça não financiar o consórcio AG Telecom por considerar que ele possui um perfil estatal representado pelo Banco do Brasil e por fundos de pensão. Isso prejudicará a atuação da Tele Norte Leste?
Guerreiro -
Pode prejudicar. Mas isso não é justificativa para que ela não seja punida caso não cumpra todas as metas dos contratos de concessão.
Mas concordo que a falta de recursos pode levar ao descumprimento das metas.
Folha - Qual é a prioridade da agência?
Guerreiro -
Até dezembro de 99, a prioridade da Anatel é atuar muito próximo às operadoras para que elas alcancem as metas previstas nos contratos de concessão.
A Anatel não deve ter a visão distorcida de que existe para punir. Sua finalidade é fazer com que os concessionários atendam a sociedade brasileira, cumprindo as metas impostas.
Folha - Como será esse acompanhamento?
Guerreiro -
Vamos fazer projeções sobre o que as empresas já vêm realizando. Vamos cutucar as empresas.
Atualmente, existem empresas com padrão de qualidade internacional, outras com padrão médio e outras com padrão sofrível.
Em 99, em todo o país deverá haver uma uniformidade dos índices mínimos de qualidade.
Folha - Qual a avaliação do sr. sobre a qualidade da Telesp?
Guerreiro -
Ela está em um nível de qualidade médio em relação ao Brasil. E acho que o paulista vai perceber, rapidamente, uma melhoria na Telesp.
Ela vai ter que melhorar, porque poderá não conseguir alcançar as metas. A Telesp Celular também está no mesmo patamar.
Folha - Quando os consumidores começarão a sentir uma melhora?
Guerreiro -
Nesse setor, ninguém melhora de um mês para outro. Então, as melhorias deverão começar ainda neste ano e imediatamente em algumas empresas.
Nas empresas com qualidade mais sofrível, o cidadão terá que começar a perceber melhorias nos próximos seis meses.
Folha - Ao analisar a privatização da Telebrás, o TCU ressaltou que a Anatel deve ter força e apoio político para exercer a fiscalização do setor. A agência possui esses pré-requisitos?
Guerreiro -
A força da Anatel reside única e exclusivamente na lei. Se por apoio político o TCU entende independência em exercer esse poder, posso garantir que a Anatel o fará sem qualquer temor.
Folha - O sr. acredita que ainda há interesse nas "empresas-espelho", que concorrerão com o Sistema Telebrás privatizado?
Guerreiro -
O leilão da Telebrás foi um sucesso, mesmo com a crise na Ásia, na Rússia e no Japão. O sucesso vai despertar ainda mais o interesse pelas "espelhos".
Folha - As empresas de consultoria que avaliaram a Telebrás calculam que, em 2007, as "espelhos" só terão 15% do mercado residencial e 25% do mercado não-residencial. Além disso, elas deverão concentrar a concorrência nas grandes cidades. Qual sua opinião?
Guerreiro -
Essa é uma tendência natural. Não há dúvida de que elas iniciarão suas atividades pelas grandes cidades, pois foi isso que aconteceu com o serviço celular.



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