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IMPRENSA/OUTRO LADO
Único a negar a publicação de "matéria paga" foi a revista "IstoÉ Gente"; Jaime Lerner não comenta
Veículos confirmam faturamento de textos
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Todas as 76 empresas de comunicação com notas fiscais de venda de "reportagens" foram procuradas pela Folha. O jornal encontrou 67. As demais não estão mais
no endereço que aparece na documentação (notas fiscais e cópias
das "reportagens").
Dos 67 veículos encontrados,
oito preferiram não comentar.
Apenas um dos contatados negou
de forma peremptória a publicação de "matéria paga": a revista de
celebridades "IstoÉ Gente", para a
qual há notas fiscais no valor total
de R$ 500 mil -duas operações
de R$ 250 mil para dois textos de
oito páginas cada um.
O diretor de projetos institucionais da Editora Três, Expedito
Grossi, declarou que "o governo
[do Estado do Paraná] comprou
uma quantidade "X" de "reprints"
do caderno para redistribuição lá
[no Paraná]". "Reprints", explicou, são reimpressões de uma determinada notícia, em grande
quantidade. No caso, o governo
do Paraná teria se interessado em
fazer a distribuição dos textos publicados por "IstoÉ Gente".
A fatura da revista menciona
que a natureza dos serviços foi
"inserção", termo comumente
usado para publicidade. Grossi
diz que isso deve ter ocorrido "para simplificar", mas o trabalho teria sido, "com certeza", uma
reimpressão. A Folha perguntou
se poderia ter acesso a algum documento que demonstrasse o pedido de reimpressão do governo
do Paraná. Segundo Grossi, seria
difícil localizar tal papel, pois a
operação foi há mais de um ano.
As respostas da maioria (53)
dos outros veículos contatados
foram sempre positivas, admitindo a publicação de "matérias pagas". "Quando a matéria é informativa, nós não vemos nenhuma
necessidade se o cliente pedir para
não cercar. Até porque é uma matéria informativa", diz Baltazar
Oliveira, proprietário da "Tribuna do Norte", de Apucarana.
"Sai como matéria jornalística",
afirma Vânio Pressinatte, editor
de "A Tribuna do Povo", de
Umuarama.
Representantes de alguns veículos disseram que os casos apresentados pela Folha poderiam representar algum engano. Mas não
chegaram a contestar propriamente a publicação -uma vez
que foram confrontados com
suas notas fiscais e as "reportagens" anexadas. A minoria (cinco) das pessoas contatadas disse
que enviaria explicação por escrito, o que nunca aconteceu.
Alguns disseram que a prática é
antiga e remonta a vários governos passados. É o caso do colunista Pedro Washington, cujo texto
era publicado por sete jornais diários no ano passado. Ele recebia
um pagamento para divulgar informações em sua coluna: "É publicidade de matéria de interesse
do governo".
"Aqui, no Paraná, sempre foi
muito comum isso. Você tem
uma coluna valorizada e é como
se fosse um "merchandising" que
hoje se faz na televisão", explica
Washington.
Roney Rodrigues Pereira, diretor do "Jornal do Estado", relata
algo semelhante: "Talvez identificar seja mesmo o mais correto.
Convencionou-se que não seria.
Os outros jornais também não
identificavam. Sempre foi assim,
inclusive nos governos passados.
Não foi uma coisa trazida pelo governo [Jaime] Lerner".
Governadores
A Folha procurou durante quatro semanas o ex-governador Jaime Lerner (PFL), que esteve no
comando do Paraná de 1995 a
2002. Por meio de sua assessoria,
Lerner disse que preferia não comentar. O seu secretário de Comunicação em 2002, Deonilson
Roldo, também não se manifestou. Três ex-governadores procurados negaram ou disseram não
saber exatamente se a compra de
"reportagens" ocorria quando estiveram no poder.
José Richa, 68, que hoje está no
PSDB e governou o Paraná pelo
PMDB (1983-1987), declara que
"não existia" o uso de matérias
pagas durante o seu mandato.
"Inclusive, eu sempre disse: aquilo que for notícia, se vocês quiserem, publiquem; se não quiserem,
não precisam publicar", afirmou.
Álvaro Dias, 58, do PDT (governou pelo PMDB de 1987 a 1991),
disse que, "infelizmente, no Paraná há essa manipulação do governo". "As formas são as mais diversas." Indagado se havia "matérias
pagas" na sua época, declarou:
"Não. Pelo menos formalmente,
não". E informalmente? "Não,
não... Na verdade, eu descentralizava. O secretário [de Comunicação] é que cuidava disso. E eu não
me lembro do procedimento que
ele adotava em relação aos jornais
do interior."
Roberto Requião, 62, do PMDB,
atual governador e que também
comandou o Estado de 1991 a
1994, nega usar "matérias pagas"
em seus dois mandatos. "Eu nunca fiz isso", declara.
Agências
A Loducca e a Opus Múltipla informaram, por meio de suas assessorias, que preferiam não se
manifestar sobre a venda de "reportagens" no Paraná.
Antonio Freitas, 58, presidente
da Master, declarou o seguinte:
"Nós veiculamos preferencialmente anúncios publicitários. Pela legislação, a agência autoriza o
veículo por conta e ordem do
cliente. É política de cada veículo
identificar ou não como informe
publicitário. A agência não tem o
poder de fazer um jornal publicar
sem identificação. Eticamente, essa prática não é correta. O que é
necessário é deixar claro para o
leitor que aquilo é pago, mas essa
é uma tarefa do veículo".
A ANJ (Associação Nacional
dos Jornais) foi informada de que
quatro de seus sócios estão na lista de veículos que publicam "matérias pagas" no Paraná, mas preferiu não se manifestar a respeito.
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