São Paulo, terça-feira, 03 de janeiro de 2006

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Na TV, Lula revelou medo, diz historiador

DA REPORTAGEM LOCAL

Para o historiador Manolo Florentino, a entrevista com o presidente transmitida pela TV Globo no último domingo revelou "o medo estampado nos olhos do Lula". As recorrentes metáforas, defende o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, vieram acompanhadas de uma atitude permanentemente defensiva, de uma "dubiedade primária" e careceram da autoconfiança que dava corpo ao antigo discurso do petista.
"São signos de quem sabe que errou, em todos os sentidos: politicamente, eticamente e como líder", diz. "Agora ele sabe disso."
(RAFAEL CARIELLO)
 

Folha - Como o sr. avalia a entrevista?
Manolo Florentino -
O que ficou claro ali foi o medo estampado nos olhos do Lula. Isso ficou claro para todo mundo. E a defensiva permanente, como resultado desse medo. Ambas as coisas são signos de quem sabe que errou, em todos os sentidos: politicamente, eticamente e como líder.

Folha - Dá para dizer que o presidente tergiversava?
Florentino -
Ele foi muito comum. Ele reiterou duas coisas que são muito próprias do seu discurso. Primeiro aquelas metáforas de sentido comum, via de regra referentes ao futebol, que em última instância só fazem esterilizar o discurso político. E, o que achei terrível para ele, a dubiedade primária. Quando Lula diz, por exemplo, que não sabe se vai se candidatar e, na pergunta seguinte, diz que vai colher o que plantou... Imagino que ele não vá colher grama, não é? O que ele está tentando colher é a reeleição.

Folha - Como se explica a dubiedade e a fuga das perguntas?
Florentino -
Signo de quem sabe que errou em todos os sentidos. Agora ele sabe disso. Agora não há mais aquela autoconfiança, que podia ter um fundamento nas fantasias do Lula, do PT. Isso ficou esvaziado. Agora ele sabe que não tem conteúdo, que não tem projeto. Essa consciência é que criou esse profundo medo.

Folha - Que efeito isso pode ter para a opinião pública?
Florentino -
O resultado é piorar ainda mais a imagem do presidente da República com os formadores de opinião. Sempre que ele fala, todos esses reiterados erros vêm à tona. Uma entrevista como essa tem um impacto maior, mais imediato, nesse grupo, mas aos poucos chega à base da pirâmide -não tenha dúvida disso.

Folha - Lula diz que pede a Deus que, "quando terminar tudo isso", aqueles que o acusaram lhe peçam desculpas. Como o sr. vê o pedido?
Florentino -
Peço a Deus que o perdoe. Mais nada. Porque ele só pode pedir isso a Deus, a mais ninguém.

Folha - Na entrevista, como em outras ocasiões, o presidente parece colocar o seu governo em absoluto destaque na história do país, totalmente distinto e "refundador". Como se explica isso?
Florentino -
Isso é um traço da geração de 1968, que não é a do Lula, mas que ele, em última instância, encarna. A geração de 68 está no poder. O problema é que, na hora de apresentar projetos para o país, cadê? Há muito disso: a falha de uma geração que não tinha projetos, mas apenas palavras de ordem.


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