São Paulo, terça-feira, 03 de janeiro de 2006

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INTELIGÊNCIA

Diretor-geral muda símbolo, institui hino (de sua própria autoria) e estabelece juramento aos funcionários da agência

Abin aposenta "araponga" e adota "carcará"

ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA

RUBENS VALENTE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Saem os arapongas, entra o carcará como símbolo da Abin (Agência Brasileira de Inteligência). Essa foi uma das dez mudanças que o novo diretor-geral, Márcio Paulo Buzanelli, imprimiu no órgão para criar uma "linguagem moralmente edificante".
O carcará, conhecido como "gavião do cerrado" e popularizado na música de João do Vale e José Cândido ("Carcará pega, mata e come"), é uma ave que, segundo Buzanelli, tem "altivez, nacionalismo, visão aguda e controle do território". E por que não mais a araponga? "Porque não é agradável, é muito depreciativo. Araponga, na verdade, serve para designar atividades ilegais. E é um passarozinho pequeno, simpático, mas tem um nome que não tem eufonia (som agradável)."
O novo símbolo já está por toda parte na sede da Abin, no centro de Brasília, a partir do chão da entrada principal. Está, também, no página do órgão na internet (www.abin.gov.br).
Buzanelli, paulista, 55, também instituiu um hino, cuja letra é de sua própria autoria, dizendo que "a Abin é a luz forte que dissipa a escuridão/ Desfaz as incertezas e desvenda o sorrateiro". Em outro trecho, diz: "Nós somos da inteligência brasileira/ Anônimos heróis na busca da verdade". A música é do general Paulo Roberto Uchoa, secretário nacional antidrogas, no cargo desde o governo Fernando Henrique Cardoso.
O hino é cantado sempre na abertura e no encerramento de cursos e em três datas especiais, uma delas criada pelo próprio Buzanelli ainda em 2004, antes de ocupar a direção geral: o Dia do Veterano, 29 de novembro.
A nova data visa manter o vínculo dos aposentados com o órgão e o segredo das informações que obtiveram quando na ativa: "Não quero que saiam por aí falando indevidamente."
Os três ex-diretores da Abin -dois deles nomeados no governo FHC- integram um recém-criado Conselho Superior de Inteligência, presidido por Buzanelli, e ganharam direito a um mural de fotos na sede da agência.
A Abin tem agora uma bandeira azul e branca -também idealizada pelo próprio Buzanelli-, uma outra bandeira para sinalizar que o diretor-geral está na casa, uma revista quadrimestral e um novo slogan: "Orgulho de ser Abin", numa analogia ao "Orgulho de ser brasileiro" criado pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva.
"Precisamos de uma linguagem moralmente edificante", disse ele à Folha, listando as mudanças e seus dois principais objetivos: desmistificar a Abin como sucedânea do velho SNI da ditadura militar e fortalecer "a lealdade e as relações afetivas entre os servidores e o órgão".
Ele próprio é funcionário da Abin e atua na área de segurança desde 1978 -ainda na época do SNI. Substituiu na direção geral o igualmente polêmico delegado Mauro Marcelo. A diferença é que Buzanelli foi escolhido pelo general Jorge Armando Félix, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, enquanto Marcelo foi nomeado diretamente por Lula.
Outra providência do diretor foi mudar a nomenclatura dos cargos da agência. Sua função agora é "comandante de inteligência" e os analistas passaram a ser "oficiais de inteligência".
Buzanelli, porém, não vê nenhum traço de militarismo em todas essas mudanças. "Não há militarismo. Comandante é aquele que comanda junto com os demais, esse é o sentido da palavra", disse ele, informando que cerca de 70% dos funcionários apoiaram a troca dos nomes.
Outra mudança introduzida na sua curta gestão foi o juramento dos funcionários, exigido mesmo dos antigos que ainda estão na ativa. Todos, novos e antigos, tiveram de jurar fidelidade "à bandeira, à Constituição e à honra".
Ele compara: "Como o juramento de Hipócrates", diz, referindo-se ao dos médicos, antes de exercerem a profissão.
Como medidas práticas, o diretor praticamente duplicou os escritórios da Abin pelo país, que antes eram chamados de agências e agora passam a ser superintendências. Eram 29 e pularam para 54, nas capitais e nas principais cidades do interior.
A "insígnia do diretor" (a bandeira exclusiva dele) será hasteada nas unidades que tiverem pátio, como a de Goiás, sempre que ele estiver no local. "Faz parte da liturgia do cargo", justifica ele.
Buzanelli também mantém a proposta do antecessor, Mauro Marcelo, de instalar escritórios na Venezuela, na Colômbia, no Paraguai e na Bolívia. Hoje, a Abin já tem representação na Argentina e nos EUA. Buzanelli, aliás, foi "oficial de ligação" na Flórida (EUA) por dois anos e meio.
Na tentativa de popularizar o órgão de informação, ele abriu a agência a visitas de estudantes de vários níveis e está de olho nas faculdades de jornalismo.


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