São Paulo, sexta, 3 de abril de 1998

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QUESTÃO AGRÁRIA
Medida, que começa neste mês, permite a cobrança de crédito de implantação e 80% do valor da terra
Governo emancipará 258 assentamentos

ABNOR GONDIM
da Sucursal de Brasília


O governo deve definir até o final de abril a emancipação de 258 assentamentos rurais para passar a cobrar dos agricultores os créditos de implantação (R$ 3.925) e 80% do valor das terras.
O primeiro passo para a emancipação foi acertado ontem com a assinatura de portaria dos ministérios Extraordinário de Política Fundiária e da Agricultura.
Com a emancipação, o governo quer retirar da reforma agrária o caráter de doação e desestimular novas invasões de terra pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). A meta é atingir mais de 10% dos cerca de 2.000 assentamentos existentes.
"Reforma agrária não é esmola", disse o ministro Raul Jungmann (Política Fundiária). "Reforma agrária é um crédito subsidiado que se dá a uma família produtiva. Não é ato de piedade."
Segundo ele, o governo federal nunca cobrou dos assentados os créditos de implantação e os recursos usados na desapropriação ou aquisição de imóveis. A cobrança de parte desses recursos é prevista no Estatuto da Terra (64).
Crédito mais caro
A portaria interministerial assegura aos assentados acesso a uma linha de crédito do governo, o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar), criada para atender a agricultura familiar. Esse financiamento é mais caro do que o do Procera (Programa de Crédito Especial para a Reforma Agrária).
Segundo a portaria, os ministérios irão oferecer técnicos para ajudar os assentados a elaborar projetos dirigidos à obtenção de crédito do Pronaf.
A principal vantagem do Procera é que apenas metade do valor do empréstimo é cobrada. No Pronaf, o beneficiário tem de pagar todo o empréstimo, embora os juros só incidam sobre 50%.
"Os assentados precisam virar empreendedores para lidar com as noções de lucro e despesas e para assumir a autêntica cidadania", disse o ministro interino da Agricultura, Ailton Fernandes.
Segundo assessores do Ministério da Agricultura, os assentados não devem procurar o Pronaf. Um dos motivos é o aumento do teto de financiamento do Procera, de R$ 7.500 para R$ 9.500, que entra em vigor no final deste mês.
O aumento foi anunciado anteontem pelo presidente do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), Milton Seligman, em resposta às reivindicações do MST.
As propostas em estudo no Incra pretendem desburocratizar a emancipação. Isso tem beneficiado os assentados em projetos consolidados e criados há 20 anos.
Para tentar evitar maiores reações, o Incra defende que o valor da dívida dos assentados seja estabelecido pela equivalência preço-produto. Ou seja, a dívida será fixada de acordo com o preço do produto produzido pelo assentado. Isso evitará a incidência de juros e correção monetária.
Na semana passada, o ministro Jungmann e a diretoria do Incra iriam definir as novas regras para emancipação dos projetos. Mas a reunião convocada para discutir o assunto foi suspensa por causa das mortes de dois líderes do MST em Parauapebas (sudeste do Pará).
A Folha não localizou ontem dirigentes do MST para comentar as propostas. Dirigentes disseram, em 97, que são contra a emancipação porque a maioria dos projetos não tem infra-estrutura e falta assistência técnica aos assentados.



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