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FOLCLORE POLÍTICO
Em Itu, o tatu
PLÍNIO ARRUDA SAMPAIO
Em Itu, o prefeito, que se chamava Bicudo, ganhou o apelido de Tatu. Seus adversários o acusavam de ter esburacado a cidade toda, o que era verdade. Administrador sério, tinha empenhado a maior parte do orçamento na ampliação das redes de água e esgoto da cidade. Ao chegar a época da eleição deputados,
as obras estavam inacabadas e, consequentemente, a cidade esburacada. Ele, que era adepto fervoroso de Carvalho Pinto e queria
apoiar os candidatos do governador, ficou em palpos de aranha.
Que fazer? Na base de que a melhor defesa é o ataque, Bicudo
trucou 12: em vez de rejeitar o
apelido, adotou-o. Mandou
transformar um caminhão em
carro alegórico, representando
um enorme tatu. Nas costas do tatu, duas cadeiras: uma para o
Carvalho Pinto, outra para ele,
Bicudo. Na hora de começar o
desfile, isso não foi possível, seja
porque o governador achou muito populismo, seja porque inventou algum pretexto para escapar
da aventura. Os correligionários
ficaram decepcionados: "Como o
tatu desfilaria sozinho com as cadeiras vazias? Não podia".
Vendo o desaponto, os auxiliares de Carvalho Pinto resolveram
que dois deles sentariam nas cadeiras tatuzais. A tarefa recaiu no
chefe e no subchefe da Casa Civil.
Subiram e, sob vivas e aplausos
gerais instalaram-se nas cadeiras.
Tudo pronto, o Tatu saiu em direção à praça do comício.
Nem bem andaram 50 metros,
os dois passageiros do tatu se defrontaram com os fios da eletricidade que cortavam a rua exatamente na altura dos seus pescoços. Mandar parar não adiantava, porque naquelas alturas, a
balbúrdia era tal que ninguém
ouvia. O jeito era ficar muito
atento e abaixar-se a cada fio. Assim foram os dois, erguendo e
abaixando a cada 30, 40 metros,
até entrarem na praça.
Para descer foi um turumbamba danado, mas acabou dando
certo, salvo pelo risinho do sempre discreto Carvalho Pinto, zombando disfarçadamente do seu
velho amigo e companheiro inseparável Portugal Gouveia. Injusto! O passeio de seus devotados
auxiliares contribuiu muito para
o sucesso da sua campanha. No
dia seguinte, o comentário na cidade era: "Gente educada, essa
do Carvalho Pinto. A cada pouquinho, os dois em cima do tatu
abaixavam a cabeça para cumprimentar solenemente o povo".
PLÍNIO ARRUDA SAMPAIO, 72, ex-deputado federal pelo PT e membro da Assembléia Constituinte de 1988, escreve
às terças-feiras nesta seção
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