São Paulo, sexta-feira, 03 de setembro de 2004

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MERCADO ACIONÁRIO

Ministério Público acusa vice de inflar em 1998 valor de papéis de empresa mineira da qual ele é sócio majoritário

Alencar é denunciado por fraude com ações

PAULO PEIXOTO
THIAGO GUIMARÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELO HORIZONTE

O Ministério Público Federal ingressou ontem com ação civil pública denunciando o vice-presidente José Alencar e a Encorpar, empresa da qual é sócio majoritário, por "fraude ao mercado de capitais, por meio de manipulação na compra e venda de ações da empresa mineira Fiação e Tecelagem São José", em 1998.
Além do vice e da Encorpar (Empresa Nacional de Comércio, Rédito e Participação S.A.), foram denunciados pela mesma acusação a BH Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda. e a Business Commodities Corretora Mercantil Ltda., além do dono delas, Fernando de Faria Resende.
A fraude teria acarretado prejuízo no mercado de ações, segundo o Ministério Público Federal, de no mínimo R$ 4,4 milhões, já que as ações da São José negociadas estariam com valor inflado. O valor real por ação seria de R$ 0,70, mas foram vendidas a R$ 2,50.
O maior prejudicado, segundo o procurador Fernando de Almeida Martins, autor da denúncia, foi o fundo de seguridade social da Embrapa e da Embrater, que comprou um lote de 1,6 milhão de ações, em 12 de maio de 1998, por R$ 4,4 milhões. Foi enviado ao procurador-geral da República, Cláudio Fonteles, cópia da denúncia. Caberá a ele decidir se será instaurado um processo criminal contra os denunciados, pois Alencar goza de foro privilegiado.
A valorização dos papéis teria se dado da seguinte forma. A Encorpar, em 1997, detinha cerca de 50% das ações da São José, que não estaria apresentando, desde 1996, bons resultados financeiros. Não tinha lucro e, portanto, não pagava dividendos. O valor de sua ação variava de R$ 0,65 a R$ 0,70.
Em janeiro de 1998, a Encorpar contratou a BH DTVM para negociar as ações preferenciais da São José. A intenção de Alencar seria vender cada ação a R$ 2,50. Esse pedido foi feito à CVM (Comissão de Valores Mobiliários). O prazo dado para negociar as ações foi de maio a setembro de 1998.
Nesse período, a Encorpar comprou 1,6 milhão de ações ordinárias (com direito a voto) e se tornou controladora da São José.
Para chamar a atenção do mercado para as ações preferenciais (sem direito a voto) da São José e ir elevando o preço, a BH DTVM passou ela própria a negociar os papéis. Para isso, usava outra empresa, a BCCM, que tem os mesmos endereço e dono da BH DTVM. Encerradas as operações, como a empresa não tinha lucratividade, o valor das ações caiu para o patamar inicial de R$ 0,70.
A operação suspeita chegou ao MPF por meio de um pequeno acionista da São José. A Procuradoria da República acionou então a CVM, que, por meio de comissão sindicante, entendeu ter havido "responsabilidades por criação de condições artificiais de demanda e manipulação de preço".
Segundo o procurador, essa comissão, em 21 de novembro de 2000, apontou responsabilidade de todos os envolvidos, inclusive a Encorpar e José Alencar. Mas o conselho da CVM, em maio de 2001, isentou de responsabilidades a empresa e o atual vice.
Foram punidos a BH DTVM, a BCCM e o dono delas, aplicando a cada um multa de R$ 100 mil. O julgamento final pela CVM ocorreu em dezembro de 2002, quando Alencar já havia sido eleito.
O MPF não aceitou a decisão do conselho da CVM e apresentou a denúncia com base no relatório da comissão sindicante. "Os indícios contra o sr. José Alencar são óbvios", afirmou o procurador.


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