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São Paulo, sexta-feira, 03 de outubro de 2003

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CAMPO MINADO

Proposta de proibir porte de foices, facões e enxadas em atos faz parte de ação do Planalto para diminuir tensão

PF tem projeto para "desarmar" sem-terra

EDUARDO SCOLESE
DA AGÊNCIA FOLHA

Entre as ações do Palácio do Planalto para diminuir a tensão no campo, há um polêmico projeto da Polícia Federal que visa proibir os sem-terra de portarem foices, facões e enxadas durante passeatas e qualquer outro tipo de manifestação em todo o país.
A PF, que aponta Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo como os atuais focos nacionais de conflitos, vê o uso dessas "armas" como uma forma de "ameaça".
Mesmo sem prazo definido para sair do papel, o projeto da PF de "desarmar" os trabalhadores rurais já causa indignação de lideranças dos sem-terra. Para João Paulo Rodrigues, da coordenação nacional do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), "a PF está procurando assombração debaixo do colchão".
"Os sem-terra têm um mote de que foices e facões são instrumentos de trabalho, e a gente vê isso como armas, inclusive porque já causaram a morte de um soldado da PM no Rio Grande do Sul [em 1990, durante confronto entre policiais e sem-terra]", afirmou o delegado José Milton Rodrigues, coordenador-geral de defesa institucional da PF.
De acordo com João Paulo Rodrigues, do MST, a utilização desses instrumentos em manifestações tem o único objetivo de demonstrar que "somos camponeses". "Saber como usamos o nosso instrumento de trabalho não é tarefa da Polícia Federal. O problema são as escopetas calibre 12 [dos fazendeiros] que já mataram mais de 40 pessoas neste ano."
Segundo a PF, a intenção da corporação é trabalhar em conjunto com a Polícia Militar nos Estados. "Na minha opinião, o uso desses facões e foices é uma ameaça, pois são armas, além de instrumentos de trabalho", disse o delegado Rodrigues, responsável pela divisão de assuntos políticos e sociais da corporação.
Para Manoel José dos Santos, presidente da Contag (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), uma eventual proibição seria um ato "extremamente negativo" da Polícia Federal. "Não é justificado como um elemento de combate à violência proibir o uso de nossos instrumentos de trabalho."

Focos de tensão
O Estado do Paraná e regiões de São Paulo (Pontal do Paranapanema) e do Rio Grande do Sul (cidade de São Gabriel) são, segundo levantamento recente da PF, os principais focos de atuação de grupos armados ilegalmente, principalmente fazendeiros. Nesses locais, a PF fará ações de prevenção, sem data anunciada.
Antes de agir, a PF precisa que o Planalto libere verbas para deslocar um determinado número de policiais das superintendências regionais para os locais de conflitos. Além disso, os policiais vão passar por um treinamento específico sobre a tensão no campo, e a corporação vai aguardar ordens judiciais antes de vistoriar fazendas sob suspeita.
"Nossa atuação é em busca de armas irregulares, que estejam sendo utilizadas por grupos ou empresas sem registro na Polícia Federal. Se as armas forem estrangeiras, essas pessoas vão responder por crime de contrabando", disse o delegado da PF, que rechaça a existência de "milícias". Diz que há "grupos armados ilegalmente no campo".
De acordo com o delegado, a "defesa da propriedade é um direito legítimo do fazendeiro. Só a forma como ela está sendo feita é que deve ser acompanhada de perto" pela corporação.
A PF diz que agirá antes mesmo de ter um levantamento detalhado de todo o país. "Já podemos atuar em alguns locais, mesmo sabendo que os estudos de outras situações ainda prosseguem", disse Milton Rodrigues.


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