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ELEIÇÕES 2006 / REFORMA POLÍTICA
Mesmo adeptos da reforma vêem entraves à Constituinte
Para dois ministros do Supremo, proposta de Lula é inconstitucional e "exótica"
Oposição considera assunto uma "tática diversionista" do presidente; Ives Gandra diz que Constituinte é "única possibilidade" de reforma
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A reforma política é necessária, mas o consenso termina aí.
De que maneira a reforma deve
ser feita, se por emenda constitucional ou pela convocação de
uma Assembléia Nacional
Constituinte, e que mudanças
deveria trazer são questões que
dividem ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), especialistas e os próprios políticos.
A realização de uma Assembléia Constituinte, proposta levantada anteontem pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva
em reunião com advogados, enfrenta oposição quase que unânime, mas conta com ao menos
um apoio de peso, o do advogado Ives Gandra Martins (leia
entrevista nesta página).
Para dois ministros do STF
-Gilmar Mendes e Carlos Ayres Britto-, a convocação da
Constituinte para a reforma
política seria inconstitucional.
Ambos disseram que a reforma deve ser feita pela via normal: por meio da aprovação de
emendas constitucionais, que
exigem duas votações na Câmara e outras duas no Senado,
com a aprovação de pelo menos
três quintos do Parlamento.
Mendes, vice-presidente do
STF, considerou "exótica" a sugestão e disse, em tom de brincadeira: "O Espírito Santo jurídico não esteve presente [na
reunião de Lula com os advogados]". Para Britto, da forma como está sendo cogitada, a Constituinte seria um órgão não
previsto na Constituição.
Um dos advogados que estiveram com Lula anteontem,
Roberto Caldas, também admite a discussão da hipótese. Ele
afirma que o caminho jurídico
mais tranqüilo seria uma mudança por emenda constitucional, mas que a realidade mostra
a dificuldade de a reforma passar no Congresso Nacional: "É
algo [a discussão] a ser enfrentado com desassombro".
A importância da reforma
Os maiores escândalos dos
últimos anos, como o mensalão, estão todos ligados a temas
que seriam abordados numa
reforma política.
As principais propostas em
discussão abordam, por exemplo, o financiamento público de
campanha (o que, em tese,
combateria o caixa dois) e a fidelidade partidária (o que inibiria a compra de votos).
Entre os políticos há uma
percepção de que uma Constituinte não iria adiante. Um dos
mais céticos é o deputado Miro
Teixeira (PDT-RJ). Autor de
uma proposta de Constituinte
em 1997 para o sistema tributário e o pacto federativo, Teixeira diz que uma Constituinte exclusiva para a reforma política
seria um "casuísmo". "Nem
existe uma definição clara do
que seria essa reforma", afirma
o deputado.
O deputado Gustavo Fruet
(PSDB-PR), de oposição, classifica a proposta como "um casuísmo único no mundo", lembrando que "Constituinte é para refundar o Estado". O tucano
é a favor da reforma política,
mas feita pelo Legislativo.
O advogado Miguel Reale Júnior, responsável pelo comitê
financeiro da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência, afirmou que a proposta
é uma "arrematada loucura".
"Ou Lula está sem assunto ou é
um jogo político."
"Tática diversionista"
A oposição acusa o presidente Lula de levantar o tema como "tática diversionista", para
tirar o foco dos escândalos do
governo. No Senado, PSDB,
PFL e PDT disseram que essa é
uma estratégia para desviar o
foco de escândalos como o da
máfia dos sanguessugas.
"Todos sabem o código de
comportamento vigente no Palácio do Planalto: acusado, negue; condenado, fuja; pilhado,
surpreenda-se; incomodado,
disfarce. Se não tiver outra saída, mude de assunto. Essa é a
verdade da farsa de mudança
de foco tentada pelo candidato
a presidente da República", disse o presidente do PFL, senador Jorge Bornhausen (SC).
Em defesa do governo, o senador Tião Viana (PT-AC) disse que essa proposta foi apresentada a Lula por ex-dirigentes da OAB. "Tenho simpatia
por essa matéria porque acho
que este Congresso e o futuro
não terão forças para mudar
muita coisa e muito menos para concluir a reforma política."
Ives Gandra vê a Constituinte como único caminho para a
reforma. "A reforma política
não saiu até agora porque os
políticos não querem. Eles não
querem fidelidade, voto distrital, perder os seus feudos eleitorais. Dentro dessa linha, eu só
vejo uma possibilidade: uma
Constituinte exclusiva", diz.
Mas, enquanto Ives Gandra
admite a proposta, Dalmo de
Abreu Dallari a condena. O professor aposentado da USP classificou a proposta de "absurda e
inconstitucional" (leia entrevista nesta página).
(PEDRO DIAS LEITE, EDUARDO SCOLESE, SILVANA DE FREITAS E FERNANDA
KRAKOVICS)
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