São Paulo, sexta, 4 de setembro de 1998

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JANIO DE FREITAS

Desprograma

O que aconteceu aos cinco dedos de Fernando Henrique Cardoso que simbolizaram seu programa-compromisso, para o atual mandato, já desmoralizaria o novo programa, agora apresentado. A crise, porém, não se satisfez com isso. Tornou ridícula até mesmo a apresentação do suposto programa.
Nenhuma das afirmações do presidente-candidato ou de ministros, sobre as condições brasileiras de resistência à crise, correspondem ao que se passa no governo. O que se apreende de consultas técnicas feitas por integrantes da equipe econômica, a ex-colegas de ensino ou de governo, reflete temerosa insegurança em relação ao futuro próximo e muitas dúvidas em relação ao que fazer.
Fosse tranquilizadora, de fato, a situação vista através dos dados que só os mapas da equipe econômica contêm, não se mostrariam preocupações e incertezas. Ainda estariam em seu lugar as verdades inabaláveis de uns e a arrogância de outros, que davam o tom nos eventuais contatos com velhos colegas, antes dos abalos.
Se o novo programa já não era crível, pela natureza da candidatura que o apresenta, sua montagem anterior à crise caduca-o até como enganação eleitoreira.
Os programas de Ciro Gomes e Luiz Inácio Lula da Silva, como qualquer outro formulado há algum tempo, por certo não escapam a efeitos contrários da situação internacional. Ambos, porém, consistem de propostas para modificar o que só agora, levado pela força da realidade, o grupo de Fernando Henrique considera necessário "ajustar" (palavra que os governistas usam para o que em português, como em qualquer língua, é corrigir).

Paguemos
O problema é entre os bancos e o comércio. Mas quem se dá mal com a falsa solução do governo é o usuário de cheques.
Na ânsia de vender, os comerciantes aceitam cheques pré-datados que numerosos emitentes, mais tarde premidos por despesas imprevistas ou pelo desemprego, sustam nos seus bancos.
Integrantes do Conselho Monetário Nacional, os ministros da Fazenda, do Planejamento e o presidente do Banco Central ativaram sua lucidez para encontrar uma solução. Nada mais fácil para eles do que produzir soluções, que, no seu caso, não precisam distinguir-se de novos problemas.
Fica então decidido que os cheques terão o número da identidade de seu portador, para que o comerciante possa consultar um formidável cadastro, a ser criado em âmbito nacional, com as identificações dos sustadores de cheques.
E, para completar, quem susta um cheque terá que comparecer à respectiva agência dentro de 48 horas, para confirmar o pedido de sustação. Sem isso, o cheque não será sustado.
Bem bolado. Embora um tanto repetitivo. Os cheques já trazem, impressos pelos bancos, a identificação do portador, com nome e CPF.
Além de repetitivo, um tanto dispendioso. Caso o emitente esteja fora de sua cidade e precise sustar um cheque -por roubo do talão, por erro de preenchimento notado mais tarde, por não receber o serviço ou produto já pago-, terá que comprar ida e volta de avião, para ir ao seu banco comprovar o pedido telefônico.
Pedro Malan, Paulo Paiva e Gustavo Franco por certo esqueceram que nem todos viajam em jatos da FAB ou com passagens pagas pelo governo. Por sinal, governo recordista absoluto em despesas de viagens. Sobretudo para Europa e Estados Unidos.



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