UOL

São Paulo, quinta-feira, 05 de junho de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ABC DA POLÍTICA

Presidente reage a apupos e recebe aplausos ao dizer que esquerda da entidade deveria ser mais propositiva

Lula defende reformas e parte da CUT vaia

PLÍNIO FRAGA
JULIA DUAILIBI
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao defender as reformas previdenciária e tributária, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi vaiado por cerca de 100 dos 2.000 sindicalistas da Central Única dos Trabalhadores presentes ao 8º Congresso Nacional da entidade, no Parque Anhembi (São Paulo).
"Vamos fazer a economia brasileira voltar a crescer, vamos gerar os empregos que precisamos, vamos fazer as reformas que precisam ser feitas neste país e vamos fazê-las com a maior tranquilidade", dizia Lula quando as vaias irromperam com mais força.
Ele respondeu aos apupos dos sindicalistas de tendências minoritárias da CUT como a Organização Marxista Proletária, a Liga Bolchevique Internacionalista e a Corrente Socialista: "Não me preocupo com vaias, porque acho que a vaia é tão importante quanto o aplauso. Teve gente que me vaiou porque eu queria criar o PT. Vocês sabem o tanto que fui vaiado para criar a CUT, em 1983".
Os sindicalistas portavam faixas dizendo "Não às reformas neoliberais de Lula e do FMI" e gritavam slogans: "É Lula lá, é nós aqui, é unidade contra o FMI"; "Um, dois, três, quatro, cinco, mil, ou pára essa reforma ou paramos o Brasil"; e "Lula tenha decência, não privatize a Previdência".
O presidente ouviu os coros, leu as faixas e foi maciçamente aplaudido quando rebateu: "Quero pedir a vocês uma coisa. Em vez de alguns companheiros, tão preciosos, fazerem faixas, seria melhor dizer o que querem para a gente poder atender, para a gente poder fazer as coisas. Isso seria muito melhor e muito mais prudente".
Lula fez um apelo aos sindicalistas em defesa do entendimento. "Vamos fazer as coisas numa mesa de negociação, na qual todos poderão dizer o que pensam, todos poderão brigar por aquilo que acreditam que seja verdadeiro, até que uma determinada maioria possa construir aquilo que seja o melhor para este país."
Na CUT, a maior resistência é contra a reforma de Previdência, em especial a proposta de cobrança de contribuição de 11% dos servidores inativos. Os servidores representam cerca de 35% do total de associados da CUT. A eles, Lula fez promessas: "Vamos criar o mais importante plano de cargos e salários para o setor público já feito na história deste país".
Antes de Lula, já haviam sido vaiados os ministros Jaques Wagner (Trabalho) e Luiz Dulci (Secretaria Geral da Presidência).
Foi a primeira vez que um presidente da República participou de um congresso da CUT, que completa 20 anos de fundação neste ano. Em reuniões preparatórias do encontro, com as diversas tendências da entidade, foi acertado que nenhuma facção promoveria "baixarias" contra Lula. Para a esquerda cutista, a vaia foi uma expressão de opinião que não pode ser enquadrada como "baixaria".
Ao anunciar a presença do petista, o presidente da CUT, João Felicio, fez um alerta aos delegados: "Receber Lula com carinho é obrigação de todo revolucionário de esquerda". Quando o presidente chegou ao plenário, a maioria dos sindicalistas cantava: "Olê, olê, olá, Lula, Lula". Já a esquerda entoava: "Olê, Olê, Olá, luta, luta".

Resposta aos radicais
O presidente iniciou seu discurso se dizendo em família e mandou um recado para os radicais. "Mesmo aqueles que possam divergir, vamos respeitá-los, porque na casa da gente muitas vezes a família pensa diferente."
Lula foi aplaudido ao se referir ao esperneio dos descontentes: "Muitas pessoas que morrem afogadas não morrem afogadas porque não sabem nadar. Se tivessem controle emocional e consciência de que seu corpo é mais leve do que a água, se mantivessem a tranquilidade, muitos não morreriam. Morrem porque ficam nervosos, batem demasiadamente as mãos e os pés, abrem a boca demais, bebem água indevida".
"O presidente da República em nenhum momento pode perder o equilíbrio, perder a noção daquilo que ele mesmo espera de si e daqueles que são os compromissos históricos -que ninguém pediu para que eu assumisse com a classe trabalhadora", tentou explicar.
Comparou as queixas que recebe contra seu governo às da mulher de um marido que passa no bar depois do trabalho. "Muitas vezes acontecem coisas que deixam a gente meio chateado. O companheiro trabalha das 7h às 18h, todo santo dia e, às vezes, pára para tomar uma cervejinha com um companheiro. Quando chega em casa, não tem nenhum elogio pelas 12 horas que trabalhou, mas tem críticas pela meia hora em que tomou uma cerveja."
Lula reclamou de juízos que acredita precipitados. "O que não pode é alguém julgar uma criança quando ela ainda está no ventre da mãe. Temos apenas cinco meses de governo. E, se eu fosse uma criança gerada no ventre da minha mãe, ainda faltariam quatro meses para que vocês pudessem dizer se eu sou bonito ou feio." Tentou se mostrar conciliador: "Quero deixar claro aqui que ninguém se tornará meu amigo porque defende as reformas ou meu inimigo porque não as defende".
O presidente encerrou seu discurso com lágrimas. "Olhem bem nos meus olhos e tenham a certeza de que este companheiro, torneiro mecânico, nordestino de Pernambuco, que perdeu três eleições, que não desistiu em nenhum momento, e, por conta e responsabilidade de vocês, chegou à Presidência da República, não esquece e não irá esquecer nenhum dos compromissos que assumiu", disse. "Se alguém, em algum momento, teve vergonha do que foi, eu não tenho. Não tenho vergonha do que fui, não tenho vergonha do que sou e não tenho vergonha do que serei. E eu dizia e vou repetir para vocês: nós vamos fazer a economia brasileira mudar", concluiu, sob aplausos.


Texto Anterior: Servidores vaiam deputados petistas na CCJ
Próximo Texto: Frases
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.