São Paulo, domingo, 05 de agosto de 2001

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ESPÍRITO DE CORPO

STF aguarda resposta de 18 pedidos de licença prévia para processar criminalmente 14 deputados e senadores

Congresso protege parlamentares de ações

ROBERTO COSSO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

As gavetas do Congresso guardam, em alguns casos há mais de uma década, 18 pedidos de licença prévia do STF (Supremo Tribunal Federal) para que sejam abertos processos criminais contra 14 deputados e senadores.
E não há perspectiva de que essas gavetas sejam esvaziadas rapidamente, apesar de Câmara e Senado, na volta do recesso de julho, terem aberto o debate em torno de um "pacote ético" para mudar a imagem das duas Casas.
De acordo com o artigo 53 da Constituição Federal, os congressistas só podem ser processados criminalmente após ser concedida autorização da Casa onde exercem seus mandatos.
Entre 1991 e 1999, a Câmara dos Deputados recebeu 151 pedidos de licença prévia do STF, mas só concedeu duas autorizações: em 1991, sobre o deputado Jabes Rabelo, e em 1997, sobre o ex-deputado Davi Alves da Silva.
Dos 149 pedidos restantes, a licença foi negada em 62 casos. Outros 87 pedidos não foram analisados antes de os congressistas deixarem de exercer mandato.

Inquéritos
Levantamento realizado pela Folha no STF mostra que de outros 98 congressistas que exercem papel de maior destaque em suas Casas, 24 respondem a 49 inquéritos, que podem se transformar em processos -e em novos pedidos de licença prévia. Um deles refere-se ao presidente licenciado do Senado, Jader Barbalho (PMDB-PA), cuja licença prévia os líderes se comprometeram a aprovar rapidamente.
O critério para seleção dos congressistas foi o fato de participarem da mesa diretora de suas Casas, de serem líderes partidários ou membros do Conselho de Ética (no caso do Senado) ou da Comissão de Constituição e Justiça e de Redação (na Câmara).
No mesmo grupo, outros seis congressistas responderão a pelo menos dez inquéritos quando terminarem seus mandatos. Em todos os casos, o Congresso negou autorização ao STF e o processo ficou suspenso.
Quando isso ocorre, a prescrição também é suspensa. Ou seja, a negativa de licença não livra o congressista do processo -a menos que ele exerça o mandato parlamentar até o final da vida.
Tramitam no Senado e na Câmara diversas propostas de emenda constitucional com o objetivo de relativizar a imunidade parlamentar e agilizar os processos contra os congressistas. As propostas devem ser votadas no chamado "pacote ético", proposto pelos presidentes Aécio Neves (Câmara) e Edison Lobão (interino do Senado).

Processos
A maioria dos inquéritos abertos contra deputados e senadores é sobre crime eleitoral ou os chamados delitos de opinião -calúnia, injúria e difamação.
Nesses casos é praticamente unânime entre os congressistas que a licença prévia não deve ser concedida. A maioria deles defende a manutenção da imunidade para os delitos de opinião.
Mas também há diversos processos com acusações graves em relação a parlamentares, que estão parados, em virtude do corporativismo da Câmara, que não analisa os pedidos do STF.
O deputado Remi Trinta (PST-MA) é acusado de estelionato em detrimento de entidade pública, formação de quadrilha e falsificação de documento público. Ele é suspeito de fraudar o SUS (Sistema Único de Saúde), por meio de uma clínica médica, em São Luís.
Trinta afirma haver 17 inquéritos contra ele em andamento. Dois deles aguardam apreciação da Câmara.
Acusado de crime de racismo, que é imprescritível e inafiançável, a Câmara negou autorização ao STF para que Trinta fosse processado. Ele brigou com um comissário de bordo que é negro.

Mais antigo
O pedido de licença prévia mais antigo diz respeito ao deputado Ibrahim Abi-Ackel (PPB-MG) e aguarda decisão da Câmara dos Deputados há 12 anos.
O deputado é acusado de ter cometido crime de peculato, quando era ministro da Justiça, entre 2 de janeiro de 1980 e 15 de março de 1985. Ele teria usado indevidamente duas passagens aéreas pagas pela União. O regime militar terminou há 16 anos, e o processo ainda não foi iniciado.
Abi-Ackel diz que gostaria de abrir mão de sua imunidade parlamentar para responder ao processo, mas isso não é possível. Ele pediu ao presidente da Casa para que o pedido em relação a ele seja julgado rapidamente.
"Se eu pudesse, abriria mão [da imunidade" para responder ao processo", afirma o deputado Geraldo Magela (PT-DF), acusado de crime contra a honra, por ter comparado o governador Joaquim Roriz (PMDB-DF) ao ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta (PTN). "Agora tenho medo de ser processado pelo Pitta", diz.



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