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VARGAS - 50 ANOS
Dois novos livros afirmam que capangas do chefe da guarda pessoal de Getúlio Vargas não pretendiam matar Carlos Lacerda
"Crime da rua Tonelero" ainda gera dúvida
LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO
Nos primeiros minutos de 5 de
agosto de 1954, uma quinta-feira
como hoje, foi assassinado o major-aviador Rubens Vaz em frente
ao prédio onde morava o jornalista Carlos Lacerda, em Copacabana, no Rio. Após 19 dias de crise
política, o presidente Getúlio Vargas se matou. Exatos 50 anos depois do assassinato, o "crime da
rua Tonelero" continua despertando paixões, versões e dúvidas.
De acordo com o Inquérito Policial Militar realizado entre agosto e setembro de 1954, Gregório
Fortunato, chefe da Guarda Pessoal de Vargas, foi o mandante de
um atentado que tinha Lacerda
como alvo. O jornalista, que fazia
em seu jornal, a "Tribuna da Imprensa", campanha contra Vargas, foi ferido no pé. O oficial da
Aeronáutica que o acompanhava
levou dois tiros enquanto brigava
com o pistoleiro Alcino João do
Nascimento.
Essa é a versão oficial, confirmada em júri popular em 1956. Mas
ela ainda é contestada por pessoas
- em especial admiradores de
Vargas - que apontam buracos
no inquérito e procuram respostas para antigas perguntas.
Dois livros vêm agora renovar a
lenha dessa fogueira histórica.
"Vitória na Derrota" (Casa da Palavra), do sociólogo Ronaldo
Conde Aguiar, e "Getúlio" (Record), do jornalista e escritor Juremir Machado da Silva, têm
muitas diferenças entre si, mas a
convicção de que os enviados de
Gregório Fortunato não tinham o
objetivo de matar Lacerda.
Machado da Silva, cuja obra
chega às livrarias em duas semanas, fez um romance histórico, repetindo a opção de Rubem Fonseca em "Agosto". Apesar dessa liberdade, passou três anos lendo
tudo sobre o caso e entrevistando
pessoas, incluindo o assassino de
Vaz. O livro se inclina por ver Lutero Vargas, filho de Getúlio, por
trás do que seria um "susto" ou
uma "surra" em Lacerda, não um
homicídio.
Para o escritor, o pistoleiro Alcino e Climério Euribes de Almeida, membro da Guarda Pessoal
que também estava na Tonelero,
não tinham condições de realizar
o atentado. "Eles eram incompetentes, e a história montada era
muito amadora", afirma.
O amadorismo a que se refere é
o mesmo que leva Conde Aguiar a
contestar a idéia de atentado: Alcino usou uma arma das Forças
Armadas; Nélson Raimundo de
Souza, o motorista de táxi que foi
chamado por Climério para o serviço e retirou Alcino do local, fazia ponto em frente ao Palácio do
Catete; e não havia plano de fuga
para Climério e Alcino, que foram
presos dias depois.
Ou seja, para um atentado contra aquele que era o mais ruidoso
adversário de Vargas, havia pistas
demais apontando para o Catete.
Isso contribuiu para que Conde
Aguiar acrescentasse em seu livro
mais uma hipótese para o "crime
da rua Tonelero".
"Havia um grupo seguindo Alcino e Climério. Um grupo que
não queria matar Lacerda, mas o
militar que estivesse com ele, para
precipitar a crise política. Os reais
mandante e pistoleiro não foram
descobertos", diz ele.
Paixão
Versões como essa têm origem
no tom passional que sempre cercou o crime. Getulista assumido,
Conde Aguiar escreve em seu livro que, depois de morto, Getúlio
"passou a viver na memória e no
coração do povo brasileiro".
Por outro lado, o IPM da Aeronáutica tem várias expressões como "mentiroso depoimento",
num tom anti-Vargas acalorado
demais para um relatório.
Durante o inquérito, não foi feita reconstituição do crime ou acareação entre Lacerda e Alcino. O
resultado é que até hoje não se sabe exatamente o que aconteceu na
Tonelero.
Rubens Vaz Júnior, 55, um dos
quatro filhos do major assassinado e estudioso do caso, confia no
resultado do IPM e afirma que a
justiça foi feita.
Para ele, Alcino já atravessou a
rua atirando em Lacerda, acertando-o no pé. Quando Lacerda fugiu para a garagem com seu filho
Sérgio, então com 15 anos, Vaz
partiu, desarmado, em direção ao
pistoleiro, dando uma chave-de-braço nele e aí tomando o primeiro tiro. Ao cair, tomou o segundo.
Não teria havido outro, como dizem os que acreditam em pelo
menos mais um homem na cena.
"Meu pai era um homem de vida simples, mas determinado. Ao
decidir, juntamente com outros
oficiais, acompanhar Lacerda, ele
sabia que corria perigo, mas era
consciente de que estava fazendo
o melhor pelo país", afirma Vaz
Júnior, lembrando que seu pai estava com Lacerda substituindo
outro oficial, Gustavo Borges, que
lhe pedira para trocar o turno.
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