|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
"TCU não é algoz, é parceiro", diz Aguiar
Presidente do tribunal afirma que "a corrupção está nos diversos setores da atividade brasileira" e defende "banho de cidadania'
Para Aguiar, "tribunal não
está mais naquele tempo de
Carmelitas Descalças, com os
ministros trancados, com
medo da promiscuidade"
Sérgio Lima/Folha Imagem
|
|
O presidente do Tribunal de Contas da União,Ubiratan Aguiar, em
seu apartamento em Brasília
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
Além de já viver às turras
com o governo federal, inclusive com estatais, como a Petrobras, o Tribunal de Contas da
União tem agenda cheia: pré-sal, eleições de 2010, Copa do
Mundo em 2014 e Olimpíada
em 2016, sem falar no pacote de
submarinos e de caças na área
da Defesa. Todos envolvem recursos públicos bilionários.
Para o seu presidente, Ubiratan Aguiar, 68, todo cuidado é
pouco. "A corrupção está nos
diversos setores da atividade
brasileira", diz ele, pregando
"um banho de cidadania".
Segue entrevista concedida
às 9h de ontem, no seu apartamento em Brasília.
FOLHA - Eleições em 2010, com
tentação de desvios, Copa em 2014,
Olimpíada em 2016. O TCU tem estrutura para tantos desafios?
UBIRATAN AGUIAR - Todo o quadro é concursado, um pessoal
de excelente nível intelectual,
com cursos de aperfeiçoamento e de pós-graduação. Pela excelência do nosso trabalho, o
Brasil hoje preside o comitê de
gestão e performance da Intosai, que é a Instituição Internacional das Entidades de Fiscalização Superiores. Foi eleito por
todos os tribunais de controle
do mundo. Além disso, estará
todo virtual a partir de agosto.
FOLHA - O orçamento do Pan era
em torno de R$ 400 milhões e ficou
umas 10 vezes mais. Orçamento no
Brasil é de mentirinha?
AGUIAR - É o que falo de falta de
planejamento, de cronograma.
FOLHA - Há uma cultura de corrupção, de superfaturamento?
AGUIAR - A corrupção está nos
diversos setores da atividade
brasileira, e a nossa função é
dar um banho de cidadania.
Ensino é muito importante,
mas educação é muito mais do
que isso, com conteúdos éticos,
morais, de pátria, de família.
Nós estamos tendo excelentes
profissionais em praticamente
todas as áreas. Mas estamos
tendo excelentes cidadãos?
FOLHA - O TCU não é partidarizado
e neste momento atua como oposição ao governo Lula?
AGUIAR - Não há possibilidade,
é inimaginável. Os técnicos,
que passaram por concursos
dificílimos, sem cores partidárias, concluem o seu trabalho
com um relatório, que vai para
a avaliação jurídica do Ministério Público de Contas, todo ele
concursado também. O que
chega à mesa do ministro do
TCU é um relatório técnico
com parecer jurídico. E mais: a
assessoria técnica do ministro
também é concursada, da Casa.
FOLHA - Dos nove ministros, a
maioria não vem da oposição? O sr.
mesmo era do PSDB.
AGUIAR - Mas você tem de se
despir daquela condição política, como também fazem os ministros do Supremo Tribunal
Federal. E seria útil que a imprensa mobilizasse a sociedade
para que a Ordem dos Advogados, a Ordem dos Engenheiros
e outras entidades indiquem
nomes daqui para a frente. A
Constituição diz que o Congresso sugere nomes, não que
esses nomes sejam de deputados e senadores.
FOLHA - O sr. era deputado e há outros cinco ex-congressistas, inclusive
o mais novo, José Múcio, que foi do
DEM e estava no PTB.
AGUIAR - Todos são submetidos a sabatinas no Congresso,
têm dez anos na área técnica e
reputação ilibada. A Casa é técnica, não política.
FOLHA - Por que o presidente Lula e
a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) acusam o TCU de atrasar obras
do PAC?
AGUIAR - De fato, foi 0,5% [do
total de obras fiscalizadas]. E
porque era o que existia mesmo, porque as obras do PAC
têm tido uma gestão e uma
atenção direta e forte da ministra Dilma. O índice é baixo.
FOLHA - Das 99 obras, 13 tiveram
indicação de suspensão. E 17 não tiveram retenções de verbas?
AGUIAR - Do total a ser recebido pela empresa, uma parcela
fica retida pelo órgão gestor.
Com que intuito? Com o intuito de preservar o Tesouro Nacional. Se, ao final do processo,
ficar constatado que não houve
irregularidades, devolve-se o
que foi retido. Trabalha-se com
fiança bancária, até para que as
partes tenham mais pressa.
FOLHA - Quanto demora?
AGUIAR - Depende muito mais
das partes que do tribunal. Se
esclarecem, mostram as provas, imediatamente se julga.
Agora, se fica pedindo mais
prazo, devendo mais provas,
aí... Há pouco tempo, o consórcio do metrô de Salvador trouxe 50 caixas de documentos e
pediu seis meses de prazo para
mais elementos. Daí, fica difícil.
FOLHA - A ministra Dilma não tem
razão quando diz que as obras paralisadas são retomadas com preços
bem mais altos?
AGUIAR - Se o projeto é bem
elaborado, flui normalmente.
Se é mal elaborado, tem tudo
para dar problema. Há obras
que são licitadas e começam
sem ter nem sequer o projeto
executivo concluído, como nos
aeroportos de Vitória e Macapá. A ministra sabe de tudo isso.
FOLHA - Aliás, por que o foco de irregularidades são aeroportos, estradas e refinarias?
AGUIAR - Temos uma matriz de
auditoria desenvolvida com
critérios técnicos. Mas boa parcela dos investimentos nacionais ocorre no âmbito de estatais, como Petrobras e Eletrobrás, que necessitam ter estatuto jurídico próprio para disciplinar tudo, inclusive contratos
e licitações, para que não fiquem sujeitas à Lei das Licitações, que em alguns casos lhes
retira a competitividade. Mas a
mudança não saiu até agora, e
temos de seguir a lei.
FOLHA - Além da guerra com o governo federal, há uma particular
com a Petrobras?
AGUIAR - Não. Nós temos o
maior interesse em que a Petrobras seja sempre uma referência internacional. E vou dizer mais: já não se é literal para
apreciar os assuntos da Petrobras, analisa-se também observando os objetivos maiores.
FOLHA - Todas as áreas fiscalizadas
têm de estar atentas?
AGUIAR - E dialogando conosco. O tribunal não está mais naquele tempo de Carmelitas
Descalças, com os ministros
trancados entre quatro paredes, com medo da promiscuidade. Nós estamos vacinados
contra a promiscuidade e queremos estar perto da clientela,
para orientá-la e ajudá-la.
O tribunal não pode ser visto
como algoz pelos Poderes, mas
como parceiro. Quem é fiscalizado nunca fica muito à vontade, mas cada um tem de cumprir a sua parte.
FOLHA - Como o sr. dimensiona a
importância do TCU?
AGUIAR - Em 2008, conseguimos uma economia de R$ 31,9
bilhões para os cofres públicos.
Texto Anterior: Entrevista 2: Candidatura do PT é irreversível, diz ex-governador Próximo Texto: Frases Índice
|