São Paulo, segunda-feira, 06 de janeiro de 2003

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DIPLOMACIA

Recado foi transmitido no dia da posse de Lula

Brasil diz aos EUA que teme efeitos de guerras no Iraque e na Venezuela

CLÓVIS ROSSI
COLUNISTA DA FOLHA

Autoridades do novo governo brasileiro transmitiram a interlocutores norte-americanos o temor de que duas guerras simultâneas (um ataque norte-americano ao Iraque e uma guerra civil na Venezuela) joguem o preço do petróleo nas alturas e torpedeiem qualquer hipótese de reativação da economia brasileira neste ano.
As conversas envolveram, do lado dos Estados Unidos, John Maisto, encarregado de América Latina na Casa Branca, o responsável pelo comércio exterior, Robert Zoellick, e a embaixadora no Brasil, Donna Hrinak, tudo durante e pouco depois das cerimônias de posse de Luiz Inácio Lula da Silva.
A menção às duas guerras foi a maneira de demonstrar que o governo Lula discorda frontalmente da posição dos Estados Unidos na crise da Venezuela, caracterizada pela defesa da realização de eleições o mais cedo possível.
Como eleições antecipadas violariam a Constituição, o governo brasileiro (o atual como o anterior) recusa-se a aceitá-las, assim como o faz o presidente Hugo Chávez, da Venezuela.
A única hipótese de antecipar a eleição seria a aprovação de emenda constitucional, mas o processo é tão tortuoso que jogaria o pleito para meados do ano.
Como já está previsto, na Constituição venezuelana, o chamado plebiscito revogatório, para agosto, a hipótese eleitoral fica prejudicada.
A Coordenação Democrática (CD), organização que reúne os principais partidos, entidades e movimentos de oposição da Venezuela, promove uma greve geral desde o dia 2 de dezembro. A CD pede a renúncia de Chávez, cujo mandato vai até 2007.

Interesses econômicos
O argumento das duas guerras foi utilizado para dizer que para o Brasil uma solução política e negociada na Venezuela não é apenas uma questão de defender princípios, como a vigência das instituições democráticas, mas também defender interesses econômicos vitais.
As autoridades brasileiras usaram, junto aos norte-americanos, o argumento que o presidente Lula já havia exposto até antes da posse: eleição na Venezuela não resolve nada, se não for acompanhada de um acordo político entre governo e oposição que estabeleça o respeito às regras do jogo.
Em caso contrário, o lado perdedor iria para a "insurgência", conforme a expressão ouvida pela Folha no Palácio do Planalto, o que, por sua vez, caracterizaria a situação de guerra civil.
O próprio Lula tratou de aconselhar Chávez, no café da manhã de anteontem, para que negociasse com a oposição. O presidente brasileiro reiterou seu apoio ao governo legítimo da Venezuela, mas disse que era importante negociar uma saída para a crise.
O governo Lula está dando a sua contribuição, ao tentar formar o chamado "grupo de Amigos" da Venezuela, para ajudar na missão de conciliação que o secretário-geral da OEA (Organização dos Estados Americanos), César Gaviria, está tentando desempenhar, até agora inutilmente.
França, Espanha e Portugal já foram contatados, além de países latino-americanos. Até a ONU está disposta a envolver-se, como deixou claro o responsável por Direitos Humanos da organização, o embaixador brasileiro Sérgio Vieira de Mello, que também compareceu às cerimônias de troca de governo no Brasil.



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