São Paulo, segunda, 6 de abril de 1998

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TRABALHO INFANTIL
Participantes de debate na Folha divergem sobre eficácia de cerco na OIT aos países suspeitos
Boicote comercial divide especialistas

da Reportagem Local


O estabelecimento de sanções comerciais a países, setores econômicos ou empresas que utilizam mão-de-obra infantil tornou-se a grande polêmica na luta contra essa prática em todo o mundo.
Como já tem ocorrido em diversas reuniões internacionais, a questão dividiu os participantes do debate "Trabalho Infantil nas Relações Internacionais de Comércio", realizado na última terça-feira, no auditório da Folha.
"A pressão econômica tem um poder extraordinário para mudar a situação", disse o presidente da Fundação Abrinq, Oded Grajew, favorável às sanções, depois de esgotadas outras possibilidades.
Com mediação do jornalista Gilberto Dimenstein, do Conselho Editorial da Folha, o evento discutiu o problema do trabalho infantil no Brasil e no mundo.

OIT e OMC
Atualmente, as questões ligadas às condições de trabalho, incluindo o emprego de crianças, são tratadas no âmbito da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Para que pudesse haver punições contra os que utilizam a mão-de-obra infantil, o assunto deveria ser levado para a OMC (Organização Mundial do Comércio), proposta rejeitada por muitos países, entre eles o Brasil.
Na tentativa de quebrar o impasse, a Fundação Abrinq elaborou uma proposta que atenua, mas mantém a perspectiva de sanções.
A idéia, apresentada no debate por Grajew, seria criar uma comissão sob coordenação da OIT e do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), composta por representantes de governos, empresários, trabalhadores e organizações não-governamentais.
No caso de uma denúncia, a comissão examinaria o caso durante três meses. Se confirmada, haveria um prazo de um ano para resolver o problema. Depois, a empresa ou o setor, mas não o país envolvido, seria punido no âmbito da OMC.
Dificuldades
Para Bruno de Risios Bath, chefe da Divisão de Temas Sociais do Ministério das Relações Exteriores, haveria muitos obstáculos para a obtenção de apoio e de um consenso que levasse à formação da comissão. "Eu, pessoalmente, acho difícil conseguir", disse.
Bath também criticou a ênfase dada às punições. "É preocupante que a discussão seja sequestrada pela questão comercial."
Francisco Cannabrava, secretário da Divisão de Política Comercial do Itamaraty, afirmou que uma proposta prevendo sanções é hoje inviável, pois a transferência do tema para a OMC foi descartada em encontros internacionais.
A idéia de uma cláusula social na Organização Mundial do Comércio foi defendida no debate pelo secretário de relações internacionais da CUT (Central Única dos Trabalhadores), Kjeld Jakobsen.

Questão de poderes
"A OIT não tem poder de sanção e isso tem sido insuficiente para tratar do problema", afirmou Jakobsen. "Têm que ser colocadas regras mínimas, que todos os países devem respeitar."
Jakobsen e Oded Grajew disseram que, com a falta de punições a empresas ou setores que usam crianças na produção, o Brasil ficará a reboque de governos e ONGs, que podem, unilateralmente, impor suas restrições.
O representante do Unicef no Brasil, Agop Kayayan, mostrou-se cauteloso em relação à alternativa da Fundação Abrinq.
"A questão da sanção é muito mais complexa do que imaginamos", disse. Para Kayayan, a proposta é "positiva", mas ele teme que sanções levem a cortes de gastos nas áreas sociais.
O diretor da OIT no Brasil, Armand Pereira, elogiou a atuação do governo brasileiro no combate ao problema. Afirmou também que a questão econômica não deveria ser o centro do debate. "Não é um problema de sanção, é um problema de dignidade humana, de saúde, de segurança."



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