São Paulo, segunda-feira, 06 de maio de 2002

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INVESTIGAÇÃO

União pode vir a pagar R$ 66,4 milhões por imóvel na serra da Bocaina em que cabana é única benfeitoria

Juiz quer anulação de desapropriação de choupana

FREDERICO VASCONCELOS
DA REPORTAGEM LOCAL

O juiz Casem Mazloum, da 1ª Vara Criminal Federal de São Paulo, entende que a Justiça deve anular o processo de desapropriação em que a União pode vir a pagar R$ 66,4 milhões por uma choupana. "Todos os processos em que o falso engenheiro [Antonio Carlos Suplicy" fez perícia devem ser anulados", diz Mazloum.
A Folha revelou ontem que a indenização na desapropriação de um imóvel na serra da Bocaina -em que uma cabana é a única benfeitoria citada no processo- foi baseada em laudo de Suplicy. No ano passado, Suplicy foi condenado a três anos de prisão, por uso continuado de diploma falso.
Em seu laudo, o falso engenheiro aumentou a área da propriedade em 100% e inflou o valor da terra nua e da cobertura vegetal.
"Só pelo fato de o sujeito se intitular engenheiro e seu diploma ser falso já é motivo para anular todas as perícias que ele fez em processos", diz Mazloum.
A indenização no caso da choupana foi determinada pelo juiz federal Marcelo Mesquita Saraiva, da 15ª Vara Federal, em 1997, e mantida, em 1998, pelo Tribunal Regional Federal, em julgamento do qual Mazloum participou.
Juiz convocado do TRF, Mazloum acompanhou voto do relator, desembargador Paulo Theotonio Costa, que rejeitou requerimento de nulidade do laudo pericial de Suplicy apresentado pelo Ministério Público Federal.
"Eu não tenho intuição feminina [sexto sentido] para saber de antemão, em 1998, que ele [Suplicy] iria ser condenado ou que seria descoberto que ele usava diploma falso", diz Mazloum.
O acórdão da 1ª Turma do TRF é de 3 de novembro de 1998. No dia 24 de agosto daquele ano, o procurador regional da República João Francisco Rocha da Silva tinha requerido ao relator (Theotonio Costa) a nulidade do processo e a restituição dos honorários que Suplicy havia recebido no caso.
Em apelação, o procurador Rocha da Silva informara ao desembargador-relator que Suplicy havia sido "denunciado e está sendo processado" perante a 4ª Vara Criminal por uso continuado de diploma falso de engenheiro.
"Quando eu acompanhei o voto, não sabia que o perito usava documento falso", disse Mazloum, ontem, em telefonema à Folha. "Se ele foi denunciado, eu não tive acesso aos autos, não tinha conhecimento", disse.
"Eu não me lembro do caso. Sinceramente, não me lembro. Foi logo quando cheguei no tribunal, em 1998. Eu não me lembro de detalhe nenhum" declarou.
Mazloum diz que nunca nomeou Suplicy como perito. "Eu jamais o vi na minha vida", disse. No caso da choupana, Suplicy foi designado em 1989 pelo desembargador Roberto Haddad, que atuava como juiz de primeira instância, na 15ª Vara Federal.
Os desembargadores Theotonio Costa (afastado do TRF-SP) e Haddad -denunciados por falsificação de documentos públicos- são investigados pelo Superior Tribunal de Justiça por suspeita de enriquecimento ilícito.
"Eu entendo que os juízes que nomearam esse perito também foram vítimas, porque ele [Suplicy" apresentou diploma falso", diz o juiz da 1ª Vara Criminal.
Mazloum diz que, ao determinar que os juros compensatórios (12% ao ano) contassem a partir de 1972, o juiz Saraiva estava sentenciando "com base em súmula do STJ, jurisprudência pacífica".
"A demora no pagamento é que acaba acarretando a elevação dessas indenizações a valores absurdos", diz Mazloum.
O pagamento da indenização no caso da choupana foi suspenso provisoriamente pelo desembargador Fábio Prieto, do TRF-SP, em ação rescisória movida pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis).

Herdeiros
A professora aposentada Maria Ada Cherubini, filha mais velha de Amélia Adélia Cherubini, que em 1985 moveu a ação de desapropriação, não sabia que o valor corrigido da indenização já chega a R$ 66,4 milhões (ver entrevista).
Seu ex-marido, Osvaldo Arouca, procurado pessoalmente, não concedeu entrevista. A Folhanão conseguiu localizar ontem o advogado da família Cherubini, Luiz Roberto de Arruda Sampaio.



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