São Paulo, Sexta-feira, 06 de Agosto de 1999
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CELSO PINTO
As contas fiscais de 2000


O governo calcula que poderia ter um ganho fiscal de R$ 7 bilhões, no próximo ano, com três medidas que o Congresso teria que aprovar neste semestre: mudanças no INSS (R$ 4,3 bilhões), na aposentadoria dos militares (R$ 1,7 bilhão) e com a regulamentação da reforma administrativa (R$ 1 bilhão).
As duas primeiras nem sequer foram ainda apresentadas ao Congresso. A atual fragilidade política do governo, de todo modo, coloca fortes dúvidas sobre sua capacidade de aprová-las.
Ao todo, contando essas medidas e outras, já aprovadas ou em julgamento no Supremo Tribunal Federal, o cálculo do governo é que poderia haver um ganho fiscal adicional de R$ 22,7 bilhões no ano 2.000. Haveria, ainda, o impacto positivo do crescimento esperado sobre a receita fiscal.
O governo trabalha com a hipótese de um crescimento de 4% do PIB no próximo ano e estima que cada ponto a mais no PIB gere 1% a mais na receita. Mesmo descontando fatores excepcionais, que ajudaram a engordar a receita este ano, se esse crescimento se confirmar, o adicional de receita fiscal poderia ultrapassar R$ 5 bilhões.
O ganho fiscal adicional, portanto, poderia chegar a uns R$ 27 bilhões. Parece muito, mas não é. É bom lembrar que o acordo com o FMI prevê um aumento do superávit primário (receita menos despesas, exceto juros) do setor público de 3,1% do PIB neste ano para 3,25% no próximo.
O governo federal teria que gerar 2,6% do PIB de superávit. Se o PIB, em reais, tiver uma queda de 0,6% este ano e crescer 4% no próximo, chegará a R$ 1,1 trilhão, nos cálculos do Banco ING. Nesta hipótese, só o superávit primário do governo central teria que chegar a R$ 28,6 bilhões.
Além disso, neste ano houve um volume muito significativo de receita adicional, que não se repetirá no ano 2000. Segundo um documento do Ministério da Fazenda, a cobrança de atrasados do Imposto de Renda gerou um ganho extra de R$ 2,4 bilhões e a taxação sobre ganhos gerados pela desvalorização cambial outros R$ 2,2 bilhões (R$ 1,5 bilhão com "swaps" e R$ 770 milhões com IR sobre remessas).
Outra receita adicional importante e que não se repetirá foi gerada pelas concessões (ligadas à privatização). Foram R$ 6,2 bilhões no primeiro semestre. A estimativa no acordo com o FMI, lembra um estudo do ING, é que ela chegue a R$ 9,3 bilhões neste ano e a R$ 4 bilhões no ano 2000. A menos que se gerem novas receitas de concessão, portanto, haveria menos R$ 5 bilhões no próximo ano.
As previsões do governo de ganhos adicionais no próximo ano, é bom lembrar, incluem várias medidas que estão sub judice no STF. Se o governo perder em questões essenciais, o ajuste fiscal estará mortalmente comprometido.
É o caso dos ganhos com as mudanças aprovadas na reforma da Previdência do setor público, que geraria ganhos extras de R$ 4,2 bilhões no próximo ano. O próprio governo admite que pode perder parte substancial das mudanças (todo o adicional a ser cobrado dos servidores na ativa).
A CPMF, também em julgamento no Supremo, geraria R$ 4,3 bilhões além do esperado, pelo fato de a alíquota de 0,38% vigorar até junho, porque entrou em vigor depois do esperado neste ano. O aumento de 2% para 3% na Cofins, outra medida em exame no STF, daria R$ 4,5 bilhões em 2000.
A aplicação da Cofins sobre setores monopolistas, que o governo acabou de ganhar no Supremo, geraria R$ 1,2 bilhão no próximo ano. Depósitos judiciais representariam um ganho de R$ 1,5 bilhão.
A tudo isso, seria ainda necessário acrescentar um esforço de contenção de gastos no orçamento fiscal e, quase certamente, medidas adicionais compensatórias. Vai ser impossível, por exemplo, o governo obter os R$ 4,9 bilhões previstos com a conta petróleo este ano, apesar dos aumentos recentes (no primeiro semestre, o ganho foi de R$ 1,6 bilhão).
Enquanto as decisões do STF não vierem e continuar incerta a disposição do Congresso em aprovar novas medidas fiscais, justifica-se o enorme ceticismo com que o mercado financeiro está vendo a trajetória fiscal. Ceticismo que está se refletindo numa forte pressão sobre o câmbio, que fez com que a cotação fechasse ontem a R$ 1,84 por dólar.


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