São Paulo, sexta-feira, 06 de setembro de 2002

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JANIO DE FREITAS

Um certo ato falho

O turbilhão de sonhos que movem a cabeça de quem chega a se imaginar presidente da República há de ser um mundo fascinante. Não há um só que, até o último minuto, admita a sua impossibilidade de ser o escolhido pela multidão de votos, por mais as evidências o indiquem.
José Serra está isento de tais evidências, é claro. Mas o seu ato falho em Recife -"nossa meta é alcançar isso no final do nosso primeiro mandato"- cometeu mais do que uma exposição eloquente da sua inflação particular de sonhos. Traiu-o, mesmo.
Serra já disse que, se eleito, não pretenderia a reeleição, propondo trocá-la pelo mandato único de cinco anos. Uma proposta muito atraente para os que consideram a reeleição à brasileira uma desastre para o país. Mas o que diz não é o que lhe vai nos recônditos revelados pelo ato falho, que o velho Freud recomendou levar-se mais a sério do que os pedidos de José Serra esquecê-lo ali mesmo.

Em tempo
Mesmo montado no governo, como sucessor de Roseana Sarney, José Reinaldo Tavares, do PFL, está nove pontos atrás de Jackson Lago, do PDT, que alcançou 41% das preferências para governador do Maranhão.
José Reinaldo tem biografia rica, e não só biografia. Na história execrável do Ministério dos Transportes, que vem dos seus tempos de Ministério da Viação e Obras Públicas, o ministro José Reinaldo Tavares deixou um dos capítulos mais nefandos.
Pois bem, a vitória de Jackson Lago pode ser dificultada e mesmo impedida pelo PSDB e pelo PSB, cujos candidatos têm 5% cada um, que poderiam assegurar a derrota de José Reinaldo já no primeiro turno, para evitar uso ainda maior, e talvez decisivo, do peso do governo no segundo.

Sem medo
Ficou no ar a idéia de que Luiz Inácio Lula da Silva elogiou o general Médici ou o seu governo ditatorial. Não houve tal elogio. Com outras palavras mas precisamente com este sentido, Lula disse que no governo Médici havia emprego e que os governos militares planejavam o Brasil a prazo longo, deixando, entre outras coisas, um sistema de comunicações muito melhorado. Disse isso para realçar o contraste com o governo de Fernando Henrique Cardoso.
A criminalidade praticada em quartéis e centros policiais sob cobertura da Presidência de Médici é uma verdade histórica que não apaga nem altera outras verdades históricas. E é verdade histórica que naqueles anos houve, por decorrência de intensa atividade econômica, grande ampliação da oferta de empregos e melhoria salarial. Assim como é verdade que, bem ou mal, os governos militares quiseram planejar muita coisa a longo prazo.
Certo esquerdismo precisa aprender a não ter medo das verdades históricas que não lhe sejam simpáticas.



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