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JANIO DE FREITAS
Caminhos do voto
Fim de campanha eleitoral
tem sempre um toque melancólico, impermeável às celebrações. O princípio das eleições
não é a justiça, que pode acontecer ou não, sem que sua ausência
diminua a validade formal do
resultado. Muitos dos que mereceriam o êxito não o têm, e a falta de reconhecimento é sempre
triste, pela dose de injustiça que
nunca lhe falta, mesmo quando
involuntário, e às vezes de ingratidão.
Bons candidatos não faltam. O
problema está na facilidade muito maior que os maus candidatos
têm para eleger-se, pela falta de
escrúpulos no ludibriar o eleitorado e pela maior facilidade de
recursos, por se prestarem a retribuições sem limites. Campanha
muito farta para parlamentar só
raramente falha como indicador
de mau candidato.
A escolha, pelo eleitor, coerente
com suas idéias e aspirações depende de informação. E o eleitorado brasileiro está entre os menos informados. Em parte, pelas
características que a mídia adotou desde o fim das restrições impostas pelo regime militar. Em
vários sentidos, é como se tais
restrições estivessem vigentes
ainda, apenas menos fortes. A vida diária do Congresso, por
exemplo, é o mais fértil (e interessante) fator de conhecimento
político geral e, no entanto, é
mais ignorada pelos jornais do
que ao tempo do regime militar.
A mídia só tem olhos para uma
ou outra votação, dependendo
dos interesses em jogo, e para casos esporádicos, escandalosos de
preferência. Dos três Poderes, a
imprensa brasileira só identifica
vida na Presidência da República e, nos anos recentes, se o reconhecimento funda-se na pessoa
do presidente.
A par dessa falência indeclarada do jornalismo dito político,
entre outras expressas na venda
insignificante dos jornais no Brasil, a dimensão do próprio eleitorado dificulta, se não impossibilita, um razoável padrão médio
de informação. Além de serem
115 milhões de eleitores, integram uma população em que só
um quarto das pessoas compreende, de fato, o que "lê" em
um texto vulgar.
A combinação de tais condicionantes explicaria, por si só, a piora do nível cultural e ético da atividade parlamentar, igualmente
nos planos federal, estadual e
municipal. Mas há ainda a influência dos reflexos da degenerescência cultural do país em todos os aspectos possíveis do que,
bem ou mal, se chame de cultura.
Cuidados
Uma das peculiaridades da
campanha eleitoral para a Presidência: o governo foi muito poupado de modo geral e, em particular, Fernando Henrique Cardoso e Pedro Malan, que são, afinal, os responsáveis pela insatisfação dos 77% que se declaram
desejosos de um governo diferente do atual. Uma proporção fantástica, mais de 3/4 dos cidadãos,
quase 8 em cada 10.
A pregação de mudança, a que
mesmo o candidato do governo
precisou recorrer, eventualmente
até de maneira explícita, foi feita
pelos candidatos, digamos, mudancistas com o mínimo possível
de referências às responsabilidades presidenciais e governamentais pelo agravamento que precisa ser revertido.
Foi como se houvesse os feitos
sem autores. Um evidente cuidado para não ativar as iras da mídia e dos poderosos setores beneficiados pela política financeira e
antieconômica.
Outro placar
Dentro da disputa entre candidatos transcorreu a disputa privada, disseram que "a guerra
baiana", entre os marqueteiros
Nizan Guanaes, de José Serra, e
Duda Mendonça, de Lula da Silva.
O acompanhamento, feito pelo
Datafolha, da avaliação de cada
horário eleitoral deu a Duda
uma vitória afirmada desde o
primeiro ao último programa,
sem uma só interrupção e, em geral, com vantagem ampla (chegou a 80% de aprovação contra
52%). Nizan Guanaes, perto do
final, perdeu o segundo para Anthony Garotinho, marqueteiro
de si mesmo, e chegou ao programa de encerramento já em situação de empate no último lugar.
Até aqui, porém, Nizan Guanaes foi frequentemente vitorioso, e Duda Mendonça nem sempre teve o êxito de agora. O que
prova que os propalados saberes
e poderes do marketing político
são frutos, sobretudo, do marketing de si mesmo. Ainda bem, para a vida política.
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