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ELIO GASPARI
Pague o pacto, pato:
congele seu salário
Lá vem o pacto. Ainda bem
que o presidente da poderosa Federação das Indústrias de
São Paulo, Horacio Lafer Piva,
mostrou o cabo da peixeira. A
saber:
"Eu tenho a impressão de que
nós vamos ter de identificar
aquelas categorias de empregados que tiveram uma perda de
renda muito significativa e, nessas, promover um reajuste salarial, mas também teremos que
identificar aquelas que poderão
esperar um pouco mais para
reajustar salários".
Como diria James Carville, o
marqueteiro de Bill Clinton:
"Segure os salários, idiota".
A maior eleição da história do
Brasil, uma das maiores do
mundo, ainda não completou
um mês e o empresariado paulista quer empurrar um congelamento light de salários num
governo petista. A banca, o tucanato, a Fiesp e os economistas
do risco Brasil estão fazendo
uma confusão: confundem o
mandato da crise (que é deles),
com o mandato popular (que é
do presidente eleito).
Lula teve 51 milhões de votos.
Colocando a coisa de outra maneira: 51 milhões de brasileiros
quiseram Lula na Presidência
da República.
Eleição difere de pesquisa. Enquanto as pesquisas, como as
partidas de futebol, produzem
resultados, as eleições produzem
mandatos. Essa característica
essencial da consulta popular
vale tanto para Lula com suas
estrelas vermelhas como para os
republicanos do presidente
George W. Bush na eleição de
hoje. Os americanos entendem
isso. No Brasil, infelizmente, o
andar de cima ainda não entendeu que, uma vez eleito, o presidente da República está de posse
de um mandato para fazer o
que disse que faria. Nada, senão
a malversação de sua própria
palavra, manda que ouça do
andar de cima o que deve ou
não deve fazer.
O pacto da Fiesp nasce velho,
manco e cego. Velho porque Piva já propôs coisa semelhante
em 1998, numa situação bem
mais embaraçosa, sem falar em
congelamento de salários. Manco, porque se o empresariado
vai para a mesa pensando em tirar impostos das costas e salários das folhas, não encontrará
quem esteja disposto a levar a
conversa a sério. Cego porque
finge que não vê o Congresso
Nacional, foro adequado para
os debates da da vida pública
nacional. Conversas de pacto,
mesmo com as melhores das intenções, cheiram a demagogia e
malandragem antilegislativa.
No centro da argumentação
do doutor Piva está o registro
das dificuldades do país. É o
mandato da crise. Do governo
FFHH, que com sua ekipekonômica arruinou a nação. Da banca, que se fartou. Do empresariado, que não teve o desassombro de Piva ao criticar sistematicamente os juros altos e a república do papelório. Nove em cada dez grandes empresários preferiram reclamar do governo
jantando no Alvorada. (FFHH
brindava os convidados com
um número que aprendeu com
Bill Clinton: mostrava-lhes o banheiro, deslumbrando-os, pois o
Alvorada tem mictório na sala
masculina.)
O presidente da Fiesp argumenta, com lógica: "O melhor é
ter um ano ruim para três
bons". Como raciocínio nada
melhor. Como prática, um horror, Desde 1995 a ekipekonômica repete esse argumento e a cada ano ruim sucedeu-se outro
ano ruim. Em 1999, quando o
presidente do Banco Central,
Armínio Fraga, projetou os fundamentos teóricos de um crescimento de 6% (coisa que está fazendo de novo), Piva riu-se:
"Precisaremos estar vivos até o
médio prazo para conseguirmos
aproveitar esse crescimento."
Na mosca. Na projeção de Armínio, a choldra tinha que esperar, aguentando o desemprego.
No pacto da Fiesp a coisa vai
pior: fica o andar de baixo desempregado e quem tiver emprego pode ter seu salário congelado.
Disse o doutor Piva no início
de outubro que Lula deveria
"controlar os ímpetos dos seus
correligionários".
Terrível tarefa a de Lula, controlar os ímpetos dos companheiros da Fiesp.
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