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São Paulo, sábado, 06 de dezembro de 2003

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RORAIMA

Polícia suspeita que ex-integrantes do governo Flamarion Portela teriam recebido salários de servidores "fantasmas"

Fraudador recebia até restituição do IR

JAIRO MARQUES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BOA VISTA

Dois ex-integrantes do governo Flamarion Portela (PT) e um deputado estadual de Roraima são investigados por suspeita de terem feito declarações de Imposto de Renda e recebido a restituição do imposto em nome de funcionários "fantasmas", de acordo com a força-tarefa que investiga o "escândalo dos gafanhotos".
As três autoridades também receberiam parte do salário desses funcionários, conhecidos como "gafanhotos" (uma vez que "comiam" a folha de pagamentos). De acordo com as investigações da força-tarefa, os "gafanhotos", cerca de 5.500, passavam procurações para cerca de 60 pessoas que agiam em nome de 30 autoridades -entre ex-deputados, atuais parlamentares e outros.
Os procuradores receberiam os salários (de R$ 400 a R$ 4.000) do governo, que eram pagos por uma empresa privada, e repassariam de R$ 100 a R$ 400 ao "gafanhoto". O restante seria entregue às autoridades que conseguiam colocar os nomes dos "fantasmas" na lista de servidores estaduais numa tabela especial.
Em depoimentos à força-tarefa (da Polícia Federal e dos Ministérios Públicos Federal e Estadual) aos quais a Agência Folha teve acesso, "gafanhotos" declararam ter ficado "surpresos" quando tentaram fazer as declarações de isento do Imposto de Renda ou quando tentaram recadastrar o CPF (Cadastro de Pessoas Físicas). Eles descobriram que os procedimentos legais já haviam sido realizados e que inclusive existiam valores do Imposto de Renda a serem restituídos.

Ex-deputados
Os depoentes seriam ligados, de acordo com a força-tarefa, ao ex-diretor da Polícia Judiciária do Estado Ângelo Paiva, que está preso, e à ex-secretária da Articulação Municipal Vera Regina, ambos também ex-deputados e exonerados na semana passada, e ao atual parlamentar Jalser Renier (PFL).
O que a perícia da Polícia Federal levantou, com base em documentos fornecidos pelo próprio governo ou apreendidos durante as investigações, é que sobre os vencimentos dos gafanhotos não havia incidência de tributos ou mesmo de contribuições, o que, por si só, anularia qualquer operação com a Receita Federal.
O que ainda não se sabe é como era deduzido o valor que teria sido pago para a Receita Federal e como o dinheiro da restituição do Imposto de Renda teria ido parar nos bolsos dos envolvidos.

"Gafanhotos"
A doméstica Raimunda Batista Filho, 38, mãe de três filhos pequenos, afirma em depoimento que descobriu que seu nome havia sido usado duas vezes: uma, quando ela soube que era funcionária do Estado, recebendo R$ 2.000; a segunda vez, quando ela foi fazer sua declaração de isenta do IR e soube que o procedimento de declaração do imposto já havia sido realizado.
"Eu recebia R$ 100 por mês, mas pensava que era porque eu tinha trabalhado na campanha da Vera Regina. Levei um susto quando a filha de um vizinha, que foi fazer fazer o negócio com o meu CPF [declaração de isenta] me falou que tudo já tinha sido feito e que tinha até dinheiro pra receber", declarou a doméstica à Agência Folha. Ela afirma que não sabe onde foi parar o dinheiro.
A depoente Maria Zilda Correia, que seria "gafanhoto" do deputado Jalser Renier (PFL), declarou que teve sua declaração de imposto feita por uma pessoa ligada ao parlamentar e que "descobriu" que tinha direito a receber R$ 1.000.
Outra que teria tido seu nome usado duplamente é a costureira Maria do Amparo de Oliveira, 40, que também prestou depoimento. "Imagina que morando nesta casa [ainda em construção em um bairro pobre de Boa Vista, capital do Estado] eu tivesse dinheiro para receber do governo [a restituição do Imposto de Renda]", afirmou à Agência Folha.


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