São Paulo, sábado, 07 de janeiro de 2006

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ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ VALERIODUTO

Executivo de estatal acusa senador tucano de quebrar decoro ao revelar dados de auditoria do TCU sobre contrato do banco com o BMG

Relatório é "ilação política", diz vice da Caixa

RUBENS VALENTE
ADRIANO CEOLIN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O vice-presidente de Finanças e Mercado de Capitais da Caixa Econômica Federal, Fernando Nogueira, chamou ontem de "ilação política" o relatório da Secretaria de Controle Externo do TCU (Tribunal de Contas da União) que apontou suposto favorecimento da Caixa ao banco mineiro BMG -uma das fontes dos empréstimos supostamente tomados por Marcos Valério de Souza para financiar o "valerioduto".
Nogueira atacou a divulgação do relatório, sob alegação de que é sigiloso. Afirmou ver "interesse político" na atuação do senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que solicitou ao TCU e ao Ministério Público investigações sobre o negócio Caixa-BMG.
O senador rebateu as críticas feitas pelo vice-presidente da Caixa de que teria quebrado o decoro parlamentar ao promover as denúncias. "Eu não quebrei o decoro. A corrupção é que afronta qualquer cidadão", completou.
O vice-presidente da Caixa afirmou, em entrevista coletiva, que "eles", supostamente os tucanos, visariam "voltar ao poder" com a intenção de "privatizar os bancos públicos".
"Acho que há pessoas que interpretam que os bancos públicos não têm papel tão relevante como de fato têm na história do nosso país", disse Nogueira.
Em resposta, o senador divulgou o seu projeto de lei nš 263/99, que, pelo contrário, exclui a Caixa, o Banco do Brasil e outras empresas estatais de possíveis processos de privatização.
A análise técnica do TCU, divulgada na quarta-feira pela Folha, apontou irregularidades na compra, pela Caixa, da carteira de crédito consignado (com desconto na folha de pagamento) do BMG.
Ontem, a Caixa informou que já foram pagos R$ 163,9 milhões a título de lucro ao BMG.
Nogueira criticou o relatório do TCU: "Acho que existem erros conceituais, erros de desconhecimento da causa e erros de interpretação de pareceres internos. Não buscou o testemunho verbal dos servidores da Caixa que participaram da negociação. Agora, tudo isso é preliminar".
Ele revelou que outro acordo "semelhante" foi fechado no fim de 2005 com o Banco Mercantil do Brasil. Mas se recusou, sob alegação de sigilo comercial, a revelar o valor e a taxa do ágio pago pela Caixa, o valor global da transação e todos os documentos sobre a negociação -o que permitiria uma comparação com as bases do acordo com o BMG.
Nogueira afirmou que a decisão de alterar a forma de pagamento dos lucros do BMG (de a prazo, conforme decisão do Conselho Diretor da Caixa, para à vista, segundo nova decisão dois meses depois) foi tomada "oralmente" durante reuniões que o conselho teria mantido entre uma e outra decisão formalizada por escrito.
Nos documentos obtidos pelo TCU da própria Caixa, não há registro dessas decisões "orais". Após a entrevista, a Folha indagou por escrito se a Caixa poderia dar acesso às fitas que gravaram tais conversações. A assessoria da Caixa respondeu: "Conforme foi informado durante a entrevista, as reuniões do Conselho Diretor da Caixa têm caráter privado".
"Devido à necessidade de fecharmos a operação, este ponto foi discutido com o Conselho Diretor, que aprovou o pagamento à vista e sua retificação aconteceu a posteriori visando formalizar por escrito a questão", acrescentou.
Outro ponto questionado pelo relatório do TCU foi a celeridade para o fechamento do acordo (23 dias). Nogueira usou uma carta enviada pelo próprio BMG para afirmar que o banco mineiro levou seis dias para vender uma carteira de crédito consignado para o banco Itaú. Indagado se o Itaú havia feito uma auditoria antes do acordo e se a Caixa conhecia os detalhes do contrato (como o lucro pago, por exemplo), ele disse que os dois bancos é que deveriam elucidar esses detalhes. Anteontem, o BMG informou à Folha que o Itaú realizou auditoria na carteira antes da compra.
O presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral (PT-MS), afirmou ontem que pretende reunir-se com o ministro do TCU Ubiratan Aguiar para saber detalhes do relatório.
"Precisamos saber o que aconteceu. Porque temos de olhar isso com rigor. A burocracia da Caixa costuma não deixar passar irregularidades desse tipo", disse.
Ele descartou uma suposta ação oposicionista para destruir a imagem da Caixa com o objetivo de privatizá-la. "Isso seria, no mínimo, uma sandice. Eu acho politicamente impossível. Duvido que qualquer presidente da República tenha coragem de fazer isso."


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