São Paulo, quinta, 7 de janeiro de 1999

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CELSO PINTO
Um subsídio bilionário

O que alguns governadores chamam de acordo draconiano e impagável para as dívidas estaduais, feito com Brasília, é um acerto que implica um subsídio colossal a ser pago pelos contribuintes.
Um banco calcula que o subsídio implícito apenas no acordo com São Paulo equivale a cerca de 43% do valor da dívida renegociada, de R$ 50,4 bilhões. Quer dizer, R$ 21,6 bilhões, se trazido a valor de hoje.
Como a dívida paulista representa quase a metade da dívida total a ser renegociada com os Estados, e as condições são mais ou menos uniformes, o subsídio implícito na renegociação total pode equivaler a mais de R$ 40 bilhões, a valor presente.
O que isso quer dizer? Que, se o governo quisesse liquidar de uma vez a dívida renegociada por 30 anos, considerando os juros que os Estados pagarão neste período e a estimativa de quanto o governo federal pagará, o subsídio chegaria a 43% do total.
Isso não significa que seja simples para os Estados pagar suas dívidas. Mostra, contudo, que a renegociação já representa, graças às taxas de juros astronômicas, um extraordinário subsídio fiscal. A ser pago por todos, inclusive pelos contribuintes dos Estados que fizeram, com sacrifício, seu ajuste fiscal.
Existem várias maneiras de olhar os subsídios implícitos na negociação. Um deles vem da diferença entre o valor da dívida considerada no acordo e seu valor quando ele entrou em vigor. No caso de São Paulo, por exemplo, a dívida considerada foi a de março de 97, de R$ 46,6 bilhões, mas o acordo só valeu a partir de novembro de 97, quando a dívida já era de R$ 50,4 bilhões.
Essa diferença de R$ 3,8 bilhões foi um subsídio de partida. No total dos Estados, este subsídio de partida chegou a R$ 13 bilhões, como mostrou a Folha ontem.
Esta, contudo, é apenas a ponta do iceberg dos subsídios. Os Estados pagam juros de 6% acima da inflação, enquanto o governo federal pagou, ano passado, 27,6% acima da inflação pelos seus papéis.
Essa diferença de custos significou que, de novembro de 97 até o início deste ano, o governo federal já acumulou um subsídio efetivo de R$ 15 bilhões, ou 30% do total da dívida paulista de R$ 50,4 bilhões, nos cálculos do banco.
Esse é o estrago já feito pela vida real. Para imaginar qual será o estrago total, se o acordo for cumprido à risca nos 30 anos, é preciso projetar qual será o juro pago pelo governo federal no período. Além disso, é necessário considerar duas coisas: que São Paulo amortizou R$ 6,2 bilhões em 98 e que amortizará uma pequena parcela a cada mês, num esquema tipo "tabela price".
Esse banco projetou juros reais de 20,7% para a dívida federal este ano; 15,7% para 2.000; 12% para 2.0001; 9,4% para 2.003 e 6,9% daí por diante. Uma projeção conservadora.
Usando esses juros, dá para calcular, ano a ano, quanto falta São Paulo pagar pela dívida e quanto o governo federal terá de pagar para refinanciá-la. No final dos 30 anos, São Paulo teria pago toda sua dívida, enquanto Brasília teria acumulado uma dívida de R$ 222 bilhões, fruto dos papéis que teria de emitir, ao longo de 30 anos, para cobrir o subsídio implícito dos juros.
Para bancar a renegociação das dívidas estaduais, o governo federal terá de se endividar tanto mais quanto mais alto for o juro que ele pagará nos próximos anos. Se quisesse liquidar toda essa conta já, considerando o custo futuro da renegociação para ele e para os Estados, o governo federal teria de desembolsar algo próximo a todo o buraco estimado da Previdência, pública e privada, em 98, de R$ 42 bilhões.
Para alguns Estados, como os gastos com pessoal chegam a 80% ou 90% da receita líquida, pagar outros 13% da receita para honrar a renegociação da dívida junto a Brasília exigiria cortes drásticos e difíceis. O mais fácil é tentar, mais uma vez, repassar a conta para Brasília, mas a conta, como se viu, já é enorme.
No caso de Minas, se Brasília quiser, não haverá prejuízo. O que Minas teria a pagar, este ano, calcula o banco, é algo parecido (R$ 1 bilhão) ao que teria a receber em repasses federais. Como o acordo permite que Brasília retenha repasses dos Estados caloteiros, basta ter vontade política. A conferir.




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