São Paulo, terça-feira, 07 de março de 2006

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RETRATO DO BRASIL

Estudo do Bird mostra que país foi da 2ª para a 10ª posição, a melhor colocação em duas décadas e meia

Brasil melhora em ranking da desigualdade

GUSTAVO PATU
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Depois de ocupar o posto de vice-líder mundial em desigualdade social, o Brasil aparece em décimo lugar na lista dos países com maior concentração de renda citada em estudo do Bird (Banco Mundial). Embora não seja exatamente um motivo de comemorações, é a melhor classificação em pelo menos duas décadas e meia.
"Ascensão e Queda da Desigualdade Brasileira" é o título do trabalho, publicado neste mês para tratar da evolução da concentração de renda no país desde os anos 80. Sua conclusão é: "Embora ainda muito alta pelos padrões internacionais, a desigualdade brasileira não é imutável".
O estudo aponta que a concentração da renda nacional cresceu até chegar a seu ponto máximo em 1989, no ensaio de hiperinflação do final do governo José Sarney (1985-1990). Depois de um período de oscilação, segundo o Bird, vem caindo de forma quase contínua desde 1993, assim como os níveis de pobreza.
A desigualdade é medida pelo índice de Gini, que varia entre dois extremos hipotéticos: de zero, uma situação em que todos os habitantes teriam a mesma renda, a 1, o que significaria toda a renda do país com uma única pessoa.
De 1981 a 1989, o índice de Gini brasileiro subiu de 0,574 a 0,625, deixando o país praticamente empatado com a então campeã mundial da desigualdade -Serra Leoa e seu 0,629.
Em 2004, depois de 11 anos em tendência de queda, o índice chegou a 0,564, atrás de nove países, segundo os dados mais recentes à disposição do Bird. Nessa relação só há países africanos e latino-americanos, e apenas a África do Sul tem uma economia razoavelmente desenvolvida.
O próprio trabalho faz ressalvas ao ranking e aponta as dificuldades de comparação entre as economias: metodologias e anos de coleta dos dados variam de país para país -Serra Leoa, por exemplo, está fora da lista pela ausência de estatísticas recentes.
Mas a melhora da colocação brasileira ajuda a mostrar, como argumenta o texto, que a "desigualdade [do país] tem sido menos estável do que às vezes se diz". Trata-se de uma referência, explicitada em nota de rodapé, a trabalhos como "A Estabilidade Inaceitável: Desigualdade e Pobreza no Brasil", dos pesquisadores Ricardo Paes de Barros, Rosane Mendonça e Ricardo Henriques -este, um dos idealizadores do programa Bolsa-Família.

Causas e méritos
Mais complicado é estabelecer as causas da queda da desigualdade e da pobreza, cujos méritos são disputados pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva e seus antecessores tucanos da gestão de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), com os habituais exageros dos embates políticos.
A partir dos dados disponíveis, avalia-se que é razoável admitir a influência do controle da inflação pelo Plano Real, principal marca dos anos FHC, e dos programas oficiais de transferência de renda, ampliados pelos petistas.
Conforme a Folha noticiou anteontem, dados indicam que o mercado de trabalho respondeu por cerca de três quartos da melhoria, enquanto os programas de transferência de renda fizeram o restante do trabalho.
O documento do Bird aponta quatro outras hipóteses para estudo: a menor desigualdade de rendimentos entre pessoas de diferentes escolaridades; entre áreas rurais e urbanas; entre diferentes raças; e maior foco das políticas sociais nos mais pobres.
A primeira possibilidade recebeu mais atenção, uma vez que, segundo o estudo, as disparidades entre os grupos mais e menos escolarizados explicam pelo menos um terço da concentração de renda no país. Aponta-se que, de 1993 a 2004, caiu a vantagem dos mais escolarizados no mercado de trabalho. E, sem concluir, o texto pergunta se isso caracteriza um sucesso -maior oferta de trabalhadores qualificados- ou um fracasso -a demanda insuficiente por inovação tecnológica.


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