São Paulo, domingo, 7 de junho de 1998

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Juiz decide sorte do jogo da Tele Sena

XICO SÁ
da Reportagem Local

A sorte de Silvio Santos, que conseguiu aprovar junto ao governo federal uma loteria como se fosse um plano de capitalização, pode estar com os dias contados.
O processo contra o funcionamento da Tele Sena, o jogo que tem faturado R$ 500 milhões por ano, em média, deve ser julgado ainda neste semestre pelo TRF (Tribunal Regional Federal).
Segundo a "CPI da Jogatina", aberta na Assembléia Legislativa de São Paulo para investigar jogos de azar, esse faturamento da Liderança Capitalização, firma de Santos que administra a Tele Sena, é obtido com o emprego de apenas 150 pessoas.
Uma empresa com faturamento equivalente possui, em média, entre 2.000 e 2.500 funcionários. "Esse dado mostra a disparidade entre o mercado e a Liderança, que funciona sob proteção oficial", diz o deputado José Carlos Tonin (PMDB), presidente da CPI.
O dono do SBT já sofreu uma derrota no caso, em julgamento de primeira instância ocorrido no ano passado. Silvio Santos recorreu à Justiça contra a decisão.

Governo Collor

A novela teve início durante o governo Collor, em 1991, quando o apresentador conseguiu aprovar junto a órgãos do Ministério da Fazenda a sua loteria como se fosse um plano de capitalização.
Ao aplicar o seu dinheiro em um plano desse tipo, o cliente teria a garantia, conforme dita a lei, de retorno total, com juros e correção monetária, ao final de um período de um ano. Independentemente de sorteios.
Não é o que ocorre com Tele Sena. Logo no ato da compra do bilhete, por R$ 3, o cliente-telespectador deixa a metade para a loteria, a pretexto de despesas administrativas com o jogo.
Depois de um ano, os R$ 3 investidos valem, incluindo juros e correção, R$ 1,62 para o comprador da Tele Sena. Ele pode juntar mais R$ 1,40 e trocar por um novo bilhete, voltando a engordar o negócio do SBT.
Para sorte de Silvio Santos, um grande número de clientes simplesmente esquece ou desiste de ir cobrar o que tem direito (o já citado valor de R$ 1,62).
Nesse caso, o dinheiro volta para a "banca", a Liderança. Segundo o presidente da CPI, a empresa já amealhou cerca de R$ 300 milhões com os tais clientes "esquecidos".

"Descapitalização"

A "descapitalização" de 50% do dinheiro "investido" pelo cliente foi permitida oficialmente pela Susep (Superintendência de Seguros Privados), órgão vinculado ao Ministério da Fazenda.
Diretores de planos de capitalização do Banco do Brasil, Itaú e Bradesco, todos ouvidos pela CPI, informaram que são obrigados a devolver, com juros e correção monetária, todas as aplicações feitas pelos clientes.
Esses planos mantidos pelos bancos também promovem sorteios. A diferença é que a chance de ganhar, segundo documentos da CPI, é também maior do que na loteria da Tele Sena.
A possibilidade de ser premiado com os bancos é de uma a cada 99.999. Não é fácil. Mas, no jogo do SBT, a chance de receber sozinho o badalado "bolão" de R$ 300 mil é ainda muito mais remota: uma em cada 3.365.855.

A sentença

No julgamento em primeira instância, o juiz João Batista Gonçalves, da 6ª Vara Federal de São Paulo não poupou a Tele Sena:
"Desafia a lógica do razoável que uma empresa coligada a uma rede nacional de televisão, através (sic) de um jogo de loteria que se apresenta de forma dissimulada, possa sorver a economia do povo que se encontra no limite da sobrevivência".
O processo contra a Tele Sena começou com uma ação popular encaminhada pelo advogado Luiz Nogueira, a pedido do presidente da CPI , em 1991.
A Folha tentou falar com Silvio Santos e com os diretores da Liderança Capitalização desde sexta-feira da semana passada. Eles não responderam aos três telefonemas feitos diariamente.
Informaram, por meio de funcionários do grupo, que não iriam falar sobre o caso. Convocados pela CPI, não compareceram.



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