São Paulo, domingo, 7 de junho de 1998

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PAÍS DO JOGO
No total são 11 bancas, que fazem as três extrações diárias nas dependências da loteria do Estado, a Lotep
Bicho tem apoio oficial do governo da PB

da enviada especial a João Pessoa

Onze senhores da sociedade paraibana ostentam publicamente o título de banqueiros do jogo do bicho em João Pessoa, atividade não só permitida, mas até apoiada pelo governo do Estado.
O jogo do bicho é oficialmente proibido em todo o país. Segundo o Código de Contravenções Penais, o infrator deve ser punido com prisão de três meses a um ano, além de multa. Na Paraíba, porém, está liberado desde a gestão do ex-governador João Agripino Maia (1966-71).
Instado pelo governo federal a reprimir os contraventores, Maia disse que acabaria com o jogo se a União lhe arrumasse 4.000 empregos para os cambistas.
Como os empregos não apareceram, o governo estadual organizou o jogo e fixou as regras para seu funcionamento.
As três extrações diárias são feitas nas dependências da loteria estadual, a Lotep, e os resultados dos sorteios são anunciados pela Rádio Tabajara, emissora oficial do governo paraibano.
O relacionamento Estado/jogo do bicho é tão explícito que os contraventores têm uma espécie de concessão informal da Lotep para explorar a atividade, sem serem importunados pela polícia.
Cada banca de jogo do bicho contribui com uma taxa mensal para a Lotep.
Os bicheiros da capital depositam R$ 4.000 por mês para a loteria estadual e o pagamento é feito no Banco do Brasil.

Cúpula
Na última terça-feira, a reportagem da Folha fez entrevista inédita com a cúpula do jogo do bicho de João Pessoa que, em seguida, posou para fotos na sede da Lotep.
As 11 bancas de jogo de João Pessoa ÄMonte de Ouro, Bandeirante, Milionária, Federal, Casa da Fortuna, Monark, Tesouro da Sorte, Sempre Viva, Soberana, Primavera e FavoritaÄ formam uma associação chamada Paratodos, que centraliza a arrecadação e garante o pagamento dos prêmios.
No final do mês, a associação distribui o lucro apurado entre os banqueiros. O presidente e os diretores da Paratodos cumprem expediente comercial e são remunerados pelo trabalho na entidade. Entre os bicheiros estão fazendeiros, comerciantes e até um vereador: João Gonçalves, do PPB.
Exemplo
Criada em 1987, a Paratodos é presidida pelo advogado Geraldo Gomes de Lima, dono da banca Federal. Ele diz que os banqueiros do bicho da Paraíba formam "uma grande família unida" e poderiam servir de exemplo para os demais Estados.
"Aqui vivemos em paz. Como o jogo é liberado, não há repressão policial nem pagamento de propina à polícia. Não nos envolvemos com droga e não existe briga por pontos de bicho. Temos um código rígido. Se um banqueiro não honra seu compromisso, o expulsamos. Não chegamos a ser um Rotary Clube, mas estamos perto disso", afirma Geraldo Lima.
O presidente da associação Paratodos diz que as bancas de bicho empregam 5.000 cambistas (anotadores de apostas) em João Pessoa, trabalhando na condição de autônomos.
"Eles não têm carteira assinada porque o governo não reconhece a atividade do banqueiro nem a do cambista", afirma.
INSS
Um dos mais antigos banqueiros de bicho de João Pessoa, Rubens Falcão, dono da Milionária, diz que para recolher a contribuição para o INSS, a maioria das mulheres cambistas tiram registro de autônomas como manicure, enquanto a maior parte dos homens se registra como pedreiro ou auxiliar de pedreiro.
O cambista recebe 10% do valor das apostas que captar.
O relacionamento do Estado com o jogo do bicho é feito pela loteria estadual. Paulo Barreto, diretor-superintendente da Lotep, diz que o jogo é praticado sem qualquer repressão nos 143 municípios do Estado.
(ELVIRA LOBATO)



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