|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Sanguessugas assediaram hospital do Rio por compras
Diretores do Darcy Vargas foram pressionados a aderir ao esquema, mas resistiram
Entidade filantrópica de Rio Bonito, que comprou três ambulâncias, foi procurada por três deputados do PL acusados de integrar máfia
SERGIO TORRES
ENVIADO ESPECIAL A RIO BONITO (RJ)
Um exemplo do modo de
operação dos sanguessugas da
saúde ocorreu na cidade de Rio
Bonito (a 75 km do Rio), onde,
por dois anos, a direção do Hospital Darcy Vargas resistiu a investidas de políticos hoje acusados de integrar o esquema.
Em 2003, o hospital, que é filantrópico, soube que o Fundo
Nacional de Saúde cadastrava
pela internet unidades médicas
interessadas em comprar ambulâncias e aparelhos.
Segundo diretores do hospital, o aviso foi dado por um homem que dizia ser assessor do
deputado federal Francisco
Dornelles (PP-RJ). Ele teria se
oferecido para cadastrar o hospital, caso fossem apresentados
projetos de compra.
A direção preparou dois projetos. Um, de R$ 320 mil, tratava da aquisição de três ambulâncias UTI. O segundo, de
R$ 300 mil, detalhava a compra
de equipamentos médicos.
Feito pelo suposto representante de Dornelles, o cadastro
foi aprovado. Em 2004, o Ministério da Saúde depositou a
verba para o hospital, que deveria providenciar as compras. O
assédio político começou aí.
Os diretores contam que,
dias depois do depósito, receberam ligação do deputado federal Carlos Nader (PL-RJ),
que parabenizou a direção.
O próximo contato foi do deputado federal Reinaldo Gripp
(PL-RJ). Sem aviso, foi ao
Darcy Vargas com um amigo, a
quem apresentou como vendedor de equipamentos. Ao amigo, os diretores disseram para
comprar o edital. Antes de sair,
Gripp disse que não era necessária a licitação por tratar-se de
unidade filantrópica.
Após alguns dias, chegaram
ao hospital duas mulheres que
diziam representar a bancada
fluminense do PL na Câmara.
Falaram que a compra não poderia ser feita por licitação porque a bancada já gastara R$ 20
mil para aprovar os projetos.
Coube ao então deputado
Bispo Rodrigues (PL-RJ) o
contato seguinte. Nenhum diretor quis atender ao telefonema. Àquela altura, achavam
que a verba seria retirada. Tinham acertado que não se envolveriam em falcatruas.
Semanas depois, a direção recebeu a visita de um conhecido
da região. Ex-funcionário da
Prefeitura de Rio Bonito,
Nylton Simões Filho apresentou-se como representante da
Planam, fornecedora de ambulâncias e suposta líder da máfia.
Ele trazia um modelo de edital. Disse que, para ter as ambulâncias, o hospital teria que seguir o modelo. Caso insistissem
em não aderir ao esquema, os
diretores seriam responsabilizados pela quebra de um hospital de 45 anos. "Vocês nunca
mais terão um tostão de Brasília", ameaçou, segundo o relato
dos diretores à Folha.
A direção insistiu nas concorrências. Para ter respaldo
legal, convidou o promotor da
cidade para a comissão de licitação e conseguiu que o evento
fosse na sede local da Justiça.
Doze empresas se habilitaram, entre elas a Planam. A escolha foi por menor preço. A
Planam ganhou uma concorrência. Ofereceu R$ 82 mil por
uma ambulância furgão, contra
R$ 85,27 mil da segunda colocada. As outras duas foram fornecidas pela NV Rio. A Planam
concorreu e perdeu, por ter
oferecido preços mais altos.
A peça final da resistência foi
a assinatura do contrato. A Planam não queria enviar representante. Pediu que o contrato
seguisse por correio. A direção
se recusou. A contragosto, Luiz
Antônio Vedoin foi a Rio Bonito. As ambulâncias chegaram e
estão atendendo à população
de Rio Bonito -52.015 habitantes em 2004.
Um detalhe da história foi
lembrado com ironia pelos cinco diretores que, na quarta-feira, contaram à Folha como resistiram ao esquema. Ao liberar o dinheiro, o Ministério da
Saúde convocou reunião no
Rio, com representantes de
instituições beneficiadas. Conduziu o encontro o então chefe
da fiscalização, Jairo Langoni.
Em 4 de maio passado, a Justiça de Mato Grosso mandou
prender 54 acusados de agir no
esquema sanguessuga. Langoni
era um dos presos.
Texto Anterior: Alta: Ex-juiz Nicolau dos Santos Neto sai do hospital Próximo Texto: Outro lado: Deputado nega saber de alerta e se recusa a falar Índice
|