São Paulo, quinta-feira, 07 de dezembro de 2000

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GOVERNO

Ex-diretor conta como agência recebe, filtra e repassa informação de fontes

Abin paga informações e dados com verbas secretas

WILLIAM FRANÇA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os informantes, colaboradores ou consultores que prestam algum tipo de serviço ou alimentam os agentes da Abin (Agência Brasileira de Informações) com dados e informações são pagos com as verbas secretas previstas para "ações de caráter sigiloso" da agência.
A afirmação foi feita pelo ex-diretor-geral da Abin, Ariel de Cunto, em seu depoimento ao Ministério Público, anteontem.
"As fontes humanas são sempre remuneradas e apenas excepcionalmente não o são", disse De Cunto.
O Orçamento da União para o próximo ano prevê gastos de até R$ 3,943 milhões para as ações secretas da Abin. Segundo De Cunto, pagar pelas informações é a forma encontrada pela Abin de manter essas fontes "sob o controle da instituição".
Segundo seu raciocínio, ao receber pelo serviço a fonte se torna ligada à agência e não à pessoa que o contacta. O ex-diretor da Abin afirmou que não podia dizer o valor pago às fontes.
O procurador da República em Brasília Guilherme Schelb, um dos que acompanhou o depoimento, afirmou que não há ilegalidade no fato de a Abin pagar pelas informações.

Esquema
De Cunto revelou aos procuradores como funciona o esquema usado pela Abin para receber, filtrar e repassar as informações repassadas pelas "fontes humanas", que representam entre 5% e 10% das atividades do serviço de inteligência.
Há vários níveis de segurança e de sigilo e, pelas regras atuais, aqueles que ocupam graus superiores na hierarquia da Abin não sabem quem são os geradores da informação.
"As fontes humanas são sempre secretas", afirmou.
O esquema funciona assim:
1) A Abin contacta pessoas que possam trabalhar para a instituição, sem contudo pertencerem a ela;
2) Elas são classificadas em três categorias: informantes (detêm um nível ou volume de informação menor ou menos relevante), colaboradores ou consultores (têm conhecimento especializado, como um físico, engenheiro ou economista);
3) É feita uma seleção das pessoas que podem ser contactadas, dentro dos temas que interessam, pela Diretoria de Fontes Humanas da Abin. As fontes ganham um codinome, pelo qual passam a ser identificadas internamente;
4) Quem fez a seleção ou contato com a fonte não mais participa do processo seguinte, que é a operacionalização;
5) A operacionalização é feita por um controlador, que aciona a fonte quando necessário, recebe informações e avalia constantemente a fonte. Esse controlador sabe o nome real da fonte, mas desconhece o seu codinome.
"Quem tem o conhecimento direto com a fonte humana não conhece o codinome dela e, por sua vez, quem tem o conhecimento do código não conhece a identidade real da fonte humana", afirmou De Cunto.
Segundo ele, cabe ao controlador fazer o pagamento da fonte, cuja contabilidade é controlada pela Secretaria de Controle Interno da Abin -também em caráter sigiloso.

Fonte não-institucional
Para De Cunto, a Abin não pode aceitar uma fonte humana não oficializada e só pode pagar para aqueles aprovados pela diretoria específica.
Ele disse, no entanto, "que não pode assegurar, matematicamente", que não existam fontes não-institucionais.
O ex-diretor da Abin disse que a descoberta de uma fonte não-institucional resulta "em consequências muito graves", como a abertura de sindicância interna investigatória ou mesmo uma ação de contra-inteligência sobre o caso.


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