São Paulo, domingo, 07 de dezembro de 2008

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40 ANOS DO AI-5

Com pressão a 22, Costa e Silva pôs médico na ante-sala da "missa negra"

Rondon Pacheco afirma que não houve clima para debates na reunião decisiva

DA ENVIADA A UBERLÂNDIA (MG)
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM UBERLÂNDIA (MG)

Momentos antes da reunião do Conselho Nacional de Segurança que sacramentou o AI-5, a pressão do presidente Arthur da Costa e Silva estava nas alturas. Um médico ficou de prontidão na ante-sala, para qualquer emergência. Mas o presidente parecia querer mais motivos para preocupar os médicos, revela Rondon Pacheco, então chefe da Casa Civil do governo.
"Quando entrou na reunião, ele [Costa e Silva] ainda falou para mim: "Dr. Rondon, estou precisando da minha pressão a 21'", recorda Pacheco, que, naquele momento, acabara de informar o presidente que o ato ainda estava viciado.
Com a pressão a 22 por 13, Costa e Silva iniciou a reunião pedindo que cada um dos 23 integrantes do conselho dissesse "o que pensa e o que sente". Às 17h do dia 13 de dezembro de 1968 celebrou-se, ao som de sirenes, a "missa negra", como o jornalista Elio Gaspari, no livro "A Ditadura Envergonhada", definiu aquela reunião. Tudo para manter Costa e Silva no poder, segundo Pacheco.
O fim da cerimônia fora traçado pelo presidente, que bateu na mesa e disse que "a decisão estava tomada" antes de ouvir os ministros. Segundo Pacheco, não houve clima para debates ou troca de impressões: "Nós estávamos tão tensos".
Restava aos signatários do ato deixar a própria marca. Chama a atenção os votos dos três mineiros integrantes do Conselho de Segurança: quem não foi contra, foi moderado, ao contrário de ministros como Jarbas Passarinho (Trabalho), que mandou "às favas todos os escrúpulos de consciência" ao se posicionar a favor do AI-5.
O primeiro voto daquela reunião das 17h foi um "não". O vice-presidente Pedro Aleixo defendeu o estado de sítio em vez da aplicação do ato. Ele argumentou que dessa forma era possível prevenir, com uma medida constitucional, as "perturbações" que tiravam o sono do presidente e do ministro Gama e Silva (Justiça). Foi o único "não" daquela tarde.
Outros dois mineiros integrantes do conselho acompanharam a moderação do vice-presidente. O tradicional jeito mineiro de fazer política, dissimulado para uns, conciliador para outros, deu o tom de 3 dos 23 votos naquela sexta-feira 13.
Pacheco disse estar diante de uma encruzilhada. Não concordava com o ato, mas sabia que o governo não conseguiria dois terços do Congresso para votar o estado de sítio.
"Os mineiros foram os mais moderados", disse ele, que propôs também a vigência de um ano para o ato, sugestão descartada por Orlando Geisel, então chefe do Estado-Maior.
Outro mineiro, ministro Magalhães Pinto (Relações Exteriores) fez jus à fama. No fim de seu voto, disse que se sentiu mais constrangido assinando o AI-5 do que quando ajudou a deflagrar o golpe de 1964.
O ministro Gama e Silva (Justiça) foi o último a falar. O autor da primeira e mais radical versão do ato deveria ter falado, de acordo com o protocolo, antes de Magalhães Pinto. O presidente quebrou o cerimonial, deixando-o por último.
Segundo Pacheco, todos sabiam das idéias radicais de Gama e Silva. "A rescisão do habeas corpus foi idéia dele. O Pedro Aleixo se pôs contra. O Gama queria demitir todos os ministros do Supremo. É muito além do habeas corpus."


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