São Paulo, domingo, 08 de abril de 2001

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RUMO A 2002

Partido vê Lula como maior rival e tenta disputar discurso reformista

PSDB se articula para tomar bandeira ética do "novo PT"

FERNANDO DE BARROS E SILVA
EDITOR DE BRASIL

KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O PT será o grande adversário do PSDB nas eleições do ano que vem. E, para enfrentá-lo, será preciso que os tucanos retomem duas grandes bandeiras políticas que teriam sido apropriadas pelo partido de Luiz Inácio Lula da Silva: a defesa da ética e da moralidade administrativa, por um lado, e o compromisso com o reformismo social, por outro.
O diagnóstico do PSDB, que identifica no PT seu maior rival em 2002 e sugere os meios para abatê-lo pela terceira vez consecutiva nas urnas, foi feito durante a reunião de cúpula do tucanato, no último final de semana, em Belém (PA).
A portas fechadas, ministros, governadores e líderes do PSDB esboçaram pela primeira vez em conjunto um plano de ação pré-eleitoral. O resultado de mais de cinco horas de conversas, às vezes ásperas, veio a público num documento intitulado "PSDB: Partido da Ética e das Transformações".
Nele, além da defesa protocolar do adiamento do debate sobre 2002, os tucanos fazem um desagravo ao presidente Fernando Henrique Cardoso, exaltando sua "honestidade", e se comprometem a organizar seminários temáticos sobre a "questão urbana".
Nem Lula nem o PT foram citados no documento. Nenhum tucano também os mencionou em público após o encontro. Não era o caso. Mas foi neles, em Lula e sobretudo no novo PT, "light" e pragmático, que os tucanos pensaram de forma mais detida antes de redigir a sua peça programática visando a batalha de 2002.
Falou-se muito em Belém sobre o avanço do "novo PT" nas classes médias das grandes cidades. Esse avanço estaria simbolizado com clareza na eleição de Marta Suplicy à Prefeitura de São Paulo.
Por um lado, Marta venceu alavancada por um discurso contra a corrupção e a falta de ética. Por outro, deixou de lado o socialismo e outras bandeiras etéreas da esquerda tradicional, para se dedicar às questões que afligem o dia-a-dia da população: violência, desemprego, saúde etc.
Um dos tucanos presentes à reunião de Belém foi mais longe. Disse que o PT "está se transformando aos olhos da população naquilo que nós éramos antes de 94". Entenda-se: o partido da "ética e das transformações".
"É muito incômodo para o PSDB ser confundido com partidos que não priorizam a ética. Esse discurso e prática não podem ser monopólio de um partido, sobretudo o PT", diz o presidente da Câmara, Aécio Neves (MG).
O sinal de alerta acendeu no tucanato num momento delicado para FHC. A imagem de que o presidente é pelo menos conivente com o "mar de lama" em seu governo se difundiu na população. Até pesquisas encomendadas pelo Planalto atestaram isso.

Jogo anunciado
Enquanto o PT procura explorar o desgaste na imagem de FHC e ainda tenta ressuscitar a CPI da corrupção, derrotada pela operação abafa, o presidente e seus aliados partiram para o contra-ataque. O documento de Belém é apenas uma entre muitas ofensivas deflagradas pelo tucanato para limpar a imagem do governo.
O presidente saiu a campo pessoalmente para contestar, num tom exaltado que não costuma ser o seu, o "denuncismo irresponsável" de que estaria sendo vítima. Na batalha dos factóides, criou a Corregedoria Geral da União.
A guerra da ética, que ocupou o centro da política nacional com a conflagração da guerra envolvendo Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Jader Barbalho (PMDB-PA), já havia sido decisiva nas eleições municipais de 2000. Comentando à época o resultado do pleito, FHC disse que as urnas "revelaram profunda preocupação com a moralidade".
O PT, por sua vez, tinha o mesmo diagnóstico. Durante o segundo turno das eleições, antes da vitória de Marta, Lula publicou um artigo no jornal "Gazeta Mercantil". O título: "A honestidade como vantagem comparativa".
O texto foi distribuído pela cúpula petista com a recomendação de que orientasse as campanhas municipais. Detalhes: a expressão "vantagem comparativa" pertence ao jargão liberal; e o tema da "honestidade", içado ao primeiro plano da discussão política, sinaliza a inflexão pragmática do PT, moralizante e desideologizado.

Ser ou não ser
O dilema do PSDB, segundo algumas de suas principais lideranças, consiste em reconquistar sua boa imagem na opinião pública sem desfazer a aliança que sustenta o governo FHC.
Ao mesmo tempo em que acreditam que PMDB e PFL são parceiros necessários para manter a governabilidade e vencer a eleição de 2002, os tucanos avaliam que precisam se diferenciar dos aliados.
Enquanto o PSDB ensaia seus malabarismos em busca da imagem ética perdida, o governo FHC pretende investir agora em obras sociais voltadas aos pobres e miseráveis das grandes cidades.
O Planalto prepara um projeto que prevê a liberação de R$ 700 milhões até o fim do ano para ações de inclusão social em favelas do Rio, São Paulo e Salvador. É um complemento ao projeto Alvorada, voltado às populações miseráveis de locais que registram os piores índices de desenvolvimento humano (IDH) do país.
O novo projeto do governo inclui investimentos em saneamento, infra-estrutura e uma polêmica idéia de regularização da posse de terra nas favelas. Nos estudos do grupo formado para discutir o tema no Planalto, as favelas foram rebatizadas como "áreas subnormais". Coisa de tucano.
Além de esperar dividendos eleitorais pela atenção que pretendem dar às "áreas subnormais" das grandes cidades, os tucanos contam ainda com a rejeição de Lula, que vão explorar.
Na avaliação dos tucanos, mesmo reciclada, a imagem de Lula está longe de se ajustar às veleidades do novo PT: de ser um partido confiável para as classes médias.
O PSDB aposta que o calcanhar-de-aquiles de Lula continuará sendo a incapacidade de se mostrar ao público como alguém credenciado para gerir o país e preservar a estabilidade da moeda.


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