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CAMPO MINADO
Após reunião com Lula, ministros procuram lideranças dos sem-terra
Governo telefona ao MST e diz que invasões atrapalham
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente Luiz Inácio Lula da
Silva pediu ontem a ministros e
membros do PT com trânsito no
MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) que advertissem a cúpula da entidade de
que invasões de fazendas produtivas "prejudicam a causa da reforma agrária" e que "o governo não
aceitará pressões dessa natureza".
Essas foram expressões usadas
por um membro da cúpula do governo em conversa com a Folha.
Lula ficou contrariado com informações do próprio governo
que dão conta de que partiu da direção nacional do MST a ordem
para a invasão na segunda-feira
da fazenda da empresa multinacional Veracel Celulose, na Bahia.
Os ministros Luiz Dulci (Secretaria Geral), que faz a interlocução
do governo com os movimentos
sociais de modo geral, e Miguel
Rossetto (Desenvolvimento
Agrário), que negocia diretamente com o MST, dispararam telefonemas ao longo do dia para transmitir a mensagem de Lula.
Um membro do governo disse
que Lula viu com "estranheza" e
"surpresa" a invasão. Afirmou
que ela era contraditória com o
discurso do próprio MST, que
dissera na semana anterior que
seus inimigos não eram o governo
ou o agronegócio, mas os latifúndios improdutivos.
Na semana passada, o líder do
MST João Pedro Stedile disse que
os sem-terra iriam "infernizar"
no mês de abril. Dulci e Rossetto
entraram em campo, e Stedile recuou no discurso, afirmando durante depoimento à CPI da Terra,
no Congresso, que as melhores
palavras seriam "pressionar e
azucrinar". O governo prometeu
também na semana passada liberar R$ 1,7 bilhão para fazer a reforma agrária. No ano passado,
porém, o governo assentou pouco
mais da metade da meta de 60 mil
famílias. E mais, das 36,8 mil famílias que diz ter assentado, 27,5
mil receberam lotes vagos em
projetos antigos, que foram instituídos entre 1972 (governo Médici) e 2002 (gestão FHC).
No recado presidencial de ontem, foi dito que o governo jamais
desapropriará uma área como a
da Veracel, que apoiará a ordem
judicial de integração de posse,
que Lula avalia que o MST se desgasta com setores da opinião pública simpáticos ao movimento e
que atos assim atrapalharam um
governo aliado aos sem-terra.
Produtiva e com investimento
externo bilionário, a fazenda emprega na sede 2.000 pessoas. O
MST a invadiu e derrubou quatro
hectares de eucaliptos. A invasão
criou constrangimento ao presidente, que recebeu a direção da
empresa no ano passado, quando
foi anunciado que o investimento
seria de US$ 1,25 bilhão.
Lula decidiu reagir à invasão e a
outros fatos negativos (greve da
PF que já dura quase um mês e
reivindicação de militares por
reajuste salarial) a fim de não sofrer arranhão
na autoridade na seqüência de
dois meses de desgaste do caso
Waldomiro Diniz, ex-assessor da
Presidência flagrado em fita de
2002 pedindo propina e dinheiro
para campanha a um empresário
de jogos. Decidiu que cortará
ponto dos grevistas da PF e negocia no bastidor com os militares.
Em reuniões nos últimos dias,
Lula tem demonstrado preocupação com a confluência de tantos
fatos negativos e uma conseqüente queda de popularidade do governo, como apontaram as pesquisas mais recentes.
Já há pelo menos 56 invasões de
sem-terra no país. O governo, que
sabe que abril é tradicionalmente
um mês de invasões, alarmou-se
com a gravidade. Havia a avaliação de que a intensidade de invasões neste ano não seria diferente
da dos anos anteriores.
Em conversas com interlocutores, os ministros Dulci e Rossetto
negaram ter subestimado o MST
ou traçado cenário "róseo" para o
presidente. Afirmaram que um
ato como o da fazenda Veracel era
difícil de ser previsto.
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