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GOVERNO E IMPRENSA
Gushiken diz que critério não deveria ser "explorar contraditório"; para Lula, governo não pode pedir elogio
Ministro cobra "agenda positiva" da mídia
WILSON SILVEIRA
GABRIELA ATHIAS
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Em audiência ontem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva
com a Fenaj (Federação Nacional
dos Jornalistas) e representantes
de sindicatos da categoria de todo
o país, o ministro Luiz Gushiken
(Comunicação e Gestão Estratégica) afirmou que o critério da imprensa deveria ser a "agenda positiva", e não a "exploração do contraditório, que fomenta discórdias e conflitos de egos".
Lula discursou em seguida e
amenizou o tom da crítica, afirmando que o governo espera
construir uma "relação leal" com
os meios de comunicação e com
os profissionais de imprensa.
"Leal é a relação em que, em nenhum momento, o governo deve
pedir ao jornalista para falar bem
dele e, em nenhum momento, o
jornalista deve falar mal porque
quer falar mal. Se nós todos estivermos em busca da verdade e
apenas a verdade nos interessar,
seremos mais amigos, viveremos
num país mais tranqüilo e estaremos contribuindo para que a democracia seja verdadeira."
Ao criticar a imprensa, Gushiken disse que, "na etapa histórica
da comunicação de massa, a imprensa opera com o raciocínio
que é explorar o contraditório. Eu
penso que a exploração do contraditório, muitas vezes, pode fomentar discórdias e conflitos de
egos, quando na verdade são apenas disputas de idéias, o que é
normal num processo de debate".
O ministro destacou, então, a
necessidade de espaço a uma
agenda positiva: "No estágio brasileiro, acho que um critério importante é o da agenda positiva.
Acho que o povo brasileiro tem
necessidade de saber de empreendimentos positivos que a sociedade está oferecendo, seja por conta
de décadas e décadas de dificuldade que o país vem atravessando,
seja porque o cidadão precisa ver
o lado positivo das coisas". Para
Gushiken, a sociedade está ávida
por boas notícias. "Os leitores, telespectadores e ouvintes estão ansiosos para saber aquilo que germina em termos de coisas boas."
A Secretaria de Comunicação
distribuiu à noite uma nota sobre
o discurso do ministro, após a repercussão na internet. Segundo a
Secom, não houve e não há restrição ao trabalho crítico da imprensa. "A imprensa é fundamental
para que o governo reavalie eventuais erros e confirme acertos",
afirma a nota. Para a assessoria, o
ministro só criticou o fato de que,
em alguns momentos, "questões
menores são amplificadas".
A Secom afirma que o ministro
não se referiu à agenda do governo quando usou o termo "agenda
positiva". Segundo a nota, ele se
referia à agenda da sociedade.
A assessoria de Gushiken afirmou também que "certas divergências normais no governo recebem tratamento de conflito, discórdia ou falta de unidade, o que
não corresponde à verdade".
"Sobre o viés da mídia, que tem
dificuldade de ressaltar o positivo,
não há nenhuma crítica sobre o
papel institucional da imprensa:
criticar, fiscalizar e cobrar dos governantes ações que possam beneficiar o interesse coletivo. O que
há, nessa questão, como os próprios meios de comunicação indicam, por meio de suas pesquisas,
é um certo desgaste emocional,
um cansaço do leitor, ouvinte, telespectador, com uma carga intensa de informações negativas."
Conselhos
A audiência foi marcada para
ontem por ser o Dia do Jornalista.
Também participaram os ministros Ricardo Berzoini (Trabalho)
e Luiz Dulci (Secretaria Geral da
Presidência), além do secretário
de Imprensa do Planalto, Ricardo
Kotscho, e do porta-voz, André
Singer. Foram convidados ainda
jornalistas que cobrem o Planalto.
A Fenaj pediu a Lula que envie
ao Congresso projeto que cria um
conselho federal e conselhos regionais de jornalismo, assunto em
discussão no Ministério do Trabalho. O objetivo dos órgãos, segundo a presidente da Fenaj, Beth
Costa, é fiscalizar o exercício da
profissão e a qualidade do ensino.
"Acho simpática a idéia de criar
um conselho, acho que é preciso
fiscalizar melhor a formação dos
nossos jovens, porque o jornalista
trabalha com uma coisa muito
poderosa, que é a caneta e o espaço no jornal", respondeu Lula.
Segundo o presidente, o conselho poderia orientar os jornalistas
dos pontos de vista ético, profissional e cultural. "Obviamente, alguns irão dizer que isso é intromissão na autonomia, que é ingerência, mas é só pegar os jornalistas de hoje, que são muito jovens,
e, nesse caso, acho que uma instituição dessa poderia contribuir
com a formação do profissional."
Lula afirmou que torce para que
o movimento sindical dos jornalistas "possa recuperar no menor
tempo possível o prestígio e a representatividade que já teve".
Segundo ele, depois do fracasso
da greve de jornalistas em 1979,
"houve um retrocesso muito
grande, porque, naquele momento, os empresários provaram que
é possível fazer jornal sem jornalista". O presidente lembrou que,
naquela greve, participou de um
piquete na porta de "O Estado de
S.Paulo", durante o qual os "piqueteiros" estavam lendo o jornal, que não deixou de circular.
Em 23 de maio de 1979, jornalistas de São Paulo iniciaram uma
greve, reivindicando 25% de aumento salarial. A adesão foi alta
nos principais jornais, que, no entanto, não deixaram de circular,
mesmo com edições precárias.
A greve acabou seis dias depois,
em 29 de maio, diante da evidência de que os jornais continuavam
a ser publicados e após o TRT
(Tribunal Regional do Trabalho)
ter julgado a paralisação ilegal na
véspera. No mesmo dia, havia fracassado a última tentativa de conciliação entre as partes na Justiça.
"Espero que vocês recuperem
seu prestígio. Não basta ter curso
superior para ter consciência política. Em segundo [lugar], os donos dos jornais trabalharam de
forma muito forte e dura para
tentar quebrar a espinha dorsal
do jornalista, primeiro com a contratação de jornalistas fora das regras, terceirizados, como pequena empresa, e aí todo mundo sabe
o que acontece", afirmou Lula.
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